NOTA 8,5 Clássico representante dos tempos áureos dos filmes-catástrofes, longa ainda prende atenção com ótimo enredo e atuações e efeitos visuais convincentes |
Virada de ano é tempo de
festejar, fazer pedidos e renovar a esperança crente que um novo tempo começará
a partir de 1º de janeiro. Nessa excitação de momento, provavelmente nem os
mais pessimistas tem tempo ou motivação para pensar que o pior pode acontecer
poucos minutos após os estouros de champanhes e do show dos fogos de artifício.
Já pensou você estar em um luxuoso transatlântico, curtindo um festão e de
repente virar literalmente de cabeça para baixo e ser arrastado para o teto do
salão? Pois é isso que acontece durante os festejos de ano novo retratados em O Destino do Poseidon, clássico representante
dos filmes-catástrofes, subgênero tão popular na década de 1970. Ele é a prova
que para fazer cinema do tipo não é preciso se tornar refém de efeitos
especiais de ponta. Basta ter uma boa história para contar e criatividade em
sua condução para fisgar o espectador. A trama em si é das mais simples.
Durante a noite de reveillon o imponente Poseidon, um tipo de hotel de luxo
flutuante, está transbordando (sem trocadilhos) de passageiros que no melhor da
festa são surpreendidos com um intenso sacolejar por conta do impacto de uma
onda gigantesca que deixa o navio totalmente virado de cabeça para baixo.
Dezenas de pessoas morreram na hora, inclusive a tripulação da cabine de
comando o primeiro local a ficar submerso, mas muitas sobreviveram e se viram
isoladas dentro do salão principal que em um primeiro momento parecia a prova
d'água. Contudo, não tardaria para o local ser invadido por uma enxurrada e um
pequeno grupo liderado pelo reverendo Frank Scott (Gene Hackman) decide que
aguardar resgate era perda de tempo e o melhor seria procurarem por conta
própria uma saída. Assim eles se aventuram pelas entranhas da embarcação
tentando subir rumo ao casco que ainda está boiando na superfície, mas o tempo
está contra eles. Como para a maioria dos espectadores a estrutura de uma
embarcação é desconhecida, poucos conhecem até mesmo os ambientes comuns que
dirá tudo que necessita para sua engrenagem funcionar, a sensação de pavor é
intensificada. A cada desafio vencido não há sensação de alívio e sim a
preocupação do que está por vir.
Baseado no livro de Paul Gallico
lançado em 1969 inspirado em um episódio verídico durante a Segunda Guerra
Mundial, o diretor Ronald Neame não esperou muito tempo o livro criar raízes
nas livrarias e logo tratou de transformá-lo em imagens de acelerar o coração e
algumas de dar nó na garganta. Contudo, não joga simplesmente personagens em
cena á mercê da sorte como tantas produções atuais que economizam em história
para abusar de efeitos visuais. A introdução faz uma eficiente apresentação dos
personagens centrais, afinal temos que estar familiarizados com eles para nos
envolvermos com seus infortúnios e torcer para que escapem com vida. Obviamente
tais tipos assumem personalidades de fácil identificação e corriqueiros no
gênero. Como já dito, Scott faz as vezes de líder e temos o tenente frustrado
Mike Rogo (Ernest Borgnine) como o do contra do grupo que o tempo todo discute
com a esposa Linda (Stella Stevens) a quem humilha reafirmando que a tirou da
prostituição. Nonnie (Carlo Lynley) é a jovem medrosa que empaca em vários
momentos da fuga e provoca algumas mortes por tabela, James (Red Buttons) se ocupa
de ser o anjo da guarda da garota e ainda temos duas crianças chatinhas para
sumirem nos momentos mais inoportunos. Temos ainda um praticamente
irreconhecível Leslie Nielsen com pinta de galã na pele do Capitão Harrison, um
dos primeiros a empacotar, e uma carismática relação de amor entre Belle e Many
Rosen, um casal da terceira idade vividos por Jack Albertson e Shelley Winters,
ela interpretando uma senhora acima do peso que junta todas as suas forças para
passar por diversos apuros, inclusive se prontifica a mergulhar em um
compartimento submerso para destrancar uma porta confiando em sua experiência
como nadadora campeã nos longínquos tempos de estudante. Dispensando dublê e
embora não precisasse provar ser boa atriz, ela própria tomou aulas de natação
para que seu desempenho fosse o mais realista possível, esforço recompensado
com uma indicação ao Oscar como coadjuvante. Aliás, a produção ganhou o prêmio
como melhor canção e efeitos visuais, além de ser indicado em mais seis
categorias, um feito e tanto para um tipo de filme considerado puro escapismo.
O roteiro de Wendell Mayes e
Stirling Silliphant felizmente investe em situações limites que não abusam da
inteligência do espectador, sendo tudo bastante realista ou ao menos engana bem
para quem não conhece as engrenagens de um navio. Claro que há um ou outro
momento em que um personagem faz ou fala algo estúpido em horas impróprias
(Nonnie é com você!), mas no geral as cenas de perigo convencem com alto nível
de tensão. Obviamente hoje elas já podem não impactar visto a enorme quantidade
de filmes similares lançados nos anos seguintes. Daylight com Sylvester Stallone, por exemplo, é praticamente uma
refilmagem não creditada visto que as situações se repetem, inclusive a cena da
ex-campeã de natação que arrisca a vida, mudou-se apenas o conflito para um
túnel que é inundado. O cineasta James Cameron orquestrou com seu Titanic a tragédia como um verdadeiro
espetáculo visual usando e abusando de efeitos computadorizados de ponta. Neame
pode não ter se estendido apresentando detalhes do momento em que a embarcação
vira, mas o pouco que mostrou é bem realizado e a intenção era justamente
mostrar os apuros dos personagens pós-catástrofe com a corrente de água
inundando pouco a pouco o navio e assumindo papel de vilã. Embora realizado em
uma época em que a computação gráfica ainda engatinhava, O Destino
do Poseidon apresenta cenas literalmente de tirar o fôlego
usando grandiosos sistemas hidráulicos e efeitos mecânicos, o que deixa tudo
mais realista, emocionante e sem exageros gráficos. Como era uma produção de
grande porte, por problemas financeiros as filmagens foram paralisadas duas
vezes, o que pode justificar o final abrupto como se estivessem no prazo limite
de finalização. De fato, a conclusão ligeira e simplória é um pouco
decepcionante em comparação a tudo que foi apresentado até então, mas nada que
estrague a diversão não deixando nada a dever a qualquer filme-catástrofe da
atualidade. Em 1979 foi produzida uma sequência, Dramático Reencontro no Poseidon que não chegou aos pés do
primeiro, e em 2006 Poseidon fez uma
atualização do enredo, mas escorado em um show de efeitos digitais. Fique com o
original.
Vencedor do Oscar de efeitos especiais e canção
Aventura - 117 min - 1972
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