NOTA 7,0 Tim Burton praticamente reinventa conto clássico, mas deixa que os apelos visuais da produção sobressaiam ao enredo |
Burton gosta de criar suas próprias bizarrices, mas não
dispensa as chances de poder dar seu toque pessoal a obras famosas do cinema.
Ele reinventou, por exemplo, Planeta dos Macacos e A Fantástica Fábrica de Chocolate
e obviamente não escapou de críticas negativas em nenhuma dessas ocasiões e
tampouco quando se aventurou a recontar a história de Alice e seu mundo de
fantasia. Era de se esperar. O público se acostuma com a versão clássica e
rejeita qualquer inovação. Os burburinhos só não foram maiores porque o diretor
tem seus seguidores fiéis que aprovam tudo que ele faz. Somam-se a eles a
legião gigantesca de fãs de Depp, afinal querendo ou não ele é um tremendo
chamariz e seu personagem foi praticamente elevado a categoria de protagonista.
Ele deu certo ar melancólico à sua criação que nos faz esquecer o personagem
homônimo e irritante do desenho Disney, todavia, esse efeito talvez não tenha
sido proposital, mas sim uma imposição para aplicações de efeitos especiais.
Mas o que chama a atenção mesmo são as duas nobres do conto. A Rainha de Copas,
ou melhor, a Rainha Vermelha como é chamada, é muito curiosa. Com o auxílio da
computação, Helena, a esposa do cineasta, aparece como uma criação virtual,
assim como outros personagens como a Lebre Maluca. Já a Rainha Branca é uma
personagem tão apagadinha quanto seu nome e colabora para tanto o fato de ela
não fazer parte da maioria das versões do conto, sejam elas de cinema, livros,
teatrais ou de TV. Ainda que conte com um leque repleto de personagens de
bizarros a serem explorados, Burton praticamente limou a pegada surreal do
texto original, assim não espere viradas inesperadas ou malucas de tempos em
tempos e sim um enredo que parece a todo custo tentar dar alguma lógica a
trajetória de Alice por um mundo paralelo encontrado no subterrâneo. Mas nem
tudo é ruim nesta história. Não deixa de ser curiosa a introdução e a
conclusão, as mudanças comportamentais de certos personagens e até as
explicações para o porquê de cada um deles ser de um jeito ou de outro, como a
vilã que é solitária e sofre com sua condição física diferenciada, frustrações
que ela descarrega em seus planos malévolos.
Como já era esperado o visual é o melhor deste trabalho, utilizando
em boa parte das cenas a tecnologia que captura a imagem dos atores e depois as
mesmas são reconstituídas na pós-produção com recursos de animação, a mesma
técnica de A Lenda de Beowulf. Vale elogios, mas também ressalvas. Fica claro
que todos os elementos de cena e dos aspectos físicos dos personagens foram
minuciosamente pensados e acabam transformando a imagem que qualquer um tinha
do conto da Alice. O empenho resultou no Oscar de direção de arte e também de
figurinos, embora ambos os departamentos tenham recebido uma mãozinha da
tecnologia, desde uma simples árvore até a já citada Rainha Vermelha que possui
uma cabeça desproporcional ao seu corpo achatado. O ápice do uso de
computadores para fazer as animações é nos momentos finais quando há uma
batalha épica que destoa um pouco no conjunto. Porém, o que pode ser o
grande destaque desta produção também pode ser o que a atrapalhe. A preocupação
com efeitos especiais, cores e afins parece não ter se repetido na concepção da
história. Infelizmente, a adaptação feita por Linda Woolverton do clássico
conto não empolga, foge da premissa e em meio a tantos elementos para deleite
dos olhos o espectador passa quase que exclusivamente a acompanhar a trama visualmente
e pouco pela audição. A história conhecida e previsível acaba encontrando
elementos para fisgar a atenção do público quadro a quadro, o que mostra que a
obra tem seu valor, mas isso não é o suficiente para ser considerada um marco
da história do cinema. Alice no País das Maravilhas continua com sua aura
onírica e capaz de fazer o público sonhar com um mundo fantástico onde tudo é
possível, mas a versão de Burton perde pontos ao conquistar uma imagem de
entretenimento feito exclusivamente para obter lucros. Visando as platéias que
se encantaram pelo 3D, Burton tentou corresponder as exigências do mercado
cinematográfico atual preservando ainda as características que marcaram sua
filmografia, mas conseguiu um resultado que pode ser classificado apenas como
um pouco acima do patamar regular. Simplesmente é mais uma prova de que
tecnologia não é tudo. O cinema para sobreviver precisa de boas histórias. Uma
pena que quem dita as regras no mundo do cinema (estúdios, produtoras,
investidores, exibidores e afins) estão cegos por causa de um ou outro
resultado financeiro obtido através do marketing da tridimensionalidade, porém,
a realidade é bem diferente.
Aventura - 109 min - 2010
Não é um dos melhores do Burton, mas diverte, além do visual espetacular. Helena Bonham Carter rouba a cena.
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