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sábado, 30 de dezembro de 2017

MINHA TERRA, MINHA VIDA

Nota 8,0 Embora envelhecido, longa ainda traz uma contundente crítica ao sistema capitalista

Contemporâneo à sua época, o longínquo ano de 1984, Minha Terra, Minha Vida ganhou ares de nostalgia e assumiu o caráter de um registro histórico de um difícil período vivido pelas famílias rurais norte-americanas em tempos de crise econômica, provavelmente um retrato muito próximo a situações vivenciadas em tantos outros países por pessoas cujas sobrevivências também dependiam dos rendimentos de suas plantações e criações. O casal Jewell (Jessica Lange) e Gil Ivy (Sam Shepard) administra uma pequena fazenda que já garantiu o sustento de muitas gerações da família dela e eles pretendem dar continuidade ao legado que será deixado por Otis (Wilford Brimley) que vive com eles e acompanha com tristeza a má fase vivida pela economia rural. Eles trabalham incansavelmente com o reforço do filho mais velho Carlisle (Levi L. Knebel), mas as condições climáticas não iriam garantir uma boa colheita naquele ano. Um inesperado tornado causa um grande prejuízo ao clã que contava com as vendas da safra para quitar suas dívidas com um órgão do governo cuja missão seria incentivar os esforços agrícolas por meios de empréstimos facilitados, contudo, justamente nesse momento difícil, passaram a exigir os pagamentos a prazos apertados e sob rígidas regras, caso contrário os bens dos beneficiários seriam penhorados, incluindo suas próprias fazendas. O mesmo drama é vivido por vizinhos dos Ivy, como Arlon Brewer (Jim Haynie) que chega a pedir emprestada as terras deles durante a entressafra para poder dar continuidade a sua criação de ovelhas que, invariavelmente, mais cedo ou mais tarde também são apreendidas como forma de pagamento de suas dívidas. Toda essa tensão acaba refletindo não só nas finanças dessas pessoas, mas também em seus lados emocionais e psicológicos. Com mais duas filhas para criar, a pequena Marlene (Theresa Graham) e a bebê Missy (as gêmeas Stephanie e Stacy Poyner revezando-se), Gil acaba entregando-se ao vício da bebida e tornado-se agressivo, entrando em constantes atritos com o filho adolescente e com a esposa, esta que assume a posição de ativista dedicando-se a lutar pelos direitos dos agricultores incentivando outros membros do setor a não baixarem suas cabeças e lutar contra os abusos do capitalismo selvagem.

Os primeiros minutos do longa mostram parte da rotina de Jewell que, além de cuidar das meninas, diariamente prepara marmitas para levar ao marido e ao filho que estão no campo trabalhando. Uma família harmoniosa e típica de interior, mas já anunciando os avanços e impacto da modernidade sobre suas vidas com a sutil referência da mãe encontrando nas coisas do adolescente um preservativo e mostrando-se notoriamente contrariada. Com tais sequências o diretor Richard Pearce, então estreante, deseja anunciar que suas intenções são observar de perto e detalhadamente o cotidiano de seus personagens para mostrar o impacto que a iminência da perda de suas terras poderia provocar. Seria o fim de um século de tradição e de tempos felizes, a extinção da simplicidade e a submissão a um sistema capitalista voraz onde pessoas são transformadas em apenas números e estatísticas. O roteiro de William D. Wittliff então escancara seu empenho em fazer crítica às políticas agrícolas impostas pelo então presidente Ronald Reagan que chegou a declarar que Minha Terra, Minha Vida seria uma mensagem evidente de propaganda contra seu governo. O filme foi tão importante à sua época que Lange, indicada ao Oscar e ao Globo de Ouro pelo longa que ela própria produziu, chegou a ser usada como porta-voz do congresso americano para testemunhar como especialista em vida em fazendas familiares, relatando a penosa rotina de quem vive equilibrando-se entre boas e má fases dependo das colheitas e abates de animais, mas cuja esperança em tempos melhores mantinha-se sempre viva. Embora apoie-se em uma questão relevante e evidente na época, quase que um filme feito sob encomenda para servir como alerta, é estranho constatar seu esquecimento, afinal sua mensagem não colocou um ponto final na questão. Entra e sai governo, problemas com a economia rural continuam existindo e a crítica implícita ainda poderia se estender a outros setores como indústria, educação, saúde, segurança... Em todas as áreas os governantes querem levar vantagem. Querem gastar o mínimo possível e lucrar ao máximo às custas do povo que não é tratado como gente de verdade, mas apenas como números que no final dos balanços devem oferecer um saldo positivo ao governo, contas onde sentimentalismos não alteram o produto.

Drama - 105 min - 1984
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