NOTA 8,5 Dois pacientes com doenças graves deixam de lado suas diferenças para aproveitarem o tempo de vida que lhes restam |
É curioso como alguns filmes conseguem equilibrar
perfeitamente humor e drama na mesma receita. Mais curioso ainda é terminar de
assistir a uma obra que no fundo é triste e ainda assim se sentir com o
espírito elevado. É no significado dos velhos clichês do viva a vida
intensamente ou de aproveite cada dia como se fosse o último que está o segredo
do sucesso de Antes de Partir, longa que não ganhou prêmios e teve uma passagem
modesta nos cinemas, mas que acabou se tornando um título grandioso conforme o
tempo passou, um daqueles tipo cujo nome está sempre na ponta da língua quando
se deseja indicar um bom programa no aconchego do lar. O diretor Rob Reiner já
trazia em seu currículo outro trabalho que se tornou um clássico entre
populares, Conta Comigo, e que guarda certas semelhanças com esta produção
protagonizada por Jack Nicholson e Morgan Freeman. Em ambos ele trabalha com as
temáticas da amizade e da morte e consegue uma excelente mistura entre diversão
e reflexão. A trama começa nos apresentando a Edward Cole (Nicholson), um
empresário frio e calculista que administra um hospital. Para reduzir os gastos
da instituição e consequentemente aumentarem seus lucros ele dá ordens
irrevogáveis de que cada leito deve ser ocupado por dois pacientes sejam eles
pobres, ricos, negros, brancos, jovens ou velhos. Ironicamente a vida lhe prega
uma peça. Quando descobre que está com câncer ele é obrigado a dividir seu
quarto com o pacato Carter Chambers (Freeman), um mecânico negro que já está a algum
tempo se submetendo a um tratamento experimental para a mesma doença. Relutante
no início de ter que vivenciar uma situação que ele próprio causou, Cole acaba
se acostumando com a presença do colega de quarto e ambos começam a trocar ideias
e experiências. Chambers então lhe apresenta uma espécie de lista de desejos
que aprendeu com um professor da época de faculdade. Nela devem constar todas
as vontades e maluquices que a pessoa gostaria de realizar antes de morrer, funcionando
assim como um traçado de metas, algo que ilusoriamente prolongaria o desejo de
viver. Cole então propõe que eles façam uma lista em conjunto e tentem
aproveitar ao máximo os seus últimos meses de vida, a deixa perfeita para dar
um respiro a um enredo que poderia ser denso e depressivo.
A premissa bebe na batida fonte dos inimigos que se tornam
amigos, mas o roteiro de Justin Zackham trata as picuinhas de forma ligeira
abrindo espaço para desenrolar os bons momentos entre dois idosos que encontram
na coincidência de estarem se tratando da mesma doença o fio condutor de uma
bela amizade. É como se eles se completassem já que possuem personalidades
distintas. Além do fato de concluírem que jamais viveram da maneira que
sonhavam, o que falta em um é completado pelo outro e vice-versa, por exemplo,
a simplicidade de Chambers que faz falta a Cole que por sua vez possui a
coragem para arriscar que seu novo amigo não tem. Claro que a fortuna do
empresário colabora para seu espírito ousado, afinal jogar dinheiro pela janela
conquistado de maneira duvidosa para ele não é nada. Assim a dupla passa a
viajar por vários lugares do mundo e tem a oportunidade de realizar sonhos
juvenis como saltar de um avião em movimento ou dirigir em alta velocidade um
carrão que vale milhões. O motivo de tantos apreciarem esta produção deve-se ao
fato de suas mensagens nada subliminares, pelo contrário, todas são bem
explícitas. O valor de uma amizade, o quanto é importante o apoio de outras
pessoas em um momento difícil, que é um direito de qualquer cidadão levar uma
vida digna e fazer o que quiser até o seu último suspiro, há uma leve crítica à
questão das distribuições de riquezas e, por fim, a constatação de que na hora
da morte todos somos iguais e partir é inevitável. Sem dúvidas ter condições de
vida melhores pode significar um prolongamento da existência, como é sutilmente
mostrado em uma cena em que um médico demonstra atenção em excesso para Cole,
mas não atende a um simples pedido de Chambers, porém, ninguém é imortal.
Como já dito no início do texto, hoje é possível verificar a
aprovação popular deste trabalho, mas é certo que para quem tem o espírito
crítico mais apurado esta obra é apenas correta, valendo a pena para ver o
encontro de dois grandes nomes do cinemão americano, embora nem mesmo a atuação
da dupla passe ilesa pelos julgamentos. O grande problema apontado é a
simplicidade da narrativa que não estaria a altura dos artistas principais que
não precisam mais provar que tem talento para ninguém, todavia, qualquer ator
merece um descanso e nada melhor para eles que poderem se divertir trabalhando. Como uma grande brincadeira, é assim que devemos encarar suas presenças neste filme que, diga-se de passagem,
marca a aposentadoria entre aspas de Nicholson enquanto Freeman continua uma
presença constante no cinema, seja em bons, medianos ou, na pior das hipóteses,
péssimas produções. Em suma, a premissa de Antes de Partir pode não ser das
mais originais, porém, seu desenvolvimento compensa pela opção do roteiro em
retratar o tema dos doentes terminais de uma forma diferenciada, leve e que
traz certo conforto a quem assiste e talvez um alento para quem está passando
por situações semelhantes. Mesmo assim, a conclusão não foge a regra e leva o
público às lágrimas recorrendo a um velho truque narrativo adornado por um
rebuscado discurso. De qualquer forma, a produção cumpre bem seus objetivos
sendo sensível, simplória, divertida e edificante. Pode ter parte de sua
simpatia junto ao público pelo fato de contar com dois protagonistas de peso,
mas o mesmo pode ser o motivo para muitos a rotularem apenas como um passatempo
bonitinho. Existem filmes cujo maior mérito está justamente no roteiro e se ele
é encenado por grandes nomes melhor ainda, afinal é o público que sairá
ganhando como neste caso, a representação perfeita da união do útil ao
agradável.
Drama - 97 min - 2007
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