NOTA 8,0 Comédia romântica para maduros diverte a todas as idades e ainda traz reflexões pertinentes, questões que podem atingir certos espectadores |
As comédias
românticas tendem a privilegiar os amores adolescentes ou as neuroses de jovens
adultos que teimam em não crescer ou lutam o quanto podem para se adequar ao
perfil das pessoas de sua faixa etária, o que implica muitas vezes em busca
desesperadas por um parceiro só para dizer que tem alguém para amar e ser
amado. Quando o foco é voltado a conflitos envolvendo casais maduros,
automaticamente sentimos um diferencial, mesmo que no fundo as situações
clichês se façam presentes e o final feliz esteja garantido. Um
Divã Para Dois é um ótimo e raro exemplo de filme que aposta em humor
de bom gosto para agradar um público que geralmente sente não ter opção para
rir, a não ser que deixe seu espírito teen aflorar e embarque em baboseiras que
são lançadas as baciadas mensalmente nos cinemas e locadoras. É certo que a
turma de meia ou terceira idade hoje em dia está bem mais animadinha e
aceitando certos modernismos, mas ainda privilegiam certas tradições como a
manutenção da instituição que é o matrimônio. Isso não significa apenas manter
respeito mútuo ou aparentar perante a sociedade que o casal está feliz mesmo
após tantos anos de união. Sexo é vital, mas anda em falta em muita união e em
alguns casos mais graves nem o amor dá mais sinais de vida, faltando até aquela
palavra de carinho diária tão necessária. O diretor David Frankel, de O Diabo Veste Prada, conseguiu realizar
uma obra extremamente divertida, sem um pingo de vulgaridade e ainda por cima
incômoda. Sim, isso mesmo. Muitos espectadores podem se identificar com o
conflito do casal protagonista, até mesmo jovens, e podem se aborrecer ou optar
por assistir o longa até o fim e tirar algum proveito dele em benefício
próprio. Mirando mais especificamente no público americano mais maduro e de
classe média, o roteiro de Vanessa Taylor consegue a proeza de se comunicar com
diferentes faixas etárias e nacionalidades, afinal em praticamente todo o mundo
quem tem mais idade se sente rejeitado e privado de fazer certas coisas. Qual
filho já crescidinho nunca teve a curiosidade de saber se seus pais ainda
mantêm uma vida sexual ativa? O problema é descobrir que eles podem gastar suas
energias fora de casa e com outros parceiros, o que não é o caso de kay (Meryl
Streep) e Arnold Soames (Tommy Lee Jones), casados há pouco mais de trinta anos
e cujo inimigo é a rotina que os fez se acostumar com a monotonia.
O casal não
tem planos para o futuro e sabe que o amor entre eles ainda existe, mas não
conseguem demonstrar. Ou melhor, Kay até tenta se aproximar do marido de forma
mais íntima, mas é gentilmente repelida por ele que se aproveita da desculpa de
que cada um dorme em um quarto próprio por conta de suas manias, como o
controle diferenciado da temperatura do ambiente. No entanto, eles não brigam e
são nulas as suspeitas de traições de ambas as partes. Para serem felizes,
basta ele saber que a esposa está cuidando dos afazeres da cozinha e ela, por
sua vez, que o marido está na sala assistindo tediosos programas esportivos.
Aliás, um super pacote de canal pago é o presente que Arnold deu à mulher no
último aniversário de casamento, algo que ele irá aproveitar bastante tanto
quanto o aquecedor de água com o qual a presenteou em outra ocasião para terem
um banho mais relaxante (individualmente, é claro). E onde fica o romantismo
dos primeiros anos de convivência? Onde estão as flores, as jóias e os
chocolates? Com os filhos já criados e fora de casa, os Soames se acostumaram a
levar o cotidiano na base do piloto automático e assim como para a maioria dos
casais já a algum tempo juntos a necessidade dos agrados individuais tornou-se
obsoleta, sendo mais vantajoso um presente para o lar, algo que será
compartilhado entre os dois. Será que todos concordam com isso ou é apenas
comodismo de alguns? Kay não se conforma mais com essa situação e resolve tomar
uma séria decisão: recorrer a terapia de casal. Ao tomar conhecimento do
conceituado Dr. Feld (Steve Carell – surpreendendo ao viver um papel sério),
ela resolve investir as economias em uma viagem de uma semana para a simpática
cidadezinha de Hope Springs onde iniciarão um tratamento psicológico que pode
salvar ou terminar de destruir esse casamento definitivamente. Obviamente,
Arnold reluta inicialmente negando que existam problemas entre eles para serem
resolvidos em um divã, embora no fundo o que pese contra a viagem seja o fato
de sair da rotina e, o pior de tudo, gastar dinheiro com o que julga
desnecessário. Ele reclama de pagar pela comida em restaurantes, do preço do
hotel, mas nada supera o baque que sofre no consultório do terapeuta. A razão
de ele estar lá é seu “não comparecimento”, ou seja, a falta de sexo. Já sabia
disso, mas não imaginava que a esposa teria coragem de expor esse detalhe
íntimo na frente de um estranho com direito a pormenores que o colocam em uma
tremenda sai justa. Kay anseia não especificamente por alguns minutos de sexo,
mas sim de um toque delicado em seu ombro ou uma bela palavra que exprima que
ainda existe amor por parte de seu marido, mas ele muito durão há anos se nega
a demonstrar o mínimo de carinho, ou melhor, acredita que dando os já citados
presentes para o lar esta demonstrando que ainda se preocupa com a esposa.
Na realidade,
o que prende este casal é o constrangimento, é pensar que as pessoas podem
comentar qualquer gesto mais íntimo, mesmo que seja um simples entrelaçar de
mãos ou troca de beijo-selinho durante um passeio por um parque, preocupação
remanescente de gerações anteriores quando era comum casais serem desfeitos
ainda muito jovens por conta da morte de uma das partes. Ver a pessoa viúva em
companhia de outra em situações “comprometedoras” era dar assunto para os
fofoqueiros de plantão. Não é o caso, mas os protagonistas parecem relutar a
aceitar que os tempos mudaram e que os casais de mais idade têm todo o direito
de viverem as mesmas emoções que os jovens. Até Kay que tem a iniciativa do
tratamento sente-se incomodada no fundo, como demonstra as várias vezes que
leva sua mão a boca dando um leve tapinha como uma espécie de auto-penitência.
Até o livro recomendado pelo doutor ela busca na livraria como se fosse algo
proibido. O longa deixa subentendido tal medo em várias cenas, mas o palco é
armado para perguntas e respostas objetivas rondando o comportamento sexual e
afetivo dos protagonistas, mas jamais de forma agressiva, pelo contrário. Quase
que oferecendo uma sessão de terapia também aos espectadores, Um
Divã Para Dois aborda o sexo sem constranger, principalmente pela opção
intimista de desenvolver a trama. Com ritmo lento e privilegiando planos
fechados, o espectador é convidado a fazer parte da intimidade do casal, algo
que fica ainda mais latente pelo visual dos cenários que inspiram aconchego. O
roteiro poderia facilmente descambar para o humor pastelão, cabendo até a
fantasia do terapeuta se aproveitar da fragilidade de sua paciente e assim
comprar briga com o maridão dela que com o orgulho ferido finalmente
demonstraria amá-la de verdade. Felizmente a abordagem é madura e respeitosa
propondo o acompanhamento das fases de reestruturação de um relacionamento
combalido, desde o evidente distanciamento captado quando os cônjuges se sentam
no sofá do consultório de terapia até a reaproximação na cama, também podendo
ser no chão duro desde que o clima favoreça o romantismo. Por isso é justificável
as várias tentativas frustradas de Kay em reaquecer a relação, não soando
repetitivas. Jones e Streep demonstram uma química perfeita em interpretações
totalmente críveis que flertam com o humor e o drama, transformando esta
produção não apenas em um mero passatempo, mas sim em uma obra a ser lembrada
pelo frescor que carrega consigo a um gênero tão saturado e que não raramente esquece-se
de divertir o público, preferindo entediá-lo ou constrangê-lo.
Comédia romântica - 100 min - 2012
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Este espaço está aberto para você colocar suas críticas ao filme em questão do post. Por favor, escreva o que achou, conte detalhes, quero saber sua opinião. E não esqueça de colocar a sua avaliação do filme no final (Ruim, Regular, Bom ou Excelente).