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quarta-feira, 8 de abril de 2015

O SOL DE CADA MANHÃ

NOTA 7,0

Em meio ao seu inferno
profissional, Nicolas Cage
consegue acertar ironicamente
interpretando um fracassado
No Brasil estamos acostumados a acompanhar a previsão do tempo nos telejornais sendo apresentadas por mulheres bonitas e com um sorriso estampado no rosto. Bem, esse já seria um ponto a ser estranhado em O Sol de Cada Manhã, afinal o protagonista é um homem que tem sucesso justamente nesta atividade. O segundo ponto contra seria o fato do intérprete deste cara ser Nicolas Cage que um dia já foi um nome quente em Hollywood, mas há tempos tem atuado em produções irregulares ou simplesmente obsoletas. Contudo vale a pena dar um voto de confiança ao ator. Este filme historicamente já faz parte do momento de crise profissional dele, porém, ao mesmo tempo significa um lampejo de salubridade em sua carreira. Acostumado a trabalhar em projetos de ação cheios de efeitos especiais e barulhos, Cage se entrega neste caso a um filme simplório e de certo modo intimista, uma proveitosa mistura de drama com doses de humor e crítica à cultura americana e que tem potencial para envolver as plateias que gostam de boas histórias que lidam com situações cotidianas. Cage dá vida à David Spritz, um apresentador da previsão do tempo em uma famosa emissora de TV de Chicago e que vive uma vida que é o sonho de qualquer pessoa. Ele é famoso, trabalha apenas duas horas por dia e recebe um salário altíssimo, o que lhe garante um excelente padrão de vida. Agora, ele está cotado para trabalhar em um programa de abrangência nacional, o que aumentaria seu prestígio e conta bancária. Sorte na vida profissional, azar na pessoal. Apesar do bom momento na carreira que atravessa, sua vida atrás das câmeras não poderia ser pior. Para Spritz ter uma vida totalmente feliz precisará acertar primeiro suas relações pessoais que estão em frangalhos. Ele é divorciado de Noreen (Hope Davis), seus filhos estão se distanciando dele e apresentando desvios de comportamento e ele ainda tenta desesperadamente conseguir uma palavra de aprovação de seu próprio pai, Robert (Michael Caine), um jornalista premiado que sempre o subestima. Os problemas de relacionamento com os filhos, a descoberta de que ainda ama a ex-mulher e a repentina revelação de uma grave doença do pai, todas estas descobertas trarão mudanças significativas para a vida de Spritz e momentos de tempestade emocional estão por vir. 

Flertando com o humor negro, o drama e a crítica ao estilo de vida dos sonhos vendido pelos americanos bem-sucedidos, o filme pode aparentemente passar a idéia de ser algo pesado, mas temos uma agradável surpresa ao nos depararmos com um projeto de certa forma leve e que acalenta o emocional do espectador. O roteiro se concentra nos altos e baixos da vida do protagonista, um profissional exemplar, mas um fracasso como chefe de família, porém, a interpretação de Cage demonstra literalmente que a esperança é a última que morre. Longe dos estereótipos de heróis que interpretou a exaustão, o ator interpreta um cidadão comum que apesar da imagem de sucesso tem que lidar com problemas banais do cotidiano como a obesidade e o vício em cigarros da filha pré-adolescente Shelly (Gemmenne de La Peña), os conflitos com o pai, o casamento que acabou por tolices, enfim situações desagradáveis que em sua maioria foram originadas por ele próprio, muito devido a seu desligamento do mundo, momentos de distração ou esquecimento que não o deixaram enxergar a sua realidade tal qual ela era. Talvez justamente por no trabalho só precisar decorar certas coisas, apresentar e ir embora, Spritz demonstra total incapacidade em lidar com as pequenas coisas do dia-a-dia, como se esperasse que alguém fizesse aquilo para ele, desde uma simples compra no mercado até lidar com o envolvimento involuntário do filho Mike (Nicholas Hoult) com um terapeuta pedófilo. Aliás, as tramas paralelas colaboram e muito para o envolvimento do espectador, isso porque são totalmente críveis e conduzidas por um elenco afiado. Todavia, o excesso de problemas na vida do protagonista pode se tornar um empecilho para alguns penetrarem em seu universo, embora seja comum que uma desgraça sempre venha acompanhada de outra. De qualquer forma, são passagens verossímeis que são adicionadas sem a intenção de comover gratuitamente o público. Ainda bem. Com um enredo embriagado de melancolia e intimismo é até difícil de acreditar que este projeto leva a assinatura do cineasta Gore Verbinski que na época colhia os louros do primeiro capítulo da saga Piratas do Caribe e já pensava nas duas novas sequências desta aventura fantasiosa. Para descansar um pouco ele resolveu navegar por águas dramáticas e se deu bem. Além de provar que tem talento para filmar obras mais realistas sem cair em clichês, ele ainda conseguiu dar um gás para a carreira de Cage, inclusive introduzindo um recurso interessante em sua obra: a narração em off do próprio protagonista para melhor situar o espectador e acentuar o tom cômico ou crítico das cenas.

A estrutura narrativa adotada foge totalmente ao esquema sentimentalista de Hollywood, apesar de ser uma produção americana, e nos leva a uma jornada profunda e crescente de desastres na vida do protagonista, mas em nenhum momento ele abre espaço para o choro fácil e sempre mantém a cabeça erguida para tentar consertar sua rotina familiar e até mesmo em seu trabalho, já que ele é apenas um apresentador e não um meteorologista, o que o leva a se tornar alvo de constantes ataques do público na rua devido as suas previsões do tempo furadas. Impossível não rir em cenas como as que Spritz fica com cara de bobo no meio da rua ouvindo piadinhas e recebendo alimentos arremessados por populares arruaceiros. Graças a momentos como estes é que o longa se torna uma opção interessante. Ao mesmo tempo em que o roteiro de Steven Conrad é ácido, também há espaços generosos para momentos levemente cômicos, o que deixa a obra mais descompromissada e palatável para os espectadores. Talvez o entrecho mais puxado para o drama seja o desenvolvido na relação de Spritz com Robert. Apesar do distanciamento, o homem do tempo terá o apoio do pai para norteá-lo durante a fase da sua vida em que ele tentará reparar os erros do passado. Caine, apesar da frieza de seu personagem, mais uma vez constrói um coadjuvante que está a um passo de se tornar o personagem principal. Subestimado pelo público e até mesmo pela crítica que não deu muita bola, O Sol de Cada Manhã é um filme no fundo edificante e que nos leva a refletir a respeito das escolhas que fazemos para nossas vidas, opções que podem se refletir de forma positiva ou negativa mais cedo ou mais tarde. Traçando um paralelo com a realidade do protagonista, planejar o dia de amanhã é tão difícil quanto prever como estará o tempo, afinal ambos são surpreendentes e difíceis de dominar. Ainda bem que sempre após a tempestade vem a bonança. 

Drama - 102 min - 2005 

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2 comentários:

  1. Nicolas Cage nunca me convenceu....

    Gostei apenas de sua atuação em Despedida em Las Vegas. No resto acho ele um ator mediano que teve sucesso e que agora.....colhe os louros da derrota.

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  2. Gostei da resenha. bom blog. estou seguindo.
    climadefavela.blogspot.com

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