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sábado, 8 de janeiro de 2022

PLATAFORMA DO MEDO


Nota 6 Amedrontador e claustrofóbico, longa aposta em situações clichês com eficiência


Dizem que para fazer cinema basta ter uma ideia na cabeça e uma câmera na mão e tal máxima acaba se confirmando quando analisamos o início das filmografias de alguns cineastas, mais especificamente o período em que ainda não eram corrompidos pela ganância dos grandes estúdios que tratam de recrutar as mentes brilhantes o quanto antes. Esse contraponto entre o antes e o depois do sucesso fica ainda mais evidente nos currículos de diretores apreciadores dos gêneros terror e suspense. A maior parte dos filmes de sucesso e emblemáticos dessas categorias nasceu da criatividade de profissionais desconhecidos e com poucos recursos financeiros, mas infelizmente nem todos os trabalhos do tipo chegam em grande estilo ao público em massa, ficando restritos aos aficionados por sangue e mutilação.  Esse é o caso de Plataforma do Medo, escrito e dirigido por Christopher Smith, que acabou se tornando apenas mais um título em uma extensa lista de produções que o tempo tratou de jogar areia em cima. Não é uma obra-prima, mas cumpre bem sua tarefa de amedrontar o espectador por cerca de uma hora e meia a começar pela premissa. Estamos acostumados com o agitado cotidiano das estações do metrô, mas como elas ficam altas horas da madrugada? 

Isso é o que vai descobrir Kate (Franka Potente), uma jovem que gosta de curtir a vida sem medo de ser feliz e certa noite vai a uma festa onde bebe e se droga, sendo desafiada por amigos se teria coragem de invadir o quarto de hotel onde estaria hospedado o astro de Hollywood George Clooney (que lance forçado!). Quando vai pegar o metrô para tentar cumprir o desafio, ela acaba comprando o bilhete com atraso. Enquanto espera a próxima condução, ela acaba adormecendo e quando desperta percebe que todas as estações já foram fechadas e que ficou presa lá dentro tendo como única companhia alguns mendigos. Mesmo assim ela consegue pegar um último trem, totalmente vazio, mas que pára de repente e não no destino previsto. Para sua surpresa, embarca no vagão um conhecido que a seguiu desde a festa, Guy (Jeremy Sheffield), rapaz que nutria por ela uma paixão não correspondida. O encontro no início é um alívio para a moça, mas não demora muito para que o cara tente agarrá-la à força, mas eis que alguma coisa estranha surge e arrasta Guy para fora do veículo. Kate começa a correr desesperadamente pelos corredores da estação fugindo de algo que não faz ideia do que seja, mas tudo é em vão porque não há uma única porta ou janela destrancada.  


Kate acaba encontrando como companhia um cachorro vira-lata e um casal de mendigos com quem faz amizade, Jimmy (Paul Rattray) e Mandy (Kelly Scott). Já faz algum tempo que os cantos escuros da estação servem de moradia para eles, assim como para tantos outros que não tem casa ou são viciados em drogas, no entanto, eles perceberam que alguns moradores andaram sumindo misteriosamente nos últimos tempos. Quando Mandy desaparece e Guy reaparece muito ferido, Kate consegue fazer contato com um vigia (Morgan Jones) que não dá muita bola ao pedido de ajuda, pois está acostumado com as peças que os moradores noturnos do local lhe pregam. Só quando vê pelas câmeras um corpo ensanguentado é que ele decide agir, mas já é tarde demais. Craig (Sean Harris), um psicopata esquelético e deformado, acaba de fazer uma nova vítima. Ele vive nos subterrâneos do metrô e adora capturar os frequentadores incautos que ficam dando sopa no período noturno ou nas partes mais escondidas e vazias da estação. Revelar que há um assassino vivendo no local não é estragar a surpresa do longa, afinal de contas parece que Smith não faz questão nenhuma de esconder o que há de podre dentro da intrigante plataforma a noite. Esse talvez seja o maior pecado da produção. Seria bem mais interessante se o diretor recorresse a cortes rápidos de edição que mostrassem a criatura de relance ou o bom e velho recurso da ótica de um personagem captando o que se passa com os outros, no caso o olhar do assassino registrando o pânico e a agonia de suas vítimas. 

Logo que Guy é capturado, embora não seja revelado visualmente, sabemos que existe um estranho ser habitando o subsolo, isso porque muitos outros filmes já investiram em temática semelhante, abordar pessoas que passaram por mutações ou sofrem com o aspecto bizarro de seus corpos e se escondem do mundo, desenvolvem personalidade periculosa e a ânsia de aplacar frustrações é na base da violência extrema. Como Craig sobrevivia nesse submundo? De que forma conseguia realizar seus assassinatos sem que a polícia virasse a plataforma de cabeça para baixo em busca de pistas das pessoas sumidas? Esqueça os detalhes do tipo e embarque na bizarra viagem sem pensar no que faz ou não sentido. A cena da primeira grande aparição de Craig, justamente quando ataca o vigia, é muito bem bolada e garante a atenção do espectador para o que vem a seguir. Se seu visual é revelado por completo pouco depois da metade do filme, resta conhecer como vive tal criatura e o que ela faz com suas vítimas. Smith propõe no fundo uma variação dos batidos filmes de seriais killers. Sem falar uma palavra sequer, seu vilão causa arrepios com seu aspecto grotesco e seus grunhidos como se fossem urros de animais. Sua origem e razões para matar não são esmiuçadas, mas fica subentendido que seus traumas do passado estão ligados com a medicina e a estética, visto que ele tem uma espécie de câmara de tortura com itens de consultório médico e ele próprio se comporta como um cirurgião na hora de mutilar corpos ainda com vida. 


Plataforma do Medo acaba sendo uma surpresa agradável por vários motivos, apesar da premissa clichê. Os adoradores de carnificina são premiados com cenas com requintes de crueldade em abundância, mas apresentadas de forma diferenciada, principalmente as que mostram as ações mórbidas do assassino. Sem apelar para truques de câmera nervosa e efeitos sonoros pesados, quem assiste é convidado a saciar-se lentamente junto com Craig a cada novo ferimento que causa ou com os closes de vísceras e fetos hermeticamente acondicionados em potes de vidros que ele coleciona. Smith também nos poupa de personagens idiotas e piadinhas tolas inseridas fora de hora, além de caprichar no clima de claustrofobia mesmo com boa parte das cenas sendo iluminadas com fortes lâmpadas incandescentes, mas a sensação de solidão acentua o temor. A curta duração também é benéfica. O diretor não caiu na tentação de espichar a trama a fim de aproveitar ao máximo o valor do aluguel que foi pago para que uma estação abandonada do metrô de Londres servisse como cenário, optando por algo mais enxuto e sem firulas. Até as atuações que em produções do tipo costumam ser péssimas, neste caso está no limite do razoável, sendo que Harris é quem se sai melhor. Pudera, ele é a estrela do show.

Terror - 85 min - 2004 

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