Ficar
sozinho dentro de uma casa desconhecida a noite e sentindo-se ameaçado pela
presença de alguém que parece onipresente é um tema bastante comum no cinema e
com resultados variados, não raramente com boas ideias sendo desperdiçadas. É
justamente o que acontece no suspense Quando Um Estranho Chama no
qual acompanhamos o pesadelo vivido por Jill (Camilla Belle), uma jovem
estudante que como muitas outras ganha alguns trocados prestando serviços de
babá para famílias ricas. Certa noite ela aceita a tarefa de cuidar do casal de
filhos dos Mandraki, moradores de um luxuoso casarão de arquitetura moderna e
protegido por avançados equipamentos de segurança, mas obviamente localizado no
meio do nada e sem vizinhos por perto. O que poderia ser uma noitada tranquila,
na qual a jovem já estava preparada para usufruir de luxos e conforto enquanto
os pequenos dormiam, acaba virando pura tensão quando ela passa a receber
estranhas ligações de um desconhecido. Inicialmente, ela pensa se tratar de
trotes de amigos que naquele momento estavam em uma festa. Contudo, as coisas
tomam rumos preocupantes quando a pessoa do outro lado da linha começa a dar
indícios de que parece estar rondando a casa ou até mesmo estar dentro dela.
Daí para frente já sabemos o que esperar. Diversos sustos previsíveis e tomadas
construídas para dar a sensação do bandido estar observando a jovem, situação
que renderia um bom curta-metragem, mas frágil demais para segurar um longa,
embora a duração seja razoavelmente breve.
A trama
é baseada em uma lenda urbana popular nos EUA já filmada em 1979 com o mesmo
título (no Brasil, o lançamento em vídeo foi chamado de Mensageiro da
Morte) que gerou inclusive uma continuação feita para a TV anos
depois, Um Estranho à Minha Porta. Para a turma de gerações mais
novas, o longa pode parecer uma versão estendida ou reinventada do prólogo
de Pânico, dispensando a brincadeira do vilão em amedrontar a
vítima com um questionário sobre filmes de terror. Sendo o argumento de
conhecimento de todos, e mesmo para quem não viu o original a previsibilidade
do enredo trata de situar qualquer um rapidamente, o roteirista Jake Wade Wall
não perde muito tempo e logo parte para o que interessa. Em poucos minutos
conhecemos o suficiente sobre a protagonista para compadecermos de seu futuro perrengue.
O que o filme tem de mais interessante é sua cenografia que foge do tradicional
casarão antigo e com um passado macabro escondido entre suas paredes. Jill vai
passar a noite numa casa de construção moderna dotada de muitos cômodos e
paredes de vidro, o que justificaria a quase ausência de luz elétrica em seu
interior. O pouco que tem faz as vezes dos antigos candelabros de velas, assim
a mocinha não é só amedrontada pela voz sinistra do bandido, mas também pela
sensação dele estar observando todos os seus passos a poucos metros de
distância. O lado de fora também é bem trabalhado com névoa e vegetação
abundante, tudo para ampliar a incômoda sensação de isolamento e nem os sistemas
de alarmes mais avançados são capazes de vencer a capacidade de raciocínio
humana.
Quando
um criminoso quer agir ele encontra meios inimagináveis e ainda recebe a ajuda
das companhias telefônicas e de celulares que quando as vítimas mais precisam
os aparelhos ficam fora da área de cobertura ou com as baterias zeradas. Aliás,
algumas ligações que a babá recebe soam ridículas. Para gerar tensão, é óbvio
que em alguns momentos ela vai tremer para atender certas chamadas, mas depois
vem o alívio de não ser o bandido. Kelly (Kate Jennings Grant), a dona da casa,
entra em contato para saber se está tudo bem já que recebeu aviso do disparo do
alarme da casa, mas não faz questão alguma que Jill vá dar uma olhada nas
crianças. Aliás, a jovem aparentemente nem lembra para qual função foi
contratada tamanho o desprezo que tem com os pequenos que parecem hibernar com
a desculpa de estarem gripados. Também é um deslize do roteiro o fato de
Tiffany (Katie Cassidy), uma amiga da garota, telefonar para a residência e seu
número estar gravado na memória do aparelho dos patrões, já que depois
descobrimos que ela não tem ligação alguma com eles e só aparece altas horas da
madrugada na casa para gerar um imbróglio que deixa Jill com a certeza de que o
estranho está lá dentro com ela e dar margem para que o jogo de gato e rato se
intensifique. Belle até que se esforça para passar credibilidade ao desespero
de sua personagem e até declarou que pensava em Jack Nicholson em O Iluminado como sendo o cara do outro
lado da linha. Contudo, ela está superficial em cena. A impressão é que não
teve acesso ao roteiro por completo previamente, mas sua pouca experiência a
impedia de também se entregar totalmente à narrativa, ficando sempre com um pé
atrás a cada movimento de Jill. Todavia, não sentimos angústia ou pavor em sua
interpretação totalmente apática.
Tirando os litros de sangue e alta contagem de corpos, os tradicionais elementos das fitas de horror batem ponto, tais como portas que se fecham sozinhas, trilha sonora estridente, iluminação baixa e jogos de câmera que fazem a vítima parecer cega ou não querer ver elementos óbvios. Sem medo de mergulhar em clichês, o diretor Simon West desperdiça uma história que poderia ser extremamente perturbadora, afinal parte de uma ameaça realista, em troca de uma narrativa rasa, previsível e com cara de telefilme ou de uma sessão da tarde atípica. E o parco resultado nem pode ser justificado por inexperiência já que seu currículo conta com sucessos como Con Air - A Rota da Fuga e Lara Croft - Tomb Raider, ainda que não sejam exatamente exemplos em termos de qualidade. Embora já tenha trabalhado com estrelas de responsa, como Nicolas Cage e Angelina Jolie, além de ter que lidar com uma avalanche de efeitos especiais, em Quando Um Estranho Chama West não dá conta de dirigir praticamente uma única atriz ainda desprovida de vícios e tampouco sabe explorar um cenário real que dispensa retoques em computação. Tudo o que ele precisava estava à disposição de sua câmera, inclusive um desnecessário gato preto para saltar sobre a protagonista vez ou outra ou miar em momentos impróprios.
Claro
que ao longo da narrativa uma morte aqui e outra acolá acontece para provar que
o bandido não quer apenas brincar, como a de Rosa (Rosine 'Ace' Hatem), a
empregada dos Mandraki que parece também hibernar, pois quase não aparece assim
como as crianças. Allison (Madeleine Carroll) e Will (Arthur Young) só são
acionados nos minutos finais quando Jill lembra que se não salvar os pimpolhos
dos ricaços vai ficar sem a grana para pagar sua conta do celular. É claro que
ela também tem um namoradinho, Bobby (Brian Geraghty), que não serve nem para
plantar a dúvida se seria ele o estranho do título. Toda embromação ao longo da
narrativa poderia ser perdoada caso o ato final surpreendesse, mas não.
Chegamos aos minutos finais saturados e frustrados, pois nem um embate digno
entre vítima e algoz é oferecido. Termina tudo com a impotente sensação de que
se fosse você no comando faria o filme completamente diferente e mil vezes
melhor, inclusive quanto a exploração do cenário que conta um lago particular
praticamente ignorado. Habitado por carpas e escondido em meio a uma névoa, uma
ambientação em estilo spa relaxante, não seria nada mal uma quedinha da
protagonista na água e o vilão surgindo do nada para tentar afogá-la. Esta é
apenas uma das situações que poderiam surgir de uma cenografia rica em
possibilidades.
Suspense - 87 min - 2006
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