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quarta-feira, 29 de setembro de 2021

INTRIGAS


Nota 7 Destinado a adolescentes, longa é acima da média e traz questionamentos relevantes


Fofoca como tema de um filme. Pode parecer algo abstrato, mas que rende boas histórias, vide o apoio da crítica e das premiações à obras como Desejo e Reparação e Dúvida, ambos sobre boatos maldosos que acabaram por interferir drasticamente no curso natural da vida de seus envolvidos. Lançado anos antes, o pouco visto e tampouco lembrado Intrigas se apoia justamente sobre o quanto uma mentira pode destruir reputações e levar a situações perigosas e irreversíveis, no caso um problema instaurado em ambiente universitário e contemporâneo (lembrando que é uma produção do ano de 2000, mas que não deve diferenciar muito do universo teen dos anos seguintes). Fazer um suspense jovem é uma equação bem fácil de se resolver. Basta pegar um tema comum a qualquer grupinho de adolescentes, adicionar uma pitada de paranoia, misturar com sociopatas e pronto. No caso do longa em questão a diferença é que as vítimas não são atingidas por armas de fogo ou objetos pontiagudos, mas são feridas por algo tão ou mais potente: as más línguas.

Em uma universidade, uma aula do professor Goldwin (Eric Bogosian), abordando o poder da mídia para transformar boatos em histórias atrativas, acaba por despertar o interesse dos estudantes Derrick Wedd (James Marsden), o riquinho metido a conquistador, Cathy Jones (Lena Headey), a inteligente rebelde, e Travis (Norman Reedus), o artista perturbado. Com muito tempo e dinheiro sobrando, o rapaz abastado resolve se divertir espalhando um boato pela faculdade para ver qual seria a reação de outros estudantes e consegue persuadir seus amigos a participarem da farsa. As vítimas seriam Naomi Preston (Kate Hudson) e seu namorado Beau Edson (Joshua Jackson), dois jovens ricos, bonitos e de reputação irretocável, perfis que comumente despertam inveja. Ao ver a jovem alcoolizada nos braços do rapaz durante uma festa, o trio de desocupados espalha uma aparente pequena fofoca sobre a intimidade do casal. Embora de fato nada demais tenha acontecido entre eles, justamente naquela noite o estudante apresentou comportamento um pouco alterado, o que alimenta ainda mais as desconfianças dos colegas de que o rapaz violentou a namorada.


Em meio a tantos boatos, Naomi, uma puritana convicta e de família rica e influente, passa a acreditar que foi mesmo vítima de um estupro enquanto estava desacordada e presta queixa contra o namorado que acaba sendo preso injustamente. Para o rapaz, o fato pode acabar com um futuro profissional brilhante enquanto para a moça está em jogo sua reputação que pode ficar marcada como uma garota libertina e desregrada. E o que ganham as pessoas que arquitetaram esse plano? Absolutamente nada, salvo alguns momentos de descontração e ego inflado ao verem que conseguiram manipular dezenas de pessoas e agitaram todo um campus universitário. No entanto, conforme a polícia avança nas investigações, Cathy se arrepende do que fez e resolve desfazer o mal entendido, mas conforme se aproxima de Naomi ela descobre coisas que não sabia sobre Wedd, até então seu melhor amigo. Da mesma forma que o riquinho fez de gato e sapato o casal modelo da universidade, certamente ele não teria escrúpulos de acabar também com a vida de seus amigos.

Pelo título e material publicitário você não dá nada pelo filme, mas vale a pena assistir e aprender a lição do roteiro escrito por Gregory Poirier em parceria com Theresa Rebeck. Uma simples fofoca pode virar armar mortais nas mãos, ou melhor, nas bocas de gente maledicente. No início a produção não empolga muito e o argumento de manchar a reputação de jovens de boa índole remete diretamente a trama do sucesso Segundas Intenções lançado um ano antes que por sua vez é uma releitura do clássico Ligações Perigosas, produção de época que já mostrava que destruir imagens e nomes é o passatempo preferido de ricaços há muito tempo, talvez pelo fato de terem muito tempo ocioso e pouco com o que se preocupar. Na realidade é o personagem de Marsden, diga-se de passagem com ótimo desempenho trabalhando a ambiguidade de Wedd, quem tem grana e isso seduz Cathy e Travis a seguirem seus passos para assim serem aceitos e usufruírem de seu universo de falso poder. Só assim para explicar como alguém pode se divertir com joguinhos tão tolos, mas o longa mostra o quanto uma pequena mentira pode crescer e fugir do controle a ponto de assumir proporções trágicas envolvendo traições, medos, rancores e outros negativismos. 


Muitas vezes não pensamos nas consequências de nossos atos e pensar duas vezes antes de falar algo está em desuso. A emoção sempre fala mais alto que a razão e, como diz o ditado quem conta um conto aumenta um ponto, conforme a história cai na boca do povo várias versões do mesmo fato surgem e é aí que a trama fisga em definitivo a atenção do espectador. É quando surgem detalhes sobre o passado de Wedd e Naomi acompanhados de reviravoltas rápidas que oscilam entre o óbvio e o surpreendente, mas no geral a trama não decepciona apesar do final pouco inspirado. E não estranhe o estilo telefilme da produção. Lançado em cinemas, ainda que com passagem relâmpago, Intrigas tem direção de Davis Guggelheim, oriundo de seriados, assim como boa parte do elenco. Anos mais tarde ele dirigiu o famoso documentário Uma Verdade Inconveniente, produção de peso para seu currículo. Uma pena ver que Marsden, então em alta entre os teens, não ganhou a atenção merecida nos anos seguintes, ainda que tenha destaque nos longas dos mutantes X-Men, e Hudson tenha ficado relegada a comédias água-com-açúcar. E o restante do elenco... Bom deixa para lá.

Suspense - 90 min - 2000 

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