Nota 4 Glenn Close carrega continuação nas costas mais uma vez roubando a cena com sua vilã
Sequências caça-níqueis ruins de filmes de sucesso são uma prática costumeira e, infelizmente, 102 Dálmatas não foge à regra. Continuação criada para faturar em cima do prestígio conquistado por 101 Dálmatas - O Filme, que conseguiu sobreviver sem dependência do desenho animado datado do anos 1960, desta vez a produção ficou totalmente nas costas da atriz Glenn Close que antes já roubara a cena com sua vilã. Parecendo ter nascido para o papel, mais uma vez ela encarna a megera Cruela DeVil que após os eventos do longa anterior acabou sendo presa e submetida a um inovador tratamento criado para recuperar internos violentos. Mesmo sem comprovação científica de resultados, o juiz lhe concede liberdade provisória, assim ela já começa esta nova aventura de maneira regenerada, uma verdadeira amante e protetora dos animais. Obrigada a prestar serviços comunitários, caso contrário toda sua fortuna iria ser destinada a um canil, ela própria então decide comprar um asilo falido para abrigar cães abandonados, ajudando assim Kevin Sheperd (Ioan Gruffudd), o antigo e bondoso dono, este que por sua vez é o óbvio candidato a namorado de Chloe Simon (Alice Evans), a agente de condicional que ajudou a milionária a ganhar a liberdade e dona de alguns filhotes de dálmatas.
Entretanto, o tratamento ao qual a ex-prisioneira foi submetida mostra-se sensível a ruídos agudos, assim quando Cruela escuta o soar dos sinos do Big Ben, um dos símbolos londrinos, ela volta a ser a peste de antes. Nesses momentos, ela recobra sua empáfia e vilania e seu sonho frustrado de ter um exclusivo casaco feito com pele de dálmatas e recorre a Jean-Pierre Le Pelt (Gerard Depardieu), um decadente estilista francês, para mais uma vez caçar seus cobiçados filhotinhos malhados e é claro que os cãezinhos de sua tutora estarão em sua mira aproveitando-se do fato que elas se encontram rotineiramente para ver como está a adaptação da ex-detenta à sociedade. Entre as possíveis vítimas está Albina, uma dálmata com problemas de cunho existencial por ter nascido com o pelo completamente branco, sem uma única mancha. Desta vez Curela exige a exata quantidade de cachorrinhos do título, uma forma bem humorada de intitular a continuação e reforçar o caráter obsessor da vilã que aqui assume o protagonismo deixando claro que na franquia os próprios dálmatas são apenas coadjuvantes. Ela é a peça fundamental e não há fofura dos artistas de quatro patas capaz de abalar seu histrionismo.
Mais uma vez Close se deixou levar pelos exageros sem culpa nenhuma e mesmo se divertindo com as inúmeras caras e bocas da vilã em nenhum momento pareceu estar brincando durante as filmagens. Da mesma forma que leva a sério uma obra dramática, seara que já lhe rendeu grandes papeis e indicações a prêmios, também a vemos se dedicar com total entrega a uma produção de cunho infantil e humorístico. Todavia, neste caso desde o início já havia o agravante do filme nascer com um único objetivo: render dinheiro. Contando com um enredo mais consistente e coeso partindo da premissa de recriar em live-action uma animação de sucesso, o longa de 1996 era mais fiel ao espírito do romance de Dodie Smith, mesmo com algumas modificações. Já esta continuação parece não ter um fundamento sólido e se escorar unicamente sobre os delírios dos roteiristas Brian Regan e Kristen Buckley forçados a darem um futuro para os personagens, ou melhor, imaginar o que teria acontecido unicamente com Cruela visto que o casal humano dono dos dálmatas na outra história nem dá as caras. John Hughes, roteirista do anterior, sabia como poucos adequar uma temática infantil para parecer atrativa também aos olhares dos adultos e essa visão mais ampliada faz falta nesta sequência que acabou com apelo restrito as crianças bem pequenas que se divertem com animais simpáticos, tropeços e tortas na cara. Bem, no caso uma guerra de bolos que obrigou Close a realizar uma cena bastante constrangedora para seu nível, mas a atriz tirou de letra, afinal fazer rir é uma arte tão ou mais difícil que fazer chorar.
Este foi o primeiro filme com atores do diretor Kevin Lima que antes só havia realizado desenhos animados, como Tarzan da própria Disney, e logo de cara assumiu o desafio de lidar com quase 300 dálmatas, fora os cães de outras raças e demais bichinhos que também surgem como coadjuvantes. De olho no público infantil, a produção capricha na fofura do elenco canino mais uma vez em número inflado para poderem ser realizadas substituições de última hora pelos inevitáveis imprevistos. Mesmo assim, desta vez a produção não quis se arriscar tanto e também contou com animais em estilo animatronic, robôs manipulados por controle remoto. Já o emprego de computação gráfica foi utilizado para retirar as manchas do pelo de Albina, que na verdade era uma legítima dálmata, e também para movimentar a boca de uma arara bastante falante que insiste em achar que é um rottweiller. 102 Dálmatas parece se aproveitar justamente do fato das crianças ainda não terem muito discernimento e amontoam o maior número possível de gags visuais já manjadas carregando ainda mais nas tintas dos vilões, talvez justamente por isso Depardieu saiu-se queimado da história.
Deslocado no papel, que exige o uso de um estranhíssimo figurino e também cabelo estilo punk, o francês mostra mais uma vez que aparece em produções de Hollywood apenas para ter seu nome reconhecido, pois seu talento mesmo só o cinema de seu país natal parece valorizar. O único fator positivo é que na pele do estilista mau-caráter ele não precisa disfarçar que não domina o idioma inglês, característica que até cai bem para o papel de um radico em Londres. A cidade, tal qual no outro longa, é apresentada sob o ponto de vista de seus melhores ângulos, o que dá certa aura de ambiente mágico onde todos são felizes e os poucos marginalizados certamente serão punidos, pois destoam no conjunto típico de cartão-postal e do padrão Disney, aquele tipo de cinema censura livre que diverte e aplica lições de moral. Infelizmente, o roteiro raso desta vez exclui o público adulto da brincadeira que só deve se interessar pela interpretação de Close que faz o que pode para manter intacta a imagem de uma personagem tão emblemática.
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