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sexta-feira, 30 de julho de 2021

MATINEE - UMA SESSÃO MUITO LOUCA


Nota 7 Longa homenageia os filmes trashs e o espírito nostálgico da obra ajuda a cativar o público


Quem nunca se divertiu algum dia na vida com um filme trash, aqueles cuja produção é precária e as interpretações amadoras ou canastronas, que atire a primeira pedra. Obras do tipo, por mais que hoje possam ser criticadas, certamente marcaram a infância ou a adolescência de muitas gerações. Aparentemente tolos, é preciso ressaltar que trabalhos do tipo tiveram seu período de importância. Durante as décadas de 1950 e 1960, a população de todo o mundo respirava um pouco mais aliviada com o fim do pesadelo que foi a Segunda Guerra Mundial, embora alguns focos conflituosos ainda existiam em diversos países e a Guerra Fria já dava sinais de vida. Mesmo assim, a época parecia propícia para mudanças e assim muita coisa foi modificada no cotidiano de milhares de pessoas e os modismos americanos se espalharam por todos os cantos do mundo, incluindo o modelo de produções representantes de um cinema escapista que visava atender aos anseios de plateias que desejavam esquecer as tristezas e se divertir sem culpa alguma, afinal de contas não se sabia se no outro dia estaria vivo, o grande ensinamento deixado pela guerra. A divertida e nostálgica comédia Matinee – Uma Sessão Muito Louca resgata um pouco da essência desse período fazendo uso da metalinguagem.

A trama roteirizada por Charlie Haas se passa na cidade de Key West, localizada na Flórida, há poucos quilômetros de Cuba. O local está passando por um momento conturbado em 1962 com a crise dos mísseis instalados pela União Soviética na ilha, o medo toma conta da pacata região e todos os habitantes temem a possibilidade de um ataque nuclear. O jovem Gene Loomis (Simon Fenton) também está preocupado, pois seu pai é oficial da Marinha e foi convocado para atuar nas ações desenvolvidas pelo governo norte-americano para evitar uma nova guerra, mas isso não o impede de frequentar o cinema e se divertir com os filmes do produtor Lawrence Woolsey (John Goodman), famoso por seus filmes trashs. O adolescente está ansioso para a pré-estreia de "Mant, O Homem-Formiga", sobre um sujeito que durante a realização de um tratamento dentário é picado por uma formiga que foi exposta a radiação e acaba se transformando em uma criatura metade formiga e a outra parte humana.  O produtor, acompanhado da atriz Ruth Corday (Cathy Moriart), vai pessoalmente à Key West para cuidar dos preparativos do evento de lançamento e prepara uma série de truques especiais para acompanhar a sessão, como a aparição de alguém vestido como o monstro que intitula o filme fictício, tudo com a intenção de chamar a atenção do Sr. Spector (Jesse White), dono de uma grande rede de salas de exibição que poderia se interessar pelo filme e levá-lo para outras cidade e estados.


Gene, acompanhado do irmão mais novo Dennis (Jesse lee) e de seus amigos Stan (Omri Katz), Sherry (Kellie Martin) e Sandra (Lisa Jakub), assim como os demais espectadores, provavelmente não esperavam o que poderia vir a acontecer em uma inocente matine de cinema. Enquanto o conflito entre americanos e russos esquenta do lado de fora, dentro da sala de exibição o clima também pega fogo e a molecada vibra com o Homem-Formiga. E Woolsey se entusiasma vendo que finalmente conseguiu fazer sua plateia gritar e suar de medo quando mais nada parecia assustar no mundo do entretenimento perante as atrocidades que se via fora do escurinho do cinema na vida real. Talvez só não tivesse consciência de que tinha criado um legítimo exemplar de filme B. Subgênero que há décadas faz sucesso, os populares trash movies antigamente eram os responsáveis por lotar salas de exibição com adolescentes querendo se assustar, dar risadas ou simplesmente ter uma desculpa para namorar. Eram os tempos da liberação feminina e da rebeldia dos jovens e um programinha que para os adultos poderia ser considerado maldito para os adolescentes era um respiro, a maneira que encontravam para extravasar a ansiedade e matar curiosidades. Apesar de parecerem datadas, produções do tipo, protagonizadas por monstros nojentos, trazendo ao público situações bizarras ou com títulos e enredos engraçados que se levam a sério demais, continuam sendo produzidas, assim perpetuando a arte de fazer cinema com poucos recursos, simplesmente por amor ao ofício ou para fazer a alegria de uma plateia cativa.

Um dos pupilos de Steven Spielberg, o diretor Joe Dante, responsável por produtos marcantes da década de 1980 como Grito de Horror e Gremlins, sempre gostou da união de elementos de terror e de humor e usou todo seu repertório cultural do assunto para realizar esta comédia, uma divertida homenagem a cultura de massa oriunda da metade do século passado, sua matéria-prima predileta. O personagem de Goodman é inspirado em William Castle, famoso produtor e diretor de fitas trash do passado que também usava truques para promover suas criações, como campainhas embaixo das poltronas para soarem em momentos estratégicos ou até um esqueleto atravessando a sala de projeção para provocar a histeria do público. Porém, o produtor do filme de dentro do filme não é tão anárquico, é até muito comportado. Goodman deixa transparecer em suas falas e gestos a emoção de se fazer cinema e levar entretenimento a tantas pessoas, mas nada muito melancólico a ponto de estragar o clima de confusão que se instaura durante o lançamento do filme dentro do filme. Recheado de citações a sucessos fantasiosos, o próprio longa fictício é inspirado em A Mosca da Cabeça Branca, clássico trash, que por sua vez foi refilmado sob o título A Mosca que, apesar de lançar mão de efeitos especiais avançados, não reprimiu sua essência de assustar, divertir e até mesmo enojar. 


Com Matinee – Uma Sessão Muito Louca, Dante conseguiu captar com perfeição o clima e a expectativa gerada por uma simples ida ao cinema e proporcionar ao espectador uma agradável viagem no tempo que serve para conhecer uma importante vertente da História da sétima arte. Vale ressaltar também a estética com ares de produção antiga. Propositalmente algum recurso de envelhecimento de imagens pode ter sido utilizado durante as filmagens, mas é certo que o passar do anos agregou um irresistível apelo nostálgico à obra. Opção para curtir munido de pipoca e refrigerante para entrar no clima, em tempos que assistir filmes para muitos se tornou um ato solitário, frio, consumista e dependente da conexão com a internet, vale a pena olhar para o passado e quem sabe se entusiasmar novamente a frequentar as salas de exibição ou se sentar no sofá da sala com amigos e familiares em torno da TV, ambas situações que são um excelente exercício de sociabilidade e que caíram em desuso. Tem coisas que no passado eram muito melhores. Assistir filmes é uma delas.

Comédia - 98 min - 1993

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