NOTA 7,5 Longa mostra como uma má companhia pode mudar a drasticamente uma vida, ainda mais na adolescência |
A adolescência é um período da vida no qual qualquer ser
humano está cheio de dúvidas e anseios e encontrar o equilíbrio entre o
resquício da inocência da infância e a maturidade forçada por uma sociedade
cada vez mais irracional é quase impossível. Aos olhos dos pais e protegidos
dentro de seu lar, em geral, os filhos são vistos de forma positiva, a criança
que cresceu bem educada e feliz, até porque a maioria já sabe usar muito bem os
truques de personalidade para persuadir. Porém, quando estão fora de casa as
regras são outras e os jovens gradativamente são levados a seguir caminhos
torpes e como estão na idade de se auto-afirmarem como pessoas fazer parte de
um grupo bacana na escola ou no bairro torna-se uma necessidade primordial. Ser
você mesmo é descartável, o importante é parecer com a turma que escolheu fazer
parte, o que implica certamente em mudanças de visual e de comportamento
chegando inclusive a atos de extrema crueldade contra semelhantes ou a si
próprios. De anjinho da mamãe à garota pervertida e problemática, a
protagonista de Aos Treze mostra de forma realista e econômica o processo
desta transformação, embora o roteiro seja baseado em episódios clichês já
vistos em outras produções que lidam com temas parecidos. Tracey Freeland
(Rachel Evan Wood) é uma adolescente aparentemente exemplar. Aos treze anos ela
é excelente aluna, boa filha e ainda mantém ativo um irresistível jeitinho de
criança, porém, ela já está se sentindo mal por ser esnobada na escola pelas
garotas mais populares, aquelas que estão sempre na moda e chamam a atenção dos
meninos. A chance de mudar esse quadro surge quando ela consegue se aproximar
de Evie Zamora (Nikki Reed), o modelo de garota ideal que ela gostaria de seguir,
mas o problema é que essa nova amizade não é uma boa companhia e assim Tracey
acaba sendo pouco a pouco persuadida a se envolver com drogas, experimentar
prazeres sexuais e até cometer pequenos crimes. As coisas complicam quando tais
atos deixam de ser curiosidade e se tornam rotineiros desencadeando uma série
de desentendimentos entre Tracey e sua mãe Melanie (Holly Hunter), ainda mais
quando Evie tem a ideia de tentar morar na casa da nova amiga, claramente se
aproveitando da relação em frangalhos que a jovem mantém com seus familiares.
Ricos e pobres estão sujeitos a essas más influências, pois
todos sabem que a falta de dinheiro ou sua abundância causam transtornos, mas
historicamente filhos de famílias problemáticas são as principais vítimas de
amizades duvidosas, não que isso não tenha a ver com grana. Bobagens como não
ter posses para comprar uma roupa bacana para ir a uma festa ou o papai que
compensa seu distanciamento oferecendo dinheiro para o filho comprar o que
quiser no shopping podem tornar-se grandes problemas a curto ou a longo prazo.
Com pais separados, falecidos, ausentes ou que vivem juntos apenas por
conveniência, é comum que o adolescente insatisfeito busque apoio nas amizades
e quem lhe estende a mão primeiro certamente ganha sua inteira confiança,
tornando-se basicamente um jogo de dominação onde o mais forte geralmente não
tem coisas boas a oferecer e se aproveita da fragilidade do outro. É justamente
nas questões da família fragmentada e da possível vítima das circunstâncias que
se apoia o trabalho de estreia da diretora Catherine Hardwicke. A mãe de Tracy
é amorosa e não deixa faltar nada para a filha, mas talvez o fato de ser
separada e estar namorando um homem que não é um exemplo de ser humano de
sucesso provoquem na garota uma revolta que talvez só ela compreenda e sua
maneira de extravasar sua raiva é através de atos impensados como colocar um
piercing na língua ou trocar beijos com outra menina, tudo para chamar a
atenção. Ela busca o choque para atingir a mãe deixando-se levar pelas ideias
ousadas e bizarras de Evie que aparentemente não tem quem a repreenda. Aliás,
se o longa apresenta muito bem a aproximação e o desenrolar da amizade das duas
adolescentes, por outro lado deixa a desejar por não mostrar ao espectador como
era a vida de cada uma antes desse encontro, ou melhor, da Tracy até
acompanhamos algumas coisas, mas não o suficiente para tornar mais impactantes
as cenas que marcam sua mudança comportamental. Algumas pessoas apontam que as
situações apresentadas no longa não são totalmente críveis e não chocam como
deveriam. Bem, é obvio que outros filmes deste tipo do passado foram bem mais
além, até ultrapassaram limites em alguns casos, mas é admirável as escolhas
que Catherine fez. Não é preciso nudez e escatologia para causar impacto. Um
texto forte já é o bastante para dar o recado, ainda mais com um elenco afiado
para defendê-lo.
O roteiro foi escrito pela própria diretora em parceria com
Nikki Reed que colaborou muito trazendo experiências que ela própria vivenciou.
Seus pais se divorciaram quando ela ainda era muito pequena e a atriz foi
criada pela mãe. Até os doze anos ela era uma garota meiga e comportada, mas
depois se tornou rebelde e refém de problemas emocionais que trataram de
afastá-la da mãe e aproximá-la dos vícios e do sexo. Após a fase conturbada,
Nikki aos quatorze anos conseguiu sua emancipação e transformou as lembranças
de seu passado recente em um roteiro cinematográfico. Curiosamente, ao ser
escalada para o elenco a atriz e escritora acabou ficando com um papel oposto
ao que viveu na vida real. Rachel e Nikki estão perfeitas em seus papéis. Mesmo
já tendo passado dos treze anos de idade na época das filmagens elas
incorporaram com perfeição as adolescentes problemas e a relação delas tende a
certa altura parecer tão natural que nem nos importamos em ver duas jovens
trocando carícias e provocações no ápice da loucura. Também não há como negar
que boa parte da força do longa se deve ao talento da jovem veterana Holly
Hunter que alterna o perfil da mãe carinhosa e compreensível com o da mãe
rígida que busca talvez tardiamente descobrir onde errou na criação da filha
acompanhando a degradação da mesma. Na balança do amor e do ódio, a relação
delas pende para o lado negativo da situação sendo que a solução para o
conflito aparentemente seria o afastamento de Evie que não perderá a chance de
trair a amiga quando se sentir pressionada, afinal não existe um laço concreto
de amizade ou pelo menos por parte de uma delas. As cenas finais com diálogos
intensos e apresentadas quase em preto e branco reforçam o aspecto documental
do longa que opta pela aparência realista através de ângulo ousados ou tremidos
de câmera para se destacar do visual limpo das produções hollywoodianas e ainda
flertar com a estética do cinema alternativo. Podem dizer que é uma produção
fraca, mas quando chegamos ao final de Aos Treze percebemos seus
reais objetivos: não apresentar respostas mastigadinhas para ajudar quem passa
por situações semelhantes, mas sim servir como um ponto de apoio para o diálogo
entre pais e filhos, estudantes e educadores para prevenir ou tentar remediar
problemas. Uma conclusão muito clichê essa? Pode ser, mas infelizmente ainda
necessária para uma sociedade metida a moderninha, mas cujos integrantes ainda
mal sabem dialogar e pensar por conta própria.
Drama - 100 min - 2003
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