NOTA 8,0 Embora previsível, drama conquista o espectador com trama de fácil identificação e atuações masculinas dignas |
O tempo passa e é incrível como a
busca pelo “sonho americano”, leia-se o desejo de vencer na vida na América,
mais precisamente em solo norte-americano, ainda é o desejo de milhares de
pessoas, mesmo com diversos exemplos frustrados de quem tentou, mas acabou encontrando
uma realidade bem diferente da que esperava. A imigração ilegal para os EUA é uma coisa muito comum e já foi tema de
diversos filmes e até mesmo de novela. Em Sob a Mesma Lua, co- produção
mexicana e norte-americana, o tema ganha mais uma vez espaço no campo
cinematográfico sem grandes inovações, mas com um texto contundente, com boas
passagens, narrativa envolvente e uma direção honesta e sensível da diretora
mexicana Patricia Riggen estreando com o pé direito na função e não negando
suas influências melodramáticas, neste caso agregando ao trabalho o capricho
visual e técnico típico de produções hollywoodianas. Sem medo de exagerar nas
doses de emoção e clichês, é óbvio que a obra desagrada a muitos, mas para
aqueles que gostam de histórias humanas a trama deve agradar em cheio. Podem
dizer que o longa propõe uma fuga da realidade ao adotar um tom de fábula, mas
não deixa de ser envolvente a perspectiva otimista da trama que exalta o amor
existente em uma relação saudável entre mãe e filho separados por força das
circunstâncias. Rosario (Kate del Castillo) é uma mãe solteira que vivia no
México, mas atravessou ilegalmente a fronteira para entrar nos EUA com o
objetivo de conseguir melhores oportunidades de trabalho e assim poder criar
com mais dignidade seu filho Carlitos (Adrian Alonso), mesmo que a distância.
Vivendo há cerca de quatro anos em Los Angeles onde trabalha como doméstica em
dois empregos, seu esforço compensa. Ela já pode mandar uma boa quantia de
dinheiro mensalmente ao filho que lhe garanta os direitos básicos e algumas
extravagâncias vez ou outra, como a compra do par de tênis que ele tanto
queria, mas agora ela quer poupar para pagar um advogado a fim de regularizar
sua cidadania no país e poder trazer Carlitos, a quem não vê há um bom tempo,
para morar com ela. O único contato que ela tem com o garoto durante estes anos
de ausência é através de um pontual telefonema todos os domingos as dez horas
da manhã. O horário é rigorosamente marcado já que a ligação é feita de um
telefone público para outro, mais um detalhe que evidencia a situação
paupérrima de vida destas pessoas visto que na época em que se passa a trama
(contemporânea às filmagens realizadas em 2007) o celular já não era mais um
artigo de luxo e com preços acessíveis aos populares. Realmente o supérfluo não
faz parte da vida destes personagens.
A introdução da trama se passa exatamente no dia em que Carlitos está
completando 9 anos de idade. Após o tradicional telefonema dominical da mãe,
acompanhamos a simplória festa que a avó do menino, Benita (Angelina Peláez),
fez para ele mesmo estando muito doente. Eis que para literalmente acabar com a
alegria da velha senhora e do próprio aniversariante chega o casal Josefina
(Catalina López) e Manuel (Gustavo Sánchez Parra) trazendo uma revelação
importante. O menino nunca soube o nome do seu pai, sequer sabia que tinha um,
mas de uma hora para a outra soube de sua existência e que o homem e a mulher
que até então conhecia como seus vizinhos na realidade eram seus tios paternos.
Se Benita já estava doente, ver o neto angustiado por saber que tem um pai
solto no mundo e uma mãe que talvez não voltará a ver agravam seu quadro de
saúde. Com a morte da avó, o garoto resolve partir sozinho em busca de sua mãe
sem pensar nos riscos que poderia correr. Para tanto, ele recorre aos irmãos
Martha (America Ferrera) e David (Jesse Garcia), dupla que atravessa imigrantes
ilegais, e assim inicia uma semana repleta de aventuras e apuros. Quando
Carlitos encontra em seu caminho Enrique (Eugenio Derbez), sua sorte pode
mudar. A princípio travando uma relação conturbada, o rapaz acaba se
sensibilizando com a história do menino e decide ajudá-lo a encontrar sua mãe,
mas sua vida também acabará em apuros devido a pessoas más que tentam se
aproveitar da ingenuidade de Carlitos, ainda que em alguns momentos ele deixe
transparecer uma maturidade acima da média para sua idade. Enquanto o filho
passa por dificuldades para chegar em solo americano, coincidentemente sua mãe
deseja voltar ao México, mas encontra problemas para se desvencilhar dos
empregos. Pegando o gancho da história de uma criança que fica sem ninguém e
resolve ir em busca da mãe que vive em território americano, temática de pouco
impacto criativo, mas com força emocional inquestionável, o roteiro de Ligiah
Villalobos se divide em duas tramas que vão sendo desenvolvidas paralelamente.
Apresenta as aventuras e perigos que esse garoto passa no transcorrer de uma
semana nessa viagem ao mesmo tempo em que acompanha o cotidiano da imigrante
ilegal que sonhava em se dar bem na terra das oportunidades, mas que acabou
sofrendo decepções e humilhações. A apresentação dos créditos iniciais já deixa
clara a dualidade da narrativa, mostrando o despertar e o início de um dia na
vida de mãe e filho, um jogo de edição que apresenta as ações dos personagens
simultaneamente, mas casa qual em um ambiente diferente, uma separação que se
revela não apenas física e territorial, mas também atinge níveis econômicos,
sociais e culturais.
Extremamente esquemático e
repleto de clichês, é fácil adivinhar o que irá acontecer a cada nova sequência
e o próprio roteiro trata de anunciar os próximos acontecimentos, ou melhor, os
próximos problemas, pois a viagem do garoto é marcada por percalços e perigos
do início ao fim. Apesar de alguns considerarem que a diretora subestima a
inteligência do espectador em diversos momentos, como a aproximação repentina
dos tios do garoto deixando claro que eles querem ganhar alguma coisa em troca
da guarda do sobrinho, o filme consegue prender a atenção, talvez justamente
por não surpreender, abusar de passagens manjadas, mas principalmente por
apresentar personagens extremamente humanos. A personagem de Kate del Castillo,
popular atriz de novelas mexicanas, trabalha corretamente, mas sua atuação
acaba sendo diminuída consideravelmente perante a espontaneidade e carisma de
Adrian Alonso. Reprovado em um primeiro momento quando fez o teste, a diretora
felizmente teve a sensibilidade necessária para ver que ele era perfeito para
viver o papel de um menino corajoso e com um objetivo sólido. Longe de parecer
uma criança querendo imitar um adulto, o ator mirim demonstra muita disciplina,
maturidade e desenvoltura diante das câmeras e Patricia o deixou livre para
poder improvisar em cena. Quem também surpreende é Eugênio Derbez, curiosamente
um comediante muito popular no México aqui se dedicando a um papel dramático.
Inicialmente Enrique ajudaria Carlito até o momento em que acharia o seu pai, mas
a diretora pediu que o roteiro fosse reescrito de forma que esse homem de
coração de pedra se tornasse um pai substituto. Assim o personagem
que era pequeno cresceu na trama, evoluindo como pessoa acompanhando os passos
da criança. Ele deixa sua sisudez de lado quando se identifica com a história
de Carlito e então passa a aflorar seu instinto paterno e solidário e de quebra
cativar o espectador. Terceira maior bilheteria do cinema mexicano nos EUA (na
época), Sob a Mesma Lua é um filme despretensioso feito
sob medida para agradar ao público e não aos críticos, estes que parecem só
aceitar produções estrangeiras quando elas são mirabolantes e cheias de
significados. Apesar da boa aceitação dos americanos, os mexicanos não gostaram
do final feliz dado a história, certamente por na realidade as coisas não serem
romanceadas e a busca pelo sonho americano terminar geralmente em frustração ou
coisa pior. Diga-se de passagem, o final não é feliz totalmente por causa do
personagem Enrique. Não convém dizer o que acontece, mas digamos que a diretora
faz um afago de um lado e um machucado de outro. Assim como na vida real,
finais felizes e tristes caminham paralelamente.
Drama - 106 min - 2007
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