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domingo, 3 de dezembro de 2023

ABAIXO O AMOR


Nota 8 Comédia romântica narra bem bolada trama atrelada a um irresistível visual vintage


A década de 1960 deixou saudades para muitas pessoas. Reviravoltas políticas, conflitos a favor de atos libertários, a moda peculiar e rebelde, as canções que faziam críticas de forma escamoteada, artistas sendo banidos de seu país natal... Epa! Essa é uma visão muito nacional e dramática dos tempos do iê-iê-iê. Melhor guardarmos como lembrança dessa época o lado romântico visto pela ótica hollywoodiana deliciosamente exagerada de Abaixo o Amor. A palavra vintage costumava ser usada para se referir as melhores safras de vinho de determinado tipo ou região, mas passou a ser sinônimo de coisas que simbolizam períodos aleatórios do passado. Assim tal palavra é transcrita em forma visual literalmente a cada segundo desta comédia romântica que mostra um momento importante para o movimento feminista ao mesmo tempo em que tenta jogar por água abaixo a teoria de que as mulheres podem viver sem os homens. O diretor Peyton Reed foi habilidoso para construir uma trama inteligente e divertida que agrada a ambos os sexos. O filme já começa de forma irresistível com a abertura feita em animação com uma agradável e contagiante canção, tudo para o espectador já entrar no túnel do tempo. 

Logo somos apresentados a sociedade predominante machista, mas a época já apontava mudanças e as mulheres começavam a ir à luta em busca de seus lugares no mercado de trabalho e a brigar por direitos iguais. A escritora Barbara Novak (Renée Zellweger) chega a Nova York cheia de esperanças de fazer sucesso com seu livro (homônimo ao filme), mas acaba se decepcionando com a recepção fria a seu trabalho cujo objetivo é provar que as mulheres podem ser felizes e independentes sem precisarem de um homem ao lado. Porém, ela ainda teria a chance de mudar as coisas. Graças a ajuda de sua amiga Vicki (Sarah Paulson) ela consegue divulgar seu livro pegando carona no sucesso de uma música de mesmo título, além  de uma rápida passagem por um programa de TV, assim da noite para o dia a sua vida muda completamente e sua obra consegue vender que nem água no deserto e ficar em primeiro lugar na lista dos mais procurados. Os homens naturalmente não gostaram nada desse lançamento, mas um em especial se incomodou um pouco mais. O conteúdo do livro atinge negativamente o estilo de vida do jornalista metido a galã Catcher Block (Ewan McGregor), que decide se aproximar da autora e conquistá-la, assim desmentindo todas as teorias revolucionárias da jovem e conseguindo a grande matéria de sua vida.


Os roteiristas Eve Ahlert e Dennis Drake se inspiraram nos filmes Confissões à Meia-Noite e Médica, Bonita e Solteira para escrever esta história aparentemente simples, mas que acaba ganhando contornos mais complexos quando o tal jornalista resolve fingir ser uma pessoa completamente diferente para conquistar a escritora. Ele finge ser Zip Martin, um rapaz do interior que é astronauta e por isso nunca ouviu falar na tão famosa Bárbara. É claro que a certa altura o jornalista vai se dar conta que realmente se apaixonou por ela e que será difícil explicar a sua farsa e ainda mais complicado a garota entender seus argumentos, pois ela também já estará completamente entregue ao amor. Mesmo sendo previsível, o enredo ganha fôlego graças ao roteiro afinado, a ambientação, figurinos e trilha sonora escolhidos a dedo e ao trabalho dos coadjuvantes. A personagem Vicki também acaba participando sem querer de uma farsa amorosa. Ela se apaixona pelo melhor amigo e chefe de Block, Peter MacMannus (David Hyde Pierce), este que não busca apenas diversão, mas sim um casamento sólido. Porém, ele se complica com as mentiras do amigo e até sua sexualidade passa a ser questionada. Tanto o casal principal quanto o coadjuvante têm muita química e conseguem arrancar boas risadas dos espectadores. Além do elenco afiado, Reed também tomou cuidado para que tudo em seu filme fizesse referência ao clima dos agitados anos dourados, desde os movimentos acelerados dos personagens, passando pelo figurino colorido e a decoração cheia de detalhes e novidades tecnológicas da época.

Destaque para a edição de cenas usando o recurso de ações simultâneas dividindo a tela para provocar humor ou marcar passagens de tempo, um recurso muito comum em seriados antigos de TV. Dessa forma, é quase impossível não se impressionar com o excepcional casamento de áudio e imagem como, por exemplo, nas cenas de ligações telefônicas entre os protagonistas, inclusive uma bem insinuante. Apesar de ser empolgante, divertido e só mesmo sendo um chato de galochas para achar algum defeito gritante, a produção não foi bem nas bilheterias. Seu lançamento ocorreu em uma época concorrida em que Hollywood despejou ao mesmo tempo nos cinemas muitos filmes blockbusters, como adaptações de quadrinhos, projetos aguardados e sequências de sucessos, assim muitas obras excelentes acabaram passando despercebidas. Já que a regra é tempo é dinheiro, quem não rendeu o esperado logo nos primeiros dias teve de ceder lugar para outros títulos nos cinemas. Abaixo o Amor foi uma das vítimas desse pensamento que rege o mundo dos negócios e passou em brancas nuvens, não conseguindo nem mesmo virar campeão de repises na TV. Infelizmente o público ignorou a produção completamente.


Mesmo sem ter premiações em seu currículo, esta comédia vale muito a pena para aqueles que sentem saudades ou para quem deseja conhecer um pouco mais sobre a década dos anos 1960, um tempo que deixou saudades, marcou a vida de muita gente e quando a cultura americana passou definitivamente a ditar modas, atitudes, entre tantas outras coisas que passaram a ser perpetuadas pelo mundo todo através das mais variadas formas de arte e bens de consumo. Iniciado com uma canção e finalizado da mesma forma, o grand finale fica por conta de Zellweger e McGregor soltando a voz e dançando para nosso deleite (eles já haviam feito isso respectivamente em Chicago e Moulin Rouge). Podemos ter a sensação de que o filme poderia ser mais marcante caso o diretor, especialista nas antigas comédias-família da Disney, como Se Meu Fusca Falasse, optasse pelo gênero musical, afinal de contas a trilha sonora excepcional e contagiante deve permanecer por alguns momentos na mente dos espectadores mesmo após os créditos finais, além do fato de que essa seria mais uma referência ao passado quando as produções musicais estavam em alta. De qualquer forma, nostálgicos e simpatizantes do passado divirtam-se!

Comédia romântica - 101 min - 2003

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