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terça-feira, 6 de outubro de 2015

REDENÇÃO (2009)

NOTA 6,0

Longa mostra como um ex
criminoso e drogado mudou
sua vida com a religião, mas
exagerou na dose de caridade
O título já diz tudo. Esta é mais uma história de uma pessoa que levava uma vida desregrada e que após se envolver com a religião passou a ver a vida com outros olhos e seu até então frio coração foi aquecido pelo sentimento da solidariedade e da justiça. Cada vez mais os filmes com temáticas religiosas aplicadas no cotidiano estão ganhando espaço no circuito comercial e chegando com mais facilidade aos “fiéis” que por sua vez tratam de fazer a propaganda boca-a-boca das produções assim aguçando a curiosidade de outros públicos. Se antes tais projetos eram restritos a profissionais pouco conhecidos ou até mesmo amadores, hoje eles já chamam a atenção de nomes de peso de Hollywood, como Gerard Butler que assume em Redenção o papel do ex-motoqueiro e traficante Sam Childers que se tornou um grande defensor das crianças do Sudão, inocentes obrigados a virarem soldados e cometerem atrocidades muito tempo antes de se tornarem homens. Conhecido como “pastor da metralhadora”, ele não pensa duas vezes antes de empunhar uma arma para defender seus ideais. O grande problema desta obra é não apresentar de forma convincente a mudança de perfil do protagonista de bad boy à herói. Childers levava uma vida criminosa e sem regras na Pensilvânia e passou muitos anos na cadeia. Quando volta à liberdade, a vida regada a sexo, drogas e crimes volta a tentar-lhe, mas sua família está a postos para ajudá-lo a mudar os rumos de seu futuro. Sua esposa Lynn (Michelle Monaghan), uma ex-dançarina de boates, o apresenta à religião e ele aceita se converter, decide levar uma vida longe de atos ilegais, consegue um trabalho honesto e até vende sua moto envenenada, tudo para ter mais qualidade e vida e viver em paz com a mulher e a filha, a jovem Paige (Madeline Carroll). Influenciado por um missionário, este novo homem acaba indo à África, mais precisamente em Uganda, como voluntário e sofre um violento choque de realidade que mexe completamente com sua vida. Ao se deparar com a brutalidade que impera na região do Sudão através dos atos cruéis de milícias que maltratam e exterminam a população, incluindo soldados obrigando uma criança a matar a própria mãe, ele passa a se dedicar à causa das crianças órfãs africanas, mas acaba por negligenciar sua própria família que fica esquecida no interior dos EUA. Em determinado momento, até o próprio “santo justiceiro” afasta-se de Deus e coloca seus ideais e objetivos em primeiro lugar.

De endiabrado à santo, realmente tal mudança pode ocorrer assim como aconteceu na vida do Sam Childers verdadeiro que ao longo de mais de três décadas tornou-se um legítimo homem da caridade, mas a maneira como essa transformação acontece no filme é um tanto abrupta, sem nuances. É bem verdade que o personagem da vida real também não se tornou um anjo de candura e seus atos, apesar de bem intencionados, recebem muitas críticas. Muitos enxergam nesse homem um mercenário que usa da violência para combater a violência, assim alimentando possíveis novos conflitos. Essa ambiguidade do protagonista poderia ser um prato cheio para um roteirista experiente, mas o escritor Jason Keller ainda tinha pouca experiência na área, tendo roteirizado antes deste projeto apenas um telefilme. A narrativa começa de uma forma desagradável, mas necessária para compreender o universo torpe no qual o protagonista está imerso. Logo que sai da prisão ele já “mata as saudades” da esposa no carro, depois reclama que ela parou de se apresentar em boates para servir à religião, trata com desdenho a filha e a noite vai curtir uma noitada com direito a drogas injetáveis na companhia do amigo Donnie (Michael Shannon). No dia seguinte, ele olha sua cara de acabado no espelho como se nunca tivesse passado por um momento destes e num estalo repentino de consciência decide dar outro rumo para sua vida. Essa pressa do roteiro em apresentar a transformação do rebelde é um pouquinho incômoda. Não há tempo para reflexões e cada passo seu é dado quase que de forma instantânea, sem pensar na possibilidade de arrependimento. Quando já está na África chega a dizer a um membro da política que falar de paz dentro de uma sala é perda de tempo. Seu lema é o calor do momento é que dita a ação, refletir não leva a lugar algum. Ficamos na dúvida se o verdadeiro Childers age exatamente dessa maneira, mas os problemas na construção desta figura curiosa no filme poderiam ter sido contornados com um pouco mais de empenho do diretor Marc Forster. Para quem está por dentro da História recente do cinema, ele é o cara que chocou o mundo com a acidez de A Última Ceia, tocou corações com Em Busca da Terra do Nunca e gerou polêmica com a adaptação de O Caçador de Pipas. Até no mundo do agente 007 ele já passeou com sua câmera, dessa forma ele teria experiência suficiente para conduzir uma história verídica e excêntrica que mescla momentos chocantes e outros de pura emoção. Todavia, o cineasta preferiu dar mais atenção ao período anterior à conversão evidenciando a mensagem de que todos podem buscar a salvação, basta ter força de vontade. O problema é que Childers passa a levar a sério demais a sua fama de guerrilheiro da paz e sem perceber começa a agir de forma tirânica assim como os ditadores africanos que ele combatia. Pior ainda, sua obsessão pela justiça acaba o levando à beira da loucura, chegando ao ponto de ele prejudicar sua própria família de forma material e também emocional.

Apesar das primeiras cenas poderem chocar pelo modo realista que retrata o cotidiano de um desvirtuado, o público deve estar preparado para as cenas do último ato do longa, momento em que Childers está atuando ativamente no Sudão. São várias as sequências de conflitos rodadas com extremo realismo que não só deixam a crueldade reinante explícita, mas também a própria confusão de sentimentos deste homem da fé que de salvador da pátria gradualmente se transforma em um tirano, algo agravado por sua visão simplista das coisas como a sua própria adesão à religião. Como ele próprio diz, tudo que você precisa é abrir a porta e deixar Jesus entrar, mas onde fica a reflexão sobre o que a religiosidade significa em sua vida? Talvez ela seja usada como um escudo, uma justificativa para seus atos que dividem opiniões, tanto que o filme não fez sucesso em território americano e chegou a receber críticas de organizações religiosas acusando a indevida associação da fé à guerra. Nos créditos finais ficamos conhecendo o Childers da vida real com um discurso que reforça a maneira simplista como ele enxerga as coisas. Ele instiga o espectador a refletir, por exemplo, sobre a suposição de seu filho desaparecer. Se ele o trouxesse volta, importaria quais os meios que ele usou para conseguir esse ato de bondade? A emoção desse momento só abre espaço para agradecimentos, não questionamentos. É dessa forma que há anos ele justifica seus atos violentos para conseguir fazer o bem. Como o pastor na época das filmagens continuava seu trabalho de caridade no Sudão, o filme não tem uma conclusão arrebatadora, pelo contrário, termina de forma fria e deixando para o espectador a função de julgar tanto o personagem real quanto o próprio filme que o homenageia. No conjunto, Redenção é uma produção mediana que tenta colocar em pauta como a religião pode mudar uma pessoa e neste caso mostrando que o encontro com a fé não é totalmente sublime. Childers encontrou a motivação para seguir um caminho mais digno, mas ainda assim não se transformou totalmente em um cordeirinho, guardando assim ainda alguns resquícios de sua antiga vida bandida. O título nacional até que se encaixa na proposta do longa, mas é uma escolha muito genérica. O original, que pode ser traduzido como “o pastor da metralhadora”, se encaixaria melhor com o enredo, mas ainda assim não seria muito comercial, parecendo mais um nome digno de filmes de brucutus. Bem, Childers não deixa de parecer algumas vezes um Rambo um tantinho racional. A tradução literal do título até faria sentido.

Drama - 128 min - 2011 

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