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segunda-feira, 6 de abril de 2015

NOME DE FAMÍLIA

NOTA 8,0

Longa acompanha trajetória de
um jovem indiano para se adaptar
ao cotidiano americano sem abrir
mão da família e suas tradições 
As diferenças culturais que envolvem a adaptação de estrangeiros ao cotidiano agitado e aparentemente desregrado dos EUA, considerado a terra das oportunidades, são fontes inesgotáveis de inspiração para o cinema. O interesse pela exótica Índia também cresceu consideravelmente em todo o mundo. Nada melhor, portanto, que unir em um mesmo projeto as oportunidades e o modernismo inerente do solo americano e as crenças e tradições próprias da cultura indiana. Para tanto, a experiência de vida da cineasta Mira Nair foi fundamental para a realização de Nome de Família. Nascida e criada em meio aos costumes dos povos desse fascinante país, ela ficou conhecida quando lançou Um Casamento à Indiana, onde apresentou um pouco sobre a cultura de sua terra e com o qual ganhou o Leão de Ouro em Veneza. Em seu terceiro projeto de grande expressividade, o outro foi a produção americana Feira das Vaidades, a diretora procurou mais uma vez revelar as crenças e o cotidiano da Índia, mas desta vez optou por acrescentar alguns elementos pertinentes ao mundo ocidental. Baseado no livro “O Xará”, da escritora inglesa Jhumpa Lahiri, esta é uma história sobre amor, valores, tradições e lealdade tendo como fio condutor a adaptação de um jovem indiano à vida fora de seu país, uma experiência que traz reflexos diretos a toda a sua família que tenta conviver com as novidades dos avanços da humanidade, mas sem perder suas raízes. Por ter intimidade com o tema, Mira realizou uma obra objetiva, bem construída e livre de deslumbramentos perante a uma cultura que praticamente é desconhecida por grande parte do público. Pensar nos americanos com anseio e receios quanto a presença de indianos em suas terras é fácil, mas poucas vezes paramos para pensar que a situação inversa também amedronta. O filme tem início nos anos 70, mas a narrativa escrita por Sooni Taraporevala acompanha a trajetória de uma família por três décadas até os dias atuais (lembrando que o filme é de 2006). Dessa forma, além de falar sobre xenofobia, dificuldades, transgressões e preservação da essência, o longa também consegue inserir alguns contextos políticos à trama enquanto configura um interessante painel de personagens que evoluem enfrentando um eterno confronto entre a manutenção das raízes e a aceitação da modernidade com seus prós e contras.

A trama começa apresentando Ashoke Ganguli (Irfan Khan) e Ashima (Tabu), dois jovens indianos que têm seu casamento arranjado seguindo as tradições de seu povo. Eles saem de Calcutá rumo a Nova York onde tem a oportunidade de se conhecerem melhor e iniciar literalmente uma nova vida. O início é difícil para a moça, pois não é nada fácil se acostumar com um ambiente novo e que parece não seguir regras, mas o marido a ajuda na adaptação já que parece mais confortável e acostumado ao ritmo de vida dos ianques. Não demora muito e eles têm um filho, Nikolai Gogol (Kal Penn), nome dado ao garoto em homenagem a um famoso escritor russo, porém, cuja vida pessoal não era nada admirável. O menino cresce dividido entre duas culturas distintas e passa a rejeitar seu nome e sua própria identidade, tendo que lidar com as tradições de sua família e as novidades e dificuldades que o ambiente americano poderia lhe trazer. Sua infância na escola não foi das mais fáceis, sua adolescência foi marcada por rebeldia, mas prestes a se tornar um adulto Gogol toma importantes decisões que podem afastá-lo cada vez mais das suas origens. Planejando estudar arquitetura e namorando Maxine Ratliff (Jacinda Barrett), o jovem está cada vez mais inserido na cultura americana e até assume um novo nome, Nikhil, porém a convivência com Moushumi (Zuleikha Robinson) pode significar para Gogol o ponto de equilíbrio entre a tradição e a modernidade.  É interessante observar que toda essa odisséia familiar tem início não por imposição, mas por opção. Antes de se casar Ashoke já vivia a alguns anos nos EUA e sua pretendente parece se deslumbrar pela aura sofisticada arraigada à cultura norte-americana, visto que a primeira coisa que nota no noivo são os seus sapatos que trazem grafados a origem dos calçados. Contudo, o sonho não é tão belo quanto imaginava. Quando tem seu primeiro filho Ashima passa por um período de crise já prevendo como seria difícil criá-lo em um país onde eles são vistos como estranhos e seus valores parecem não fazer sentido. Todavia, Mira muda um pouco o enfoque de seu trabalho a partir do nascimento de Gogol. Os objetivos originais de falar sobre identidades sejam elas pessoais, familiares ou culturais ainda estão em pauta, mas o fio condutor passa a ser o personagem que em sua fase jovem e adulta é interpretado por Kal Penn, nome, ou melhor, rosto conhecido de algumas comédias bobocas made in USA, mas que felizmente prova ter talento para ir mais longe. Desde o início, o roteiro já fixa a idéia do embate de culturas na vida do rapaz. O espectador fica sabendo na introdução a razão de o protagonista ter dois nomes, um arranjado de última hora para atender as exigências da burocracia americana e outro que seria o de batismo hindu, mas que deve ser escolhido pelo integrante mais velho da família. Algumas crianças ficam anos sem um nome definitivo para seguir as tradições. Quando adulto, Gogol assusta sua família ao namorar uma americana e ele próprio compreende com o tempo que o romance não teria futuro por causa das diferenças culturais e acaba encontrando a mulher ideal na pele de uma moça de origem indiana, mas também adepta ao estilo de vida livre e pouco chegada às tradições.

Nome de Família poderia ter seu enredo simplificado a ideia de uma variação do tema do jovem em busca de uma identidade própria, seu lugar no mundo, mas o longa vai além, jamais deixando as pessoas que o cercam como meros figurantes. Apesar de Gogol ser o centro das atenções do enredo, é perceptível que todos os personagens com quem ele interage têm sua importância para definir a imagem e o caráter do protagonista, além de que as ações do mesmo podem influenciar negativa ou positivamente na vida de seus familiares, amigos ou até mesmo de desconhecidos com quem possa ter trocado apenas algumas palavras ou gestos. Esta obra tem o mérito de resgatar a ideia de que não podemos abrir mãos de valores e tradições do passado para abraçar as novidades do presente e do futuro, pois cada momento de nossas vidas tem ou terá alguma importância na construção dos seres humanos que éramos ontem, dos que somos hoje e dos que seremos amanhã. É como um sábio diz no filme, em outras palavras, que você pode abraçar o que é novo, desde que não se esqueça do velho, ou seja, um pensamento claramente em declínio atualmente, mas que deveria voltar a ativa. As desventuras da família Ganguli para se adaptar ao intercâmbio cultural e até mesmo os seus conflitos internos, exclusivamente familiares, são questões universais. Dessa forma os personagens podem ser vistos de forma alegórica, representando não apenas os indianos, mas qualquer outro povo que não sofre apenas para manter sua essência. Pressionados pela rapidez, ambição e falta de sentimentos e regras tão comuns a Era contemporânea, quantas pessoas já não se anularam para assumir identidades falsas simplesmente para serem aceitas pela sociedade ou grupos que almejavam ser inseridos? Talvez pelo conservadorismo adotado pela cineasta para concluir sua trama o longa tenha feito sucesso apenas em nichos de público específicos. Em tempos em que tanta gente abre mão de suas próprias personalidades para se deixarem moldar ao sabor dos modismos, o discurso de Mira pode parecer ultrapassado, mas ainda necessário para ao menos provar aos que compactuam das mesmas ideias que ela que eles não são como peixes fora d’água. E assim a humanidade continua caminhando equilibrando-se entre a tradição e a modernidade. Este drama vale uma conferida com tempo reservado para uma reflexão posteriormente.

Drama - 122 min - 2006 

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