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segunda-feira, 11 de setembro de 2023

SEABISCUIT - ALMA DE HERÓI


Nota 7,5 Tecnicamente perfeito e bem interpretado, longa exala nostalgia, mas peca pelo didatismo


Depois de estrear como diretor com o surpreendente Pleasantville - A Vida em Preto e Branco, Gary Ross demorou cinco para voltar aos sets, porém, seu retorno careceu da criatividade de seu debute. Baseado em fatos reais, Seabiscuit - Alma de Herói é bastante previsível e talhado para agradar aos votantes de premiações, tanto que conquistou sete indicações ao Oscar, mas não venceu nenhuma. A história se passa na década de 1930 marcada pela Grande Depressão, período em que os norte-americanos sofreram com desemprego, queda de empresários e inúmeras tensões sociais. Charles Howard (Jeff Bridges), um grande comerciante do ramo de automóveis, sofreu o baque financeiro e ainda tinha que lidar com uma tragédia familiar. Para tentar sair do buraco, ele passou a investir em cavalos de corrida tendo o apoio do treinador Tom Smith (Chris Cooper), um vaqueiro caladão e excêntrico, mas com uma empatia com os animais fora do comum. Com seu faro apurado, ele passa a procurar por diversas estrebarias algum equino com potencial adormecido a fim de pagar pouco e futuramente lucrar muito quando estivesse bem treinado para disputas. Numa dessas visitas ele encontra o pequeno Seabiscuit, um cavalinho mal tratado por seus cuidadores que não lhe davam o mínimo valor a julgar por suas pernas tortas e porte franzino. 

Smith não pensa duas vezes antes de arrematá-lo, assim como também não fica reticente de contratar o jóquei Red Pollard (Tobey Maguire), um rapaz esforçado que também driblava os inconvenientes de uma deficiência. Abandonado pela família, o jovem vivia de trabalhos temporários em troca de um teto e comida e esta seria sua chance de mudar seu destino. Ao aceitarem o desafio de treinarem um desacreditado cavalo, talvez Howard, Smith e Pollard não imaginassem que estariam realizando um trabalho que entraria para a História. Você já viu esse filme várias vezes e com pequenas modificações. Temática amada pelos americanos, quem nunca se sentiu motivado ao ver um filme em que um rebelde ou excluído sagrou-se vitorioso em algum grande desafio? Seabiscuit, que entra em cena apenas depois de uma hora de projeção, superou as expectativas de seus cuidadores e surpreendeu aos incrédulos com sua garra e força de vontade que o levaram a colecionar vitórias espetaculares que fizeram sua fama ultrapassar os limites dos hipódromos. O pequeno e desajeitado equino virou mito em todo o território dos EUA e ajudou a levantar a moral de um povo abalado pela crise econômica da época. 


A narrativa ganha dramaticidade ao abrir espaço para os traumas e dilemas dos três homens que acreditaram no potencial de Seabscuit como, por exemplo, o fato de Pollard não se dar por vencido por ter perdido a visão do olho direito em uma luta de boxe, um dos vários bicos em que se metia para sobreviver. A história vencedora do cavalo do título já havia sido levada aos cinemas no final dos anos 1940 com a graciosa Shirley Temple encabeçando o elenco de Têmpera de Vencedor, todavia, o filme ficou perdido no passado o que justifica completamente uma nova versão, embora o trabalho de Ross não seja uma refilmagem. Também autor do roteiro, ele adaptou o livro "Seabiscuit - Uma Lenda Americana", da escritora Laura Hillenbrand, mas apesar dos pontos dramáticos trabalhados não é uma obra que agrada a um amplo público, encontrando dificuldades até mesmo com os amantes do gênero. Com mais de duas horas de duração, o longa peca em diversos momentos por exagerar em detalhes, esmiuçando demais os acontecimentos, e também pelo ritmo lento. Boa parte da culpa se deve ao estilo documental que interfere bastante na narrativa até certa altura, o que inclui a inserção de algumas imagens de arquivos da época. Por outro lado, Ross investiu pesado nas recriações das mais famosas corridas que Seabiscuit participou, inclusive até jóqueis de verdade foram contratados para figuração.

Assumidamente uma produção à moda antiga, Ross abusa de planos épicos, música grandiosa nos momentos de arroubos emocionais e conduz a trama de forma a emocionar a qualquer custo. É aquele tipo de filme que seu desenrolar não abre frente para tensões pelo fato de já sabermos de antemão que o final feliz está garantido. Não importa o grau de dificuldades dos conflitos expostos, acompanhamos tudo passiva e tranquilamente. Contudo, faz diferença como essa previsibilidade é colocada na tela, o grande charme desta produção. Ross demonstra habilidade para contar uma história manjada de maneira elegante e sóbria, sem precisar lançar mão de efeitos especiais de ponta para fazer os cavalos voarem nas pistas ou darem trotes inimagináveis. Seria até contraditório, já que a história é sobre um animal que venceu todas as adversidades sem precisar de trucagens, tudo literalmente na raça. Os animais estão em cena extremamente bem treinados e fotografados mesmo quando em alta velocidade. Há capricho extremo na captação de todas as imagens tirando o melhor proveito da recriação de época nos cenários e das bucólicas paisagens naturais do ambiente rural. 


Nostálgico e solene, Seabiscuit - Alma de Herói é um projeto pessoal de Ross que soube manipular o material que tinha em mãos para tocar fundo no coração do público, principalmente dos americanos sempre ávidos por histórias de superação. Todavia, a mensagem do filme é universal. É uma obra otimista que mostra como as pessoas podem e devem lutar para vencer desafios a fim de conquistar seus sonhos. Açucarado e com situações que parecem extraídas de um livro de autoajuda, o fato de se tratar de um produto baseado em fatos verídicos ajuda a torná-lo mais palatável, sendo que a escolha dos protagonistas também fora fundamental. Bridges e Cooper estão perfeitamente à vontade em seus papeis e chama a atenção o fato de Maguire ter sido esquecido entre os indicados ao Oscar que tem uma queda por tipos deficientes, ainda mais quando ele cai nas mãos de um jovem ator em ascensão. No conjunto, a produção caprichada parece um produto pinçado da era de ouro de Hollywood, o que pode justificar seu esquecimento com o passar dos anos. Se na época chamou a atenção na toada das premiações, hoje é apenas mais um entre tantos filmes sobre cavalos de corrida.

Drama - 141 min - 2003

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