Nota 4 Com reviravoltas que transformam suspense em drama, longa é confuso e com falhas
Uma pequena e pacata cidade onde crianças misteriosamente estão desaparecendo e suspeita-se de que um homem encapuzado está rondando a região. Você já viu quantas produções do tipo? Certamente dá até para perder as contas, mas apesar do ponto de partida comum O Homem das Sombras é daqueles filmes onde a certa altura ocorre uma reviravolta e subverte expectativas e clichês. Contudo, isso não significa necessariamente que é um suspense de primeira linha. Com direção e roteiro de Pascal Laugier, do cult francês O Pacto dos Lobos, a história se passa na pequena Cold Rock, mais uma daquelas cidades norte-americanas que parecem paradas no tempo e sufocadas pela melancolia. O local está sofrendo com o fato de diversas crianças estarem desaparecendo nos últimos tempos sem deixar qualquer rastro, mas nem esse problema conseguiu atrair a atenção da mídia ou das autoridades, até por conta do comodismo dos próprios moradores que parecem evitar ao máximo agitações.
Os adultos que lá vivem em sua maioria são ignorantes e levam uma vida miserável, assim são supersticiosos e creem fervorosamente na lenda urbana sobre o Homem Alto, uma figura estranha que dizem somente ser avistada nas noites em que menores coincidentemente somem. Mesmo morando em uma casa isolada, no entanto, o pequeno David (Jakob Davies) não escapou de aumentar as tristes estatísticas. Ao testemunhar o rapto do garoto na calada da noite, sua mãe, a enfermeira Julia (Jessica Biel), passa a perseguir o tal sequestrador, até consegue provocar um acidente com o caminhão que ele dirigia, mas todos seus esforços são em vão e ela acaba desacordada em uma área de matagal. Algum tempo depois de ser socorrida, de uma hora para a outra a moça passa de vítima a suspeita e então é caçada incansavelmente pela população local. O curioso é que seu recém-falecido marido, o médico local, era uma pessoa adorada e respeitada por todos. Por que a rebeldia contra sua esposa de repente? A resposta pode estar com sua amiga Christine (Eve Harlow) cuja participação na trama merece ficar em segredo para não estragar algumas das reviravoltas desta história.
Mesmo com a premissa que recicla velhas lendas para assustar a molecada, no fundo, as intenções era discutir o descaso dos pais alienados e caipiras no trato com seus filhos, estes que dada as circunstâncias talvez devessem implorar pelo sequestro. O tenente Dodd (Stephen McHattie) é encarregado de investigar o caso, mas os rumos que o episódio toma são totalmente imprevisíveis. Todavia, muito talvez pudesse ser compreendido se alguém desse atenção à Jenny (Jodelle Ferland), uma garota que apenas balbucia palavras devido a um trauma mal explicado, mas que se comunica através dos rabiscos que faz em seu inseparável caderninho de anotações, inclusive o esboço do que seria o tal Homem Alto. É difícil falar sobre um filme cujo grande atrativo não está em gerar emoções, mas sim surpreender momentaneamente o espectador. Calcada em reviravoltas, o problema da produção é que em determinado momento o enredo parece querer mostrar ser mais inteligente que suas reais possibilidades, ainda que Laugier proponha algumas coisas interessantes como a inversão de expectativas.
A primeira metade do filme é narrada de forma frenética, com direito a uma angustiante cena de perseguição em uma estrada, e segue mais o estilo de um filme comum de serial killer. De repente, ocorre uma verdadeira ruptura narrativa que envereda a trama para caminhos mais dramáticos e consequentemente ritmo mais lento. Nada contra tal opção de mudar o gênero da história, mas para tanto é preciso respeitar certa coerência, porém, o diretor parece forçar o espectador a engolir a seco todos os solavancos de seu roteiro. Faltou sutileza para fazer a transição da protagonista de mocinha à vilã e mais empenho na argumentação da acusação. Embora Biel apresente uma interpretação acima da média para o tipo de produção, sua personagem precisava a certa altura trabalhar na cabeça de quem assiste a dúvida a respeito de sua índole, mas determinadas pistas não deixam dúvidas sobre seu verdadeiro perfil. Não convém dizer o que acontece, mas apesar de tentar surpreender o filme até que é bem previsível após o baque da grande revelação.
A transição de suspense para um viés mais dramático, apesar de todas as possibilidades de situações capazes de assustar, não foi imposta por dificuldades narrativas, pelo contrário. Desde a argumentação estava previsto a reviravolta e justamente para evitar alterações a fim de tornar o projeto mais comum e comercial, a própria Biel bancou parte da produção para barrar intervenções das empresas produtoras. Embora tenha passado longe de ser um êxito financeiro, diga-se de passagem, um projeto acolhido na maioria dos países diretamente para consumo doméstico, O Homem das Somhras coleciona várias críticas elogiosas a esta produção quanto às atuações, construção do clima de suspense (acentuado pela natural desolação da cidade) e até pelas reviravoltas propostas. Descontando os furos que só nos damos conta quando paramos para refletir sobre o conjunto, o maior pecado do longa é lançar na tela um conflito moral tratando-o com superficialidade. Aparentemente os sequestros são frutos de alguém querendo fazer o bem por meios torpes, afinal até os moradores lastimam quando uma nova criança nasce em um ambiente sem futuro, mas os fins justificam os meios?
Suspense - 105 min - 2012
Assisti recentemente a este filme (canal aberto) e achei também muito fraco. Parecia melhor na propaganda. Uma pena.
ResponderExcluirabraço