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terça-feira, 26 de maio de 2015

IRMA VAP - O RETORNO

NOTA 1,5

Marco Nanini vestido de
mulher e cantando um hit
nacional da década de 1960 é a
única coisa que se salva
O cinema consegue abrigar as mais variadas formas de manifestações culturais e o teatro obviamente é uma fonte inesgotável de inspiração. Textos clássicos teatrais são comumente adaptados pelos americanos e europeus, alguns já foram filmados mais de uma ou duas vezes, e mesmo que na maioria das vezes o retorno do público e crítica seja mínimo a tendência continua. No Brasil, os sucessos mais contemporâneos dos nossos palcos tornam-se alvo fácil de diretores e produtores em busca de projetos que já carreguem consigo uma certa popularidade, o que poderia render ótimas bilheterias quando passados para película. A Partilha e Divã são alguns dos sucessos que fizeram o trajeto dos palcos para as telonas com certa facilidade, mas outros como Polaróides Urbanas e Tempos de Paz passaram longe de serem bem recebidos quando transformados em filmes. Entre os fracassos deste modelo de produção chama a atenção Irma Vap – O Retorno, um verdadeiro fenômeno teatral que ficou em cartaz aproximadamente onze anos, mas sua versão de cinema talvez não tenha conseguido ficar três semanas ocupando alguma sala de exibição sem dividir espaço com algum outro título tamanha rejeição do público. O título já deixa explícito o desejo de se repetir através de um veículo de comunicação de massa a excelente repercussão dos palcos, mas desde o início o projeto já demonstrava sinais de que não tinha tanto potencial assim. O longa é uma comédia sobre uma fictícia nova montagem do texto escrito pelo americano Charles Ludlam. Otávio Augusto (Marcos Caruso), um dos produtores da montagem original da peça, se alia a Luiz Alberto (Leandro Hassum), filho de um falecido produtor, para realizarem uma nova montagem do espetáculo, mas para tanto precisam convencer Tony Albuquerque (Marco Nanini), um dos protagonistas e detentor dos direitos autorais, a permitir que a idéia seja levada adiante. O ator parece não estar disposto a ver sua obra novamente sendo encenada, ainda mais porque ele não poderá participar devido a um acidente. Confinado em uma cadeira de rodas, ele vive recluso em sua casa e é manipulado pela irmã Cleide (Marco Nanini), uma ex-cantora mirim frustrada por não ter mais sucesso. Os dois produtores decidem então apelar para o outro artista do espetáculo, Darci Lopes (Ney Latorraca), um ator em decadência, para que ele assuma a direção da nova versão da peça com uma outra dupla de atores, Leonardo Aguiar(Tiago Fragoso) e Henrique D’Ávila (Fernando Caruso). Empolgada com a idéia e vendo a chance de se dar bem, Cleide passa a perna do irmão e consegue ceder os direitos do texto. Pronto! A peça já pode ser remontada, porém, até o dia da estréia muita coisa pode mudar.


A premissa e a idéia de ver um grande sucesso da nossa cultura ganhar finalmente um registro eterno são bastante interessantes, mas, como já dito, desde o início o projeto já mostrava sinais de problemas. Ney Latorraca e Marco Nanini protagonizaram a versão teatral e imediatamente após serem convidados aceitaram reencarnarem seus famosos personagens, principalmente porque iam voltar a atuar juntos após anos separados. Porém, a diretora da peça Marília Pêra foi destronada do posto, o que gerou críticas ácidas da atriz quando houve o lançamento do filme e parece que a praga pegou e o público não deu muita bola para este longa bem intencionado, porém, um tanto estranho para quem não viu a encenação ou nunca ouviu falar dela. O posto de direção foi entregue à Carla Camurati que teve um grande golpe de sorte quando estreou na função com o pé direito com Carlota Joaquina - A Princeza do Brasil, pois seus projetos seguintes não vingaram. Além de demorar anos para lançar algo novo e engolir fracassos de público, a diretora parece ser mais uma vítima do mesmo mal que atinge grande parte dos cineastas brasileiros: o espírito de superioridade, como se suas obras fossem revolucionárias, imprescindíveis para a cinematografia nacional e cada novo título tem que ser obrigatoriamente um marco. Muitos filmes ficam anos sendo preparados, são lançados cheios de pompa e elogios, mas nas bilheterias naufragam. Após filmar uma ópera e um longa protagonizado e destinado a agradar platéias idosas, Camurati tentou dar um tiro certeiro ao levar para as telonas um produto tarimbado dos palcos, mas é bom ficar claro que o roteiro do cinema não é o mesmo do espetáculo. Foi construída toda uma história cujo foco são os bastidores da encenação que pode não sair como prevista devido a personagem Cleide que faz questão de acompanhar cada minuto dos ensaios e se apaixona por Leonardo. Calcado em um humor puxado para o lado intelectual, incluindo o uso da metalinguagem, a diretora parece ter esquecido que travestiu sua obra de tom popularesco e que visava um público idem. O resultado: o que era para provocar gargalhadas acaba deixando o espectador com cara de interrogação. No máximo podemos dar um sorrisinho amarelo vendo Nanini vestido de menininha cantando um clássico musical brasileiro dos anos 60, “Banho de Lua”, isso se você não ficar ruborizado por achar a cena vergonhosa demais. De qualquer forma, é o ator travestido como mulher quem segura a atenção, até porque seu entrecho lembra ao clássico Hollywoodiano O Que Terá Acontecido a Baby Jane?, protagonizado por Bette Davis e Joan Crawford. Cleide acredita ser responsável pelo acidente que deixou seu irmão paralítico e sente a obrigação de cuidar dele, ainda que aos trancos e barrancos. Ao mesmo tempo ela tem que engolir o fato de ter feito sucesso apenas quando criança enquanto seu irmão se tornou um ator de renome.


Camurati, que também escreveu o roteiro em parceria com Melanie Dimantas e Adriana Falcão, nitidamente se enrolou em suas próprias pretensões. Entusiasta das manifestações culturais e de que cada vez elas se tornem parte do cotidiano dos populares, a cineasta esqueceu-se de imprimir humor à trama e deixou o amor e respeito pelo teatro falarem mais alto. Embora não seja longo, pouco menos de uma hora e meia de duração, o resultado é um tanto enfadonho, ainda que deixe no ar a impressão de que realmente o espetáculo teatral era ótimo e que merecia uma nova temporada para novas gerações. A peça chegou a ser citada no Guiness Book como a produção de teatro que permaneceu por mais tempo em cartaz contando com o mesmo elenco. Já o longa Irma Vap – O Retorno é digno de figurar nas listas dos piores filmes nacionais de todos os tempos. Ok, não precisa chegar a tanto, mas certamente as empresas que investiram dinheiro na produção (no início temos uma constrangedora, ainda que criativa, cena em que os patrocinadores são mencionados lembrando que só assim para existir produção cinematográfica nacional) se arrependeram. No conjunto, o filme é desinteressante, corrido, algumas vezes sem sentido ou anárquico demais. Se no teatro o dinamismo da dupla Nanini e Latorraca segurava a atenção da platéia com suas inúmeras trocas de figurinos para interpretarem diversos personagens, na versão em película nem tal magia existe, assim os atores fazem o que podem para não serem apedrejados e conseguem atuações no máximo regulares. Se existe algo de bom na existência deste trabalho é o fato de ele alertar que nem sempre um sucesso do teatro consegue repetir o mesmo êxito quando transformado em filme e vice-versa. Para alguns intelectuais a arte dos palcos é única e cada espetáculo é uma nova emoção. O cinema, apesar de todos os seus avanços, ainda não é capaz de transportar toda a magia e fascínio de uma encenação, ainda mais quando falamos em termos de Brasil. Em suma, Camurati se excedeu ao tentar impor um clima nostálgico e reverente a um marco cultural nacional e nada mais fez que jogar dinheiro fora em um trabalho fraquíssimo. Quem sabe da próxima vez ela acerte. Só resta saber quando ela sentirá vontade de novamente estar atrás das câmeras. 

Comédia - 84 min - 2006 

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2 comentários:

  1. Amo filme nacional. Porém, esse é sem dúvida um dos piores que vi nos últimos anos. Fraco, roteiro ruim, elenco sem desejo e inspiração.

    Uma tragédia, em minha opinião.

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  2. Filmes nacionais são feito na raça mesmo, não existem bilhões de dólares para efeitos especiais e o escambau, mas Irma Vap vale pelo cômico, é uma bela sessão da tarde com certeza...

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