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sexta-feira, 1 de outubro de 2021

O MISTERIOSO CASO DE JUDITH WINSTEAD


Nota 4 Falso documentário, longa peca pelo estilo de edição que acaba por esfriar os ânimos


Zumbis, assassinos mascarados, monstros, casas assombradas, eventos sobrenaturais... O gênero terror possui diversas vertentes e é interessante que os estilos e temas acabam marcando determinadas épocas. A década de 1980 ficou rotulada pelas fitas de horror trash; a década seguinte pelo revival dos seriais killers; já os anos 2000 pelo ápice do cinema gore. Em paralelo as vísceras expostas e torturas sem limites, os primeiros anos do novo milênio também serão lembrados por uma técnica em específico que se encaixa em todos os estilos citados no início: o found footage. Compilação de imagens de vídeos caseiros, o recurso caiu como uma luva para ajudar a contar histórias de arrepiar supostamente reais como, por exemplo, Atividade Paranormal, mas tudo que é demais não tarda a enjoar. O Misterioso Caso de Judith Winstead procurou dar um gás para a surrada técnica assumindo a identidade de um documentário, mas para um filme cujo principal objetivo é aterrorizar o casamento de gêneros falhou. Fora um ou outro momento, no geral não impacta e tampouco assusta na medida necessária, assim acompanhamos com certo tédio a história escrita e dirigida por Chris Sparling, de Enterrado Vivo, apesar de seus esforços para oferecer algo diferenciado. 

A trama nos apresenta ao Dr. Henry West (Willian Maphother), cientista que em meados da década de 1970 criou o Instituto Atticus, local para estudos psicológicos voltado para pessoas com habilidades especiais.  Muitos pacientes foram submetidos a diversos testes para verificação de atividades paranormais, alguns poucos casos de fato comprovados e tantos outros considerados fraudes, mas nenhum deles desafiou tanto a equipe médica quanto o episódio da jovem do título. Interpretada por Rya Kihlstedt, Judith foi abandonada pelos próprios familiares na instituição cansados de seu comportamento agressivo e insensato. O caso imediatamente conquista o interesse de West e seus companheiros de trabalho que acreditam que finalmente poderão provar que há pessoas que nascem com dons especiais. O problema é que a jovem de fato é vítima de manifestações sobrenaturais negativas, uma real possessão demoníaca que não demora a fugir do controle dos cientistas, dentro e fora do instituto. Inevitavelmente, os acontecimentos dos testes feitos na clínica acabam vazando e chegam ao conhecimento do governo norte-americano que intervém drasticamente nas pesquisas com o apoio do Departamento de Defesa querendo dominar Judith. Aproveitando-se de seus supostos poderes mediúnicos, a ideia seria transformá-la em uma arma viva para ser usada durante a Guerra Fria. 


Quarenta anos mais tarde, os registros fotográficos e gravações em vídeos dos testes veem à público em forma de um documentário alinhavado por depoimentos de quem vivenciou de perto o êxtase dos experimentos e ao mesmo tempo os perigos de não saber lidar com forças sobrenaturais. E não se trata de um recurso de metalinguagem com um filme dentro de outro. Esta produção é uma edição de supostos registros visuais de um fato bastante intrigante, porém, tudo invenção da fértil mente de Sparling. Sim, apesar de no início um aviso nos induzir a acreditar estarmos prestes a acompanhar os relatos de um fato verídico, Judith Winstead na verdade é uma personagem fictícia, embora certamente tudo o que vivenciou na clínica sejam eventos baseados em histórias reais de pessoas submetidas a severos e invasivos testes em uma época em que a ciência caminhava a passos largos, mas ainda muita coisa ilegal era feita por debaixo dos panos e com humanos sendo usados como cobaias tal qual animais. O próprio lançamento acanhado, diretamente para o consumo doméstico, denuncia a farsa. Se realmente fosse a compilação de vídeos caseiros reais comprovando teorias sobre possessão demoníaca, os produtores teriam uma mina de ouro em mãos e não deixariam o filme passar em brancas nuvens.

Sparling não apostou nem mesmo em uma campanha de marketing criativa. Deveria ter se espelhado em A Bruxa de Blair, o longa que popularizou o found footage. Antes de chegar aos cinemas,  o longa ganhou uma eficiente propaganda através de um site que oferecia um histórico sobre a feiticeira, contando os pormenores de suas origens e atos macabros, o que ajudou a aguçar a curiosidade de milhões de pessoas em todo o mundo. Só depois do lançamento, após muitas especulações e milhões arrecadados, é que seus realizadores assumiram a jogada publicitária. Vendido como registro do único caso de possessão demoníaca de fato confirmada pelo governo dos EUA (quantos filmes já se gabaram também disso?), O Misterioso Caso de Judith Winstead falha ao simplesmente jogar na tela a personagem-título sem lhe sustentar com algum background e acaba tendo seu desenvolvimento prejudicado com as limitações impostas pelo formato escolhido de documentário. Seguindo um molde consagrado pela televisão, a produção exagera na inserção de depoimentos e acaba desviando o foco do espectador do que realmente importa. Quando os experimentos com a protagonista são retomados, o nível de tensão está normalizado e precisamos de um reaquecimento. 


Os clímax das cenas constantemente são abortados pelas entrevistas, diga-se de passagem, a maioria desnecessária e com atores inexpressivos ou exagerados, e assim nunca chegamos a sentir medo real, a cadência emocional está sempre em cima do muro e nunca chega ao ápice de tensão. Assim, cenas explorando os testes parapsicológicos e manifestações do tal poder de Judith são apresentadas com tempo reduzido e acabam não ganhando o destaque necessário. Ainda assim, Kihlstedt eclipsa com sua entrega ao personagem, com olhares e trejeitos com os quais parece verdadeiramente incorporar alguma entidade. No geral, apesar dos esforços para reconstituição de época, como a imagem dessaturada e edição amadora, alguns detalhes técnicos fazem as boas intenções caírem por terra, como a sonorização perfeita e enquadramentos que não seriam possíveis com uma câmera da época ou sua disposição para filmagem, assim a fita acaba sendo mais interessante por sua proposta do que por sua realização em si, principalmente por conta do roteiro que fica devendo sustos e exagera na morosidade.

Suspense - 83 min - 2015

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