NOTA 7,0 A história de amor é o que menos importa em drama que traz vários pontos relevantes a respeito de como superar uma perda |
Há males que vem para o bem. Duas
pessoas acabam unidas por conta de tragédias pessoais, ou melhor, três. Assim
resumidamente se define Por Amor, drama eficiente e com bom
argumento, mas prejudicado pelo genérico título nacional que vende uma produção
romântica adocicada. O clima gélido da cidade em que a trama se passa, cujo
nome não é especificado, a trilha sonora melancólica e a opção por cores frias
nos cenários e figurinos revelam o tom sério da produção. O longa de estreia do
diretor e roteirista David Hollander é muito mais profundo que seu título pode
sugerir e trabalha com um dos maiores medos do ser humano: a morte. Na verdade
não aborda o medo individual de simplesmente deixar de existir e tampouco
dúvidas se há outra vida depois desta, mas sim como os parentes dos falecidos
lidam com a dor da perda. Se já é difícil se acostumar com a ideia de que
alguém pode morrer por causas naturais ou por conta de alguma doença, imagina o
quanto é complexo compreender que uma vida foi interrompida por causa de um ato
crimino. É essa situação que acaba aproximando os protagonistas desta obra que
começa com uma narração em off de Clay (Spencer Hudson), um adolescente que
nasceu surdo e mudo e é através de seu relato mental que a história toma corpo.
Seu pai foi assassinado por Mark Jankowski (Brock Johnson), um grande amigo da família
que por coincidência aparece na última foto que ele tem do falecido, uma ironia
do destino. A dor desta perda acaba levando-o a se identificar com o drama
vivido por Andrew Blount (Ashton Kutcher), um jovem esportista que abandona
seus sonhos abalado pelo inesperado e brutal assassinato da irmã gêmea queimada
e mutilada. Ambos não só perderam de forma cruel seus entes queridos, mas
também possuem a sensação de terem herdado as coisas que os falecidos deixaram,
mais especificamente suas famílias machucadas para sempre. Os dois, no entanto,
se conhecem por um acaso. Andrew estava acompanhando Gloria (Kathy Bates), sua
mãe divorciada, a um grupo de apoio aos familiares de vítimas de atos violentos
quando conheceu Linda (Michelle Pfeiffer), a mãe de Clay. Ambas as mulheres
dividiram suas histórias, angústias e sonhos desfeitos com o grupo, mas a
relação destas famílias sói vai ganhar laços sólidos nos tribunais. O
julgamento do acusado de matar o marido de Linda não é muito explorado pelo
roteiro, acaba sendo solucionado de forma rápida, mas é a desculpa necessária
para aproximar a viúva de Andrew, este que terá uma longa jornada em busca de
justiça.
São várias cenas dispensadas para
mostrar a angustiante rotina de Andrew que comparece incansavelmente a cada
nova audiência sonhando com um resultado favorável ao seu clã. O acusado do
crime, Tom Friedinger (Aleks Paunovic), é um homem que tem um histórico de
problemas mentais, mas não existem provas suficientes para condená-lo, pior
ainda, a vítima é que tem má fama e complica o julgamento com várias
testemunhas e evidências que indicam que a irmã de Andrew se expunha a
situações de risco aceitando encontros com vários homens desconhecidos. Embora
em nenhum momento fosse acusada de ser prostituta, porém, ela também não sabia
sequer quem era o pai da filha que ficou sob a guarda de Gloria. O irmão, no
entanto, não quer acreditar que de certa forma sua irmã buscou a própria morte
e praticamente paralisou sua vida enquanto o veredito não é dado. Nesse
momento, ele continua com seus treinamentos físicos para se livrar do estresse,
mas abdicou da luta profissional e agora trabalha ganhando uma miséria
fantasiado de frango convidando as pessoas a entrarem em uma lanchonete. Sua
frustrante ocupação revela seu estado de espírito. Em uma das várias audiências
que comparece Andrew se aproxima de Linda, ambos simplesmente com o desejo de
obterem justiça, mas aos poucos surge uma amizade que logo se transforma em
amor, mesmo com a diferença de idade, sentimento apoiado na superação de suas
dores. Bem, o envolvimento amoroso poderia ter sido mais bem desenvolvido.
Linda trabalha na organização de festas de casamentos e inevitavelmente sempre
se emociona ao ouvir as palavras dos padres. Ouvir “até que a morte os separe”
para ela é muito doloroso e numa dessas ocasiões estava acompanhada de seu novo
amigo e acabam se beijando impulsivamente. Não temos aquela sensação de uma
paixão avassaladora porque de fato não é. A união dos protagonistas se dá como
forma de apaziguarem seus problemas, uma relação de apoio mútuo, principalmente
depois que Andrew assume o papel de uma espécie de mentor para Clay, este que
se tornou ainda mais introspectivo após a tragédia. Com raiva do mundo e
constantemente humilhado por colegas, o adolescente é incentivado a aprender
luta como um hobby, uma forma de exteriorizar seus ressentimentos.
Bates, acostumada a ter elogiadas
personagens coadjuvantes, aqui não rouba a cena, embora emocione em sua
primeira aparição em que mostra seu álbum de fotos da filha e também na
sequência em que está realizando um bazar com os pertences da falecida. Em
poucos minutos ela passa toda a dor de uma mãe tentando se convencer de que não
adianta manter as coisas da garota por perto, ela não voltará. Contudo, o show
é dos três outros personagens de destaque da trama. Pfeiffer dá vida a sua mãe
sofredora sem exageros, optando por uma performance simples e cativante.
Percebemos sua dor, porém, ela precisa manter-se em equilíbrio não só para dar
continuidade a sua rotina, mas também para apoiar Clay que sofre em silêncio e
em sua inocência acredita que somente a justiça com as próprias mãos pode
apaziguar seu espírito. Kutcher, geralmente criticado por este trabalho, talvez
sofra de preconceito. As pessoas estão acostumadas a vê-lo em papéis cômicos e
de conquistadores e devem estranhar na posição de um rapaz sofredor. Todavia,
ele supera expectativas retratando toda a dor de um jovem que viveu os últimos
meses em razão de um objetivo, mas por fim encasqueta que a culpa da morte da
irmã é sua por ter ido embora tentar a vida em outra cidade e a deixando sem a
proteção de um homem em casa. Seu personagem acaba ganhando a simpatia do
espectador por conta da relação que estabelece com Clay, uma espécie de
compensação colocando-se como se fosse um irmão mais velho do garoto, o
aconselhando e protegendo tentando redimir sua culpa já que deveria ter feito o
mesmo pela irmã. Já Linda vê Andrew como um par romântico de verdade e porque
não como um padrasto para o filho, sendo que a questão de preconceitos em
relação a diferença de idade praticamente é omitida na trama para não desviar a
atenção do foco principal: o renascimento através da dor. Todos os envolvidos
terão que aprender a viver a nova realidade trazida pela tragédia. Linda tem
maturidade suficiente e um trabalho que ocupa seu tempo e mente para não remoer
problemas, mas Andrew não. Sua vida tornou-se um grande vazio que nem mesmo uma
nova paixão, o carinho da sobrinha ou um novo amigo foi capaz de preencher.
Obviamente haverá um momento de ruptura do casal protagonista e a partida do
rapaz trará uma grande reviravolta que então remontará à introdução. Apesar de
exceder em seu tempo de duração, Por Amor é uma bela obra que merece
ter seu potencial reconhecido. Realista, intimista e reflexivo, é um trabalho
cujo clima frio envolve como poucos, basta estar preparado para acompanhar uma
história de amor entre pessoas comuns, não necessariamente de um casal, mas sim
de uma família formada às custas do infortúnio.
Drama - 110 min - 2007
Gostei bastante do filme quando o vi há algum tempo. Além disso, sou grande fã de Michelle Pfeiffer.
ResponderExcluirAbraços.