Nota 7,0 Longa francês não se aprofunda na defesa de tema que desperta preconceitos e deboches
A fórmula básica das comédias românticas é ter alguém sozinho, deprimido ou esbanjando uma falsa felicidade, que a certa altura encontra alguém que faz seu coração bater mais forte, mas por um tempo prefere desdenhar do amor por medo de se envolver demais e ser machucado. Quando ganha confiança e decide investir na relação, surge algum grande obstáculo e a pessoa amada se afasta, mas não demora muito a resolverem seus problemas e finalmente se entenderem. Pode ser em Hollywood, no Brasil ou em qualquer outro país, mas o gênero segue tais diretrizes com raríssimas exceções. A produção francesa Um Amor à Altura segue a cartilha e acaba ficando refém de clichês. Trata-se da história de Diane (Virginie Efira), uma advogada que certa vez esquece seu celular num restaurante após uma discussão com o ex-marido Bruno (Cédric Kahn). Quem o encontra é Alexandre (Jean Dujardin), um bem-sucedido arquiteto que procura na agenda do aparelho o telefone da dona para contatá-la e fazer a devolução. Ela recebe a ligação com espanto, mas logo sente-se agradecida e à vontade para bater um papo como se fossem velhos amigos. Eles combinam um almoço para a entrega do celular e eis que ela tem uma grande surpresa: o homem de voz sedutora não chega a ter um metro e meio de altura. Contudo, Diane acaba fisgada pelo charme e carisma do rapaz e passa a encontrá-lo com frequência, mas ao mesmo tempo que nutre sua felicidade também precisa fugir dos preconceitos de familiares, amigos, estranhos e também do seu antigo companheiro que não perde a chance de pressioná-la a reatar o romance.
O filme se alicerça sobre os encontros inusitados e a maneira apaixonada que Alexandre tenta conquistar Diane enquanto ela tem que aprender a driblar os constrangimentos, inclusive seus próprios, para viver esse amor. Quando apresenta o namorado à sua mãe Nicole (Manoëlle Gaillard), por exemplo, a moça é recriminada, embora a mulher seja casada com um deficiente auditivo fato que, em seu universo preconceituoso, não lhe causa constrangimentos por ser um problema invisível a olho nu. Já ser quase do tamanho de uma criança... A produção é uma adaptação do filme argentino Coração de Leão - O Amor Não Tem Tamanho, um sucesso de bilheteria em seu país de origem que, apesar de alguns méritos, também tinha lá seus problemas. Se por um lado encarava as dificuldades de uma pessoa anã em uma sociedade despreparada para lidar com tal particularidade, também não descartava as piadas insensíveis relacionadas à altura do protagonista e deixava latente sua riqueza como fator de compensação. Se tivesse dinheiro suficiente para surpreender a mulher amada e fazer extravagâncias como alugar um helicóptero a baixa estatura era apenas um mero detalhe. A refilmagem segue fielmente o texto original, mas tenta se diferenciar inserindo momentos típicos de comédia pastelão, como uma cena do casal atípico chamando a atenção numa pista de dança ao som de disco music, um clichê bem hollywoodiano.
A mistura do humor refinado europeu com características das comédias românticas americanas geram um resultado que não é marcante, mas ao menos instiga o contato de um público variado com um cinema ao qual não está acostumado. Para tanto, torna-se muito importante a escolha inusitada de Dujardin para dar vida ao protagonista. Conhecido internacionalmente por ganhar o Oscar pelo nostálgico O Artista, não é de se estranhar que seu nome surja como primeira opção para a maioria das produções francesas que almejam ultrapassar as barreiras de seu país. No entanto, é curioso vê-lo interpretando um anão por ser um homem de estatura alta, mas nada que efeitos digitais não pudessem resolver. Tal opção acaba por de certa forma sabotar o filme que soa um pouco hipócrita, ainda que se evite o deboche. Se as intenções são mostrar que ser baixinho não é impedimento para nada, por que não garimparam até achar um homem com estatura compatível a do personagem? Porte físico, beleza, fama? Preferível acreditar que o talento nato para comédia de Dujardin fez a diferença. Ele usa a mesma linha de atuação escolhida no longa original pelo argentino Guillermo Francella que também teve a estatura diminuída digitalmente, o que confirma que a versão francesa não quis fazer caricatura da figura de Alexandre que não devolve o celular de Diane de imediato na intenção de forçar encontros e aos poucos conquistá-la visto que tem consciência que a diferença de altura seria um empecilho a ser vencido para ficarem juntos.
O diretor Laurent Tirard, do simpático O Pequeno Nicolau e sua continuação, procura trabalhar com um humor mais discreto e menos ofensivo do que estamos acostumados. Todavia, não abre mão de momentos de risos fáceis empregando certo extremismo a algumas situações, como na cena em que Nicole se atrapalha no trânsito com o susto que leva ao Diane revelar a particularidade de seu namorado, uma sequência típica de comédias em que o humor visual dita as regras, mas que atenua o teor crítico da proposta. Essas inserções pastelões no roteiro do próprio diretor em parceria com Grégoire Vigneron buscam claramente ampliar o público e não transformar Um Amor à Altura em um produto de nicho, assim justifica-se a abordagem inofensiva e com perspectiva otimista o todo tempo. Como exemplo, a certa altura Diane vai a uma loja infantil sem revelar que deseja comprar um agasalho para o namorado e depois a vendedora encontra o casal por acaso num parque e prefere não prolongar a conversa por estar visivelmente constrangida, embora não demonstre tecendo comentários maldosos, e os pombinhos continuam com seu passeio com a sensação de terem vencido um desafio.
A narrativa se esforça para ser ao máximo respeitosa com o tema, mas para trazer realismo e conflitos fica impossível não mostrar que a diferença de altura do casal é vista pela sociedade como anormalidade, quase uma atração circense. As pessoas em geral se dirigem a Alexandre quase sempre de forma indelicada tratando-o como uma criança ou uma criatura obrigada a ser engraçada, mas não uma figura humana o suficiente para ser respeitada, um direito inerente a qualquer um. Ao menos quem cruza seu caminho parece ignorar o fato do personagem ser bem-sucedido profissionalmente, rico e bonitão, assim não se aproximam por interesses sobressalentes. Mesmo com certos tropeços de ritmo e com Dujardin se saindo melhor que Virginie por conseguir transitar com mais desenvoltura entre a comédia e as passagens dramáticas, o filme cumpre sua função de divertir com qualidade, mas assim como acontece com a maioria das comédias românticas norte-americanas, esta também é uma produção que se esquece em pouco tempo, sobrando apenas um controverso registro na memória da história da mulher alta que se apaixona por um baixinho.
Comédia romântica - 98 min - 2016
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