NOTA 8,0 Longa acompanha trajetória de um jovem indiano para se adaptar ao cotidiano americano sem abrir mão da família e suas tradições |
A
trama começa apresentando Ashoke Ganguli (Irfan Khan) e Ashima (Tabu), dois
jovens indianos que têm seu casamento arranjado seguindo as tradições de seu
povo. Eles saem de Calcutá rumo a Nova York onde tem a oportunidade de se
conhecerem melhor e iniciar literalmente uma nova vida. O início é difícil para
a moça, pois não é nada fácil se acostumar com um ambiente novo e que parece
não seguir regras, mas o marido a ajuda na adaptação já que parece mais
confortável e acostumado ao ritmo de vida dos ianques. Não demora muito e eles
têm um filho, Nikolai Gogol (Kal Penn), nome dado ao garoto em homenagem a um
famoso escritor russo, porém, cuja vida pessoal não era nada admirável. O
menino cresce dividido entre duas culturas distintas e passa a rejeitar seu
nome e sua própria identidade, tendo que lidar com as tradições de sua família
e as novidades e dificuldades que o ambiente americano poderia lhe trazer. Sua
infância na escola não foi das mais fáceis, sua adolescência foi marcada por
rebeldia, mas prestes a se tornar um adulto Gogol toma importantes decisões que
podem afastá-lo cada vez mais das suas origens. Planejando estudar arquitetura
e namorando Maxine Ratliff (Jacinda Barrett), o jovem está cada vez mais inserido
na cultura americana e até assume um novo nome, Nikhil, porém a convivência com
Moushumi (Zuleikha Robinson) pode significar para Gogol o ponto de equilíbrio
entre a tradição e a modernidade. É interessante observar que toda essa
odisséia familiar tem início não por imposição, mas por opção. Antes de se
casar Ashoke já vivia a alguns anos nos EUA e sua pretendente parece se
deslumbrar pela aura sofisticada arraigada à cultura norte-americana, visto que
a primeira coisa que nota no noivo são os seus sapatos que trazem grafados a
origem dos calçados. Contudo, o sonho não é tão belo quanto imaginava. Quando
tem seu primeiro filho Ashima passa por um período de crise já prevendo como
seria difícil criá-lo em um país onde eles são vistos como estranhos e seus
valores parecem não fazer sentido. Todavia, Mira muda um pouco o enfoque de seu
trabalho a partir do nascimento de Gogol. Os objetivos originais de falar sobre
identidades sejam elas pessoais, familiares ou culturais ainda estão em pauta,
mas o fio condutor passa a ser o personagem que em sua fase jovem e adulta é
interpretado por Kal Penn, nome, ou melhor, rosto conhecido de algumas comédias
bobocas made in USA, mas que felizmente prova ter talento para ir mais longe. Desde
o início, o roteiro já fixa a idéia do embate de culturas na vida do rapaz. O
espectador fica sabendo na introdução a razão de o protagonista ter dois nomes,
um arranjado de última hora para atender as exigências da burocracia americana
e outro que seria o de batismo hindu, mas que deve ser escolhido pelo
integrante mais velho da família. Algumas crianças ficam anos sem um nome
definitivo para seguir as tradições. Quando adulto, Gogol assusta sua família
ao namorar uma americana e ele próprio compreende com o tempo que o romance não
teria futuro por causa das diferenças culturais e acaba encontrando a mulher
ideal na pele de uma moça de origem indiana, mas também adepta ao estilo de
vida livre e pouco chegada às tradições.
Nome
de Família poderia ter seu enredo
simplificado a ideia de uma variação do tema do jovem em busca de uma
identidade própria, seu lugar no mundo, mas o longa vai além, jamais deixando
as pessoas que o cercam como meros figurantes. Apesar de Gogol ser o centro das
atenções do enredo, é perceptível que todos os personagens com quem ele
interage têm sua importância para definir a imagem e o caráter do protagonista,
além de que as ações do mesmo podem influenciar negativa ou positivamente na
vida de seus familiares, amigos ou até mesmo de desconhecidos com quem possa
ter trocado apenas algumas palavras ou gestos. Esta obra tem o mérito de
resgatar a ideia de que não podemos abrir mãos de valores e tradições do
passado para abraçar as novidades do presente e do futuro, pois cada momento de
nossas vidas tem ou terá alguma importância na construção dos seres humanos que
éramos ontem, dos que somos hoje e dos que seremos amanhã. É como um sábio diz
no filme, em outras palavras, que você pode abraçar o que é novo, desde que não
se esqueça do velho, ou seja, um pensamento claramente em declínio atualmente,
mas que deveria voltar a ativa. As desventuras da família Ganguli para se
adaptar ao intercâmbio cultural e até mesmo os seus conflitos internos,
exclusivamente familiares, são questões universais. Dessa forma os personagens
podem ser vistos de forma alegórica, representando não apenas os indianos, mas
qualquer outro povo que não sofre apenas para manter sua essência. Pressionados
pela rapidez, ambição e falta de sentimentos e regras tão comuns a Era
contemporânea, quantas pessoas já não se anularam para assumir identidades
falsas simplesmente para serem aceitas pela sociedade ou grupos que almejavam
ser inseridos? Talvez pelo conservadorismo adotado pela cineasta para concluir
sua trama o longa tenha feito sucesso apenas em nichos de público específicos.
Em tempos em que tanta gente abre mão de suas próprias personalidades para se
deixarem moldar ao sabor dos modismos, o discurso de Mira pode parecer
ultrapassado, mas ainda necessário para ao menos provar aos que compactuam das
mesmas ideias que ela que eles não são como peixes fora d’água. E assim a
humanidade continua caminhando equilibrando-se entre a tradição e a
modernidade. Este drama vale uma conferida com tempo reservado para uma
reflexão posteriormente.
Drama - 122 min - 2006
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