sexta-feira, 3 de maio de 2024

LETRA E MÚSICA


Nota 8 Comédia romântica não é inovadoramas se destaca ao criticar de leve o mundo da música


Cinema e música fazem um casamento perfeito e ambas as manifestações culturais já tiraram bons proveitos desta união, como fica comprovado em Letra e Música, uma deliciosa comédia romântica que apesar de ser contemporânea (lembrando que o filme é de 2007) resgata muito da ingenuidade e da badalação dos anos 1980, época em que os bailinhos dos jovens bombavam com canções agitadas ou românticas nas vozes de garotos de vinte e poucos anos que vendiam milhões de discos e suas fotos eram acessórios obrigatórios no quarto de qualquer garota descolada. Quem tem ao menos uma pequena noção de como foi aquela época certamente se sentirá fisgado a acompanhar este filme só de ver os primeiros minutos. A introdução não poderia ser mais criativa. Uma melodia pegajosa embala o videoclipe de uma boy band chamada POP. Pode soar como um nome nada original, mas é usado em tom de ironia. Esses rapazes fizeram sucesso no passado fazendo caras e bocas para conquistar as menininhas e seus passinhos de dança, figurinos e cortes de cabelo marcaram época. O clipe reúne todos os elementos característicos do período no que diz respeito ao mundo da música e da TV ou, em outras palavras, como a MTV ditava a moda aos adolescentes já naqueles tempos. O tempo passou, a tal bandinha teen deixou de ser popular, terminou desgastada, seus integrantes envelheceram e cada um seguiu seu próprio caminho. 

Alex Fletcher (Hugh Grant) continuou investindo no mundo da música, ainda que se apresentando para pequenas plateias em parques e feiras de todos os tipos, mas longe dos palcos das grandes casa de shows. Mesmo assim ele foi convidado para escrever uma nova canção e gravá-la junto com um dos maiores fenômenos midiático dos anos 2000, Cora Corman (Haley Bennett). Porém, ele não compõe há anos, sente-se despreparado e está desesperado, pois não pode perder a chance de voltar à mídia em grande estilo. Quem pode salvá-lo é Sophie Fisher (Drew Barrymore), ironicamente a simples  jovem que cuida das plantas do ex-astro. Estudante de letras, ela é ótima para se comunicar, tem boas ideias, mas é desiludida no amor, os ingredientes perfeitos para uma boa compositora escrever uma canção que envolva o público.  Fletcher e Sophie ficam cada vez mais próximos graças a esse trabalho, tornando realidade o amor entre uma fã e seu ídolo, ainda que no caso não exista demonstração de paixão exagerada, afinal o rapaz já não é mais um cantor famoso, embora se ache a cereja do bolo, e ela já não acredita mais em príncipe encantado, o que nos leva a crer ainda mais que tal relação tem futuro. O diretor e roteirista Marc Lawrence tem experiência no gênero e deixa claro que só quis flertar com a inovação, mas seu objetivo principal era entregar uma comédia romântica clássica do tipo que nos faz rir de piadas inocentes e a torcer pelo casal de protagonistas, não faltando nem mesmo uma briguinha entre eles para dar um pico dramático à trama, concluindo a produção com um final açucarado. 


O filme ganha relevância ao fazer críticas contundentes e atemporais ao universo musical. Tais alfinetadas ficam a cargo das cenas da personagem Cora Corman, uma mistura do que há de pior em Beyoncé, Shakira, Britney Spears e companhia bela, cenas que deixam explícito que uma imagem sedutora vale mais que mil palavras ou mil notas musicais. Essa parte mais crítica acaba sendo dissolvida no enredo, até porque a intérprete dessa pretenciosa diva teen não é muito esforçada. Aliás, depois deste filme será que ela fez algum outro? O tempo nos mostra que se seguiu carreira deve ter sido fazendo pontas usando apenas sua chamativa figura. Aliás, imagem não é o único cartão de visitas desta produção. A música é sem dúvida um elemento importante neste longa recheado de baladinhas agradáveis, mas é certo que o clipe-paródia da introdução é que deve grudar que nem chiclete em nossa memória. Fora os momentos musicais, o resto da narrativa segura seus inúmeros clichês graças a atuação de seus protagonistas, uma dupla já diplomada em comédias românticas.

Grant mais uma vez encarna o homem que se esqueceu de crescer, o tipo imaturo que adora fazer piadas depreciativas sobre si mesmo, o que não deixa de ser uma boa arma para conquistar corações. Sua química com Barrymore é perfeita e irresistível. Ao contrário de seu companheiro de trabalho que parece seguir a carreira com um personagem padronizado, não que isso o atrapalhe, a moça parece ter mais desenvoltura para dar uma cara nova para cada mocinha romântica que interpreta. Não é necessariamente uma mudança de visual, o que certamente ajuda a compor novos perfis, mas com pequenas alterações comportamentais e trejeitos ela consegue sempre se renovar, ainda que neste caso sua personagem seja um tanto rasa em comparação ao seu par. Protagonista de mais de uma dezena de comédias, a atriz aqui aparece como uma jovem paranoica e com constantes tiques nervosos. Vale também uma ressalva aos trabalhos de Brad Garrett e Kristen Johnston, respectivamente o agente de Fletcher e a irmã de Sophie, coadjuvantes que conquistam seu espaço para brilhar. 


Seguindo o esquema de qualquer comédia romântica, Letra e Música tem o mérito de prender o espectador com diálogos inteligentes que alternam romantismo e ironia, ainda que o ritmo narrativo caia consideravelmente quando a tal canção que eles escrevem é finalizada e outros conflitos são inseridos para rechear o filme que se beneficiaria com alguns minutos a menos. Não é uma obra para gargalhar, mas sim para deixar quem assiste com um sorriso constante no rosto. Lawrence acerta ao resgatar o clima oitentista de clássicos no melhor estilo sessão da tarde, assim diferenciando seu trabalho no marasmo que o gênero se encontrava e ainda se encontra. Mesmo sem contar com um elemento surpresa ou uma grande virada de trama, só o fato de evitar piadas apelativas já faz valer a pena gastar alguns minutos do seu dia com este filme. Programa obrigatório para os antigos fãs da MTV e do grupo New Kids on The Block. Nunca ouviu falar dessa banda? Não faz mal, você irá se divertir do mesmo jeito.

Comédia romântica - 96 min - 2007 

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