Nota 6,0 Dialogando com os adolescentes das antigas, longa ainda se mantém atual e cativante
É curioso observarmos como alguns filmes simples e despretensiosos com o passar dos anos acabam alcançando o status de obras cult endossados pelo público, como é o caso da comédia romântica Ela é Demais. Apesar da história manjada e repleta de clichês, o longa acabou tornando-se um ícone do gênero e da seara destinada ao público jovem e não seria exagero dizer que é de fato uma agradável lembrança do que era ser adolescente no final do século 20. Com direção de Robet Iscove, o ponto de partida da trama era modernizar para a então chamada geração MTV a famosa peça "Pigmaleão", do irlandês George Bernard Shaw, que já inspirara o clássico My Fair Lady e tantas outras produções para o cinema, TV, teatro e literatura. Até no clássico horror Carrie - A Estranha podemos encontrar resquícios da obra.
Nesta atualização, a trama se passa em uma escola secundária em Los Angeles onde o estudante Zach Siler (Freddie Prinze Jr.) é o jovem mais popular e desejado pelas garotas, embora já tenha uma namorada, a rica e esnobe Taylor Vaughan (Jodi Lyn O'Keefe). Quando ela resolve romper a relação para ficar com Brock Hudson (Matthew Lilard), um ator de quinta categoria, o rapaz vê sua popularidade ser abalada e precisa urgentemente de algo que o faça atrair atenções novamente. Eis que ele resolve fazer uma aposta com o amigo Dean Sampson (Paul Walker): conquistar uma garota de pouco destaque no colégio e ainda por cima transformá-la em rainha do baile de formatura. A escolhida é Laney Boggs (Rachel Leigh Cook), estudiosa, com talento nato para artes plásticas, mas considerada um tanto estranha e antissocial, um perfil completamente oposto ao de Zach que tem apenas seis semanas para transformar o patinho feio em uma princesa.
É claro que inicialmente o poder de fogo do garanhão não funcionará com a moça, mas chegará o momento que ela cederá à simpatia e beleza do pretendente, o que gera controvérsias como do próprio Dean que tarde demais resolve se importar com os sentimentos da garota. Todavia, Zach pode não estar querendo apenas chamar a atenção e de fato estar apaixonado por Laney que a essa altura já não é mais vista como alguém à margem da hipócrita sociedade escolar. Apesar da história um tanto previsível e batida, o público comprou a ideia e o longa arrecadou dez vezes mais o seu irrisório orçamento. Boa parte do sucesso se deve ao casal protagonista que chamou a atenção pela excelente química. Curiosamente, a questão da popularidade de seus personagens também se repetia nas vidas dos atores.
Rachel já acumulava diversos trabalhos em seu currículo, mas era uma ilustre desconhecida até então, diferentemente de seu colega. Prinze já era um queridinho das adolescentes e viria a estrelar uma sequência de produções no campo das comédias românticas. Assim como aconteceu com muitos astros de filmes adolescentes de sucesso da década de 1980, os protagonistas acabaram se transformando em saudosas lembranças de uma época, sensação acentuada ao revermos Walker em inicio de carreira, esta que foi interrompida precocemente devido a um acidente de carro fatal. Os demais personagens fogem à memória com seus perfis desinteressantes e sem um pingo de carisma, não salvando nem mesmo a oscarizada Anna Paquin que interpreta Mac, a irmã da protagonista, um talento desperdiçado.
O texto de Ela é Demais oficialmente é creditado à R. Lee Fleming, todavia, anos depois M. Might Shymalan, diretor e roteirista na época em alta com o sucesso de O Sexto Sentido, assumiu que reescreveu sem ser creditado a primeira versão do roteiro a fim de eliminar excessos e deixar a trama mais redondinha. No entanto, o que se vê na tela não tem traço algum do estilo criativo e provocador deste profissional, embora sua carreira tenha aos poucos degringolado para o estilo comercial e raso. No mais, observando agora com o distanciamento da época, é perceptível que este filme resgata a aura de clássicos juvenis oitentistas, produções que nos fazem sentir saudades de quando nossas maiores preocupações era ter um grupo de amigos bacana no colégio ou uma companhia para a baladinha do fim de semana, nada muito diferente dos dilemas de jovens atuais, ainda que a tecnologia com seus aplicativos de relacionamentos tenha mudado um pouco a forma das pessoas se relacionarem e a medirem seus níveis de popularidades. Todavia, ser aceito e se destacar, mesmo que em um microcosmo, ainda continuam obsessões universais independentes da idade.
Comédia romântica - 97 min - 1999
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