NOTA 5,0 Narrativa fragmentada até alinhava coerentemente a vida de personagens, mas falta algo para dar liga à mistura |
Cada vez mais
tem sido frequente o uso de narrativas fragmentadas no cinema, histórias que
interligam a vida de personagens através de sentimentos ou situações e os
dramas se beneficiam muito deste estilo. Ligados Pelo Crime aposta em uma
gama de personagens que se associam pelo envolvimento com o mundo do crime ou a
violência, podendo cada um se entregar ao declínio total ou optar pela
redenção. Seguindo o estilo de Crash – No
Limite, por exemplo, o longa utiliza um elemento-chave que pode modificar
vidas, no caso uma pessoa em específico, um criminoso. Baseado em um antigo
provérbio chinês que divide a vida em quatro sentimentos distintos e essências
aos seres humanos em todas as fases de sua vida, o longa se divide em capítulos
intitulados por estas emoções, mas todos com conexão. Cada ato tem um
protagonista que na verdade não recebe nome, com exceção de um que atende por
uma nomeação falsa, talvez uma forma simbólica que o diretor Jieho Lee
encontrou para dizer que tais personagens são pessoas comuns, qualquer um
poderia estar sujeito aos mesmos conflitos. A trama roteirizada pelo próprio
cineasta em parceria com Bob DeRosa começa bem com “Felicidade”, ato defendido
com vigor por Forest Whitaker interpretando um homem que quando era criança
acreditava que sua dedicação à escola lhe traria ainda mais estudos, no entanto,
futuramente, todos os seus esforços lhe garantiriam um bom emprego e finanças
confortáveis. Na atualidade ele inveja quem pensa dessa forma. Apesar de ter um
padrão de vida razoável, este bancário não é feliz e sofre com seu vício em
apostas. Depois de ouvir às escondidas o nome do possível campeão de uma
corrida de cavalos, ele aposta alto, mas a sorte não estava do seu lado e agora
ficou devendo uma grande quantia e cai nas mãos do mafioso Fingers (Andy
Garcia), ou na tradução brasileira Dedinhos, apelido que ganhou por só estalar
os dedos e todos fazerem o que ele manda. Ameaçado e sem nada mais a perder ele
então planeja ironicamente assaltar um banco para saldar sua dívida. “Prazer”,
o segundo ato, é protagonizado por Brendan Fraser vivendo um dos capangas do
chefão do crime que tem o dom de prever o futuro, porém, sem poder fazer nada
para alterá-lo. Ele deve ajudar Tony (Emile Hirsch), o sobrinho aloprado de
Fingers, a se familiarizar com o submundo e não demora muito para o jovem se
meter em confusão, algo que o vidente já previa, porém, sua previsão estava
parcialmente errada pela primeira vez.
Procurando
lucrar de todas as formas possíveis, Fingers está de olho em uma jovem pop star
que está em ascensão e quer administrar suas carreira e finanças. Em
“Sofrimento”, Sarah Michelle Gellar vive uma cantora bonita e graciosa, mas que
sofre preconceito justamente por ser considerada apenas mais uma estrela de
fama passageira, tanto que é questionada em uma entrevista porque não revela
seu nome verdadeiro preferindo ser chamada de Trista como se fosse um produto.
A garota quando procurada pelo mafioso não gosta da ideia dele ajudá-la
utilizando-se da sua influência, mas não escapa. Certa noite ela é surpreendida
por sua visita e de seu bando dizendo que o empresário dela limpou sua conta
bancária para pagar o que lhe devia e que agora sua carreira dependia
exclusivamente da boa vontade do bandidão. Seu capanga-vidente já previa que o
futuro não seria promissor para a cantora e procura ajudá-la escondendo-a em um
local afastado, mas logo ele se apaixona por essa mulher que é o atual desejo
de seu chefe. Por fim, em “Amor”, Kevin Bacon interpreta um dedicado médico que
reencontra um amor do passado, Gina (Julie Delpy), uma bióloga que em meio a
suas experiências acabou sendo mordida por uma cobra altamente venenosa e agora
precisa urgentemente de transfusão de sangue. É quando ele vê por um acaso uma
entrevista de Trista na qual era brincava que seu diferencial entre outras
estrelas jovens da música era seu tipo sanguíneo raro, coincidentemente o mesmo
de Gina. O problema é que a cantora ainda está na mira de Fingers e outros
contratempos lhe afligem, pensando até mesmo em acabar com a própria vida para
acabar com seu sofrimento. Os personagens de Whitaker, Fraser e Gellar buscam
mudar os rumos da sua vida cada qual a sua maneira. Já o médico de Bacon não
demonstra tal objetivo já que mesmo salvando seu amor do passado não poderia
tê-la ao seu lado afinal já está casada com outro, no entanto, este homem tem importância
por unir definitivamente todas as histórias, mas curiosamente no último ato
esse elo é desfeito de forma difícil de explicar, justamente quando deveria ser
o clímax da obra. O problema é que a trama do médico tentando salvar a amada
não cativa devido a rapidez com que é desenvolvida e o realismo aplicado até
então abre espaço para soluções fáceis, tudo em nome da emoção.
O título
original, algo como “O Ar que Respiro”, é enigmático e sugere diversas
interpretações. Os personagens principais poderiam estar vivendo sufocados e em
busca da libertação. O oxigênio é um bem comum e necessário a sobrevivência de
todos, o que fatalmente conecta os seres humanos que precisam compartilhar esse
tesouro. A imagem de uma borboleta vez ou outra cena também chama a
atenção. Símbolo de mudança, beleza ou liberdade, é fato que é intrigante a
antítese proposta em um filme teoricamente denso. Tal inseto está
presente no roteiro, literalmente e em metáfora, visto que seu nome é o mesmo
do cavalo que surge no primeiro ato e deflagra todos os conflitos. Talvez só o
próprio Lee possa explicar esta simbologia e quem sabe assim o resultado final
poderia ser mais bem assimilado. Fica clara a mensagem de que os atos
individuais podem influenciar outras vidas, mas a sensação incômoda de que
faltou algo para dar liga a essa mistura persiste. Apesar das boas tramas e
suas críveis interligações, o longa infelizmente não emociona, ainda que possa
incomodar por nos fazer constatar mais uma vez que o mínimo contato com o mundo
do crime é o passaporte para uma série de infortúnios ou de uma vida
desregrada, mas a redenção sempre é possível. Com um elenco tão diversificado e
inflado, com nomes famosos e competentes, também era de esperar interpretações
mais marcantes, mas no máximo o que temos são perfis triviais, sendo Whitaker o
maior destaque ao lado de Garcia, mesmo com um papel um tanto estereotipado. Ligados
Pelo Crime tinha potencial para ser uma produção bem melhor, mas no
final das contas é apenas mais um passatempo tecnicamente bem feito, com trama
razoavelmente desenvolvida e amarrada e que segura a audiência pela curiosidade
em descobrirmos como tantos conflitos serão concluídos. Cheio de boas
intenções, Lee se atrapalha por querer fazer mais do que podia, claramente
tentando copiar exemplos de outros filmes similares que acabaram por cair na
graça da crítica e serem indicados a prêmios. Com um final chapado e
frustrante, infelizmente este é um produto esquecível e que só deve deixar
alguma marca por algumas sequências isoladas e inspiradas.
Drama - 95 min - 2007
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