NOTA 6,5 Adaptação de famoso desenho para os cinemas tem premissa boa, mas detonada pelo excesso de cores e sons que dispersam atenção |
Um filme infanto-juvenil de
sucesso pode gerar um seriado live-action ou de animação que corresponda
expectativas. O caminho inverso também pode acontecer, sendo totalmente
possível uma série de desenhos animados produzidos para TV ganhar sua versão
com atores reais para as telonas. A moda não é recente, por exemplo, nos anos
80 o brucutu Rambo já havia ganhado sua versão abrandada em animação com
episódios curtos e He-Man deu uma passadinha pelos cinemas em uma produção
trash. Na época produtos do tipo eram lançados a toque de caixa para aproveitar
a moda, mas anos mais tarde em meio a crise de criatividade hollywoodiana as
atenções foram voltadas para a nostalgia do público, assim voltaram a cena os
heróis uniformizados, carros que se transformam em robôs e até os ingênuos
Smurfs. A justificativa para escamotear a falta de ideias originais é que agora
com tecnologia avançada é possível recriar com perfeição o mundo dos desenhos
para o live-action e vice-versa. Bem, se tomarmos como exemplo Speed
Racer comprovamos tal explicação. Esse é o primeiro filme dirigido
pelos irmãos Andy e Larry Wachowski após o fim da trilogia Matrix em 2003, assim não é de se espantar que a adaptação do anime japonês “Mach Go Go Go” criado nos anos 60 por Tatsuo Yoshida (o título homônimo ao
filme foi dado quando a série animada chegou aos EUA, o que proporcionou sua
popularidade mundo a fora tirando o foco do automóvel e jogando sobre o piloto)
seja apoiada em uma avalanche de efeitos
especiais que tem como objetivo ludibriar o espectador para que ele não perceba
o roteiro fraco também criado pela dupla de diretores. A intenção era trabalhar
em um projeto de apelo popular, um filme-família cujo universo fosse de mais
fácil identificação por plateias distintas. É fato que os Wachowski são fãs
assumidos do material original e procuraram respeitar ao máximo a essência da
trama, mas ao mesmo tempo tinham que trazer na película algum diferencial que
sacudisse o cenário cinematográfico tal qual fizeram nos final da década de
1990. O problema é que o feitiço voltou contra os feiticeiros e justamente o
visual supercolorido e a frenética edição fizeram com que a aventura colhesse
críticas negativas e amargasse uma baixa bilheteria. Só os primeiros minutos já
são um verdadeiro teste para a saúde dos olhos, ouvidos e nervos dos
espectadores, principalmente para aqueles que nunca tiveram contato com sua
versão em animação, mas para quem conseguir se transportar para este universo a
diversão pode ser razoável, afinal claramente a intenção era fazer um casamento
entre atores reais e elementos de desenhos animados, uma ambientação onde
absolutamente tudo é possível.
A trama narra as aventuras do
jovem piloto Speed (Emile Hirsh) e seu potente carro Match 5 nas pistas de
corrida. Ele nasceu para isso e desde pequeno demonstrava um estilo agressivo e
objetivo ao volante, reflexos diretos da influência da família Racer em sua
criação, todos obcecados por veículos e velocidade. Seu pai, Pops (John
Goodman), possui uma oficina mecânica e sempre estimulou o filho mais velho Rex
(Scott Porter) a seguir carreira no automobilismo, mas uma fatalidade acaba
matando o rapaz e o mecânico perde o entusiasmo com este esporte. Anos mais
tarde, Speed, contando com um carro construído pelo próprio pai, tenta
recuperar o prestígio da família no meio para a felicidade de sua mãe (Susan
Sarandon), seu irmão mais novo Gorducho (Paulie Litt) e até para Chim Chim, o chimpanzé de estimação do clã (o gordinho e o símio formam uma dupla impagável e
responsável pelo humor da fita). No entanto, o cenário que o jovem encontra não
é dos melhores. Além da autocobrança de tentar ser melhor que o falecido irmão,
Speed acaba ganhando inimigos aos dispensar uma tentadora oferta do empresário
Royalton (Roger Allam) que gostaria de contar com o rapaz representando sua
empresa nas pistas usando seus automóveis, porém, forjando resultados e
comprando vitórias. Para combater tais irregularidades que vão totalmente
contra os valores defendidos pelos Racer, ele recebe a ajuda da namorada Trixie
(Christina Ricci), do mecânico Sparky (Kick Gurry) e do novato piloto Taejo Togokhan
(Rain). É bem interessante a discussão abordada sobre o mundo capitalista onde
não basta ter talento, mas também disposição para ser o melhor custe o que
custar mesmo que seja necessário se render a trapaças, principalmente porque as
grandes e mercenárias corporações estão aí para dar as cartas (talvez uma
alusão a interferência dos patrocinadores no mundo esportivo), mas será que tal
mensagem é captada pelo público infantil?
Dificilmente e é provável que ela passe despercebida até mesmo pelos
adultos, já que a profusão de cores e barulhos ensurdecedores suplantam a trama
que com cortes abruptos na cadência de som insere diversos flashbacks para
tentar ajudar a situar o espectador em meio a tanta bagunça visual e narrativa.
Ainda tem o agravante do excesso de personagens para confundir ainda mais. Além
dos já citados, entre tantos outros, temos participações ativas do mafioso
Cruncher Block (John Benfield) e dos inescrupulosos corredores Snake Oiler
(Christian Oliver) e Cannonball Taylor (Ralph Herforth) que fazem o possível e
o impossível para se manterem no pódio.
Além de combater a corrupção no
automobilismo, Speed ainda terá que enfrentar e ao mesmo tempo contar com a
ajuda do misterioso Corredor X (Matthew Fox), um antigo rival das pistas que
esconde um grande segredo sob sua máscara. Eles vivem uma estranha relação em
que proteção, admiração e ressentimentos se confundem e juntos precisarão
enfrentar um perigoso circuito conhecido pela participação de competidores
trapaceiros. Apesar de adolescente, Speed aparece sério demais quando deveria
ter uma ingenuidade que fizesse contraponto ao jeito seco e confiante com que o
Corredor X se apresenta. Com o excesso de personagens e mais espaço dedicado
para a adrenalina, é normal que os personagens não tenham uma evolução
avassaladora, sendo a mais prejudicada Sarandon com pouco tempo de cena e um
papel com mínima função. Ricci também acaba ficando apagadinha, mas com a
justificativa que o romance que vive com o protagonista deveria seguir a linha
comportado, respeitando a inocência da criação original. O tom infantil dado a
obra que desagradou a muitos na verdade foi a forma que os diretores
encontraram para preservar justamente o clima dos anos 60, algo nítido
principalmente nos cenários e figurinos com cores vibrantes e reforçados pelo
ritmo ágil que remete a ideia que os produtos culturais da época vendiam a
respeito do século 21, um período em que a velocidade ditaria o modo de viver
das pessoas. Todavia, tantas cores e movimentos, embora os desenhos antigos
também contassem com tais elementos, podem não agradar justamente os mais
velhos, mas serem aprovados pelas novas gerações acostumadas com videogames e
filmes em que a história pouco importa, o que vale são imagens espetaculares. Utilizando
gravações dos atores em fundo falso inseridas em imagens criadas via efeitos de
computação de ponta, a mesma tecnologia empregada anteriormente em Capitão Sky e o Mundo de Amanhã, por
exemplo, os Wachowski realmente criaram um mundo singular, mas que após seu
impacto inicial, se é que ele realmente acontece de forma positiva, passa a
cansar, clamamos por uma cena sequer com predomínio de cores mais frias, quiçá
o branco puro. Assim como a versão americana do desenho valorizou a imagem do
piloto em detrimento do automóvel, a versão live-action de Speed Racer desejava
fazer o mesmo, mas acabou dando mais atenção aos carros e suas corridas, mas de
forma que minuto a minuto distancia quem assiste, culminando em uma conclusão que
não transmite a sensação de vitória, mas sim de alívio após mais de duas horas
de uma forçada viagem psicodélica.
Aventura - 135 min - 2008
Na época a crítica foi tão ruim que quando assisti o filme no cinema me surpreendi e achei bem legal e divertido. Eu gostei do visual, ficou bem a cara de mangá japonês cheio de cores e exageros.
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