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sexta-feira, 1 de janeiro de 2021

LA LA LAND - CANTANDO ESTAÇÕES


Nota 9 Resgatando o estilo musical, longa acompanha os sonhos e frustrações de jovem casal


Um dia de sol escaldante e centenas de pessoas estão presas em um engarrafamento a perder de vista. De repente ouvem-se alguns acordes harmônicos e alegres e não demora muito para alguém começar a cantar. Logo outro e mais outro até que uma multidão começa a sair dos carros para cantarolar, dançar e esquecer do momento de estresse. E quem assiste no ato é lançado para um típico musical dos tempos áureos de Hollywood e se você conseguir se sentir fazendo parte dessa cena isso quer dizer que ainda na introdução La La Land - Cantando Estações atingiu seu principal objetivo: regatar o cinema em sua nobre e simples função de apenas oferecer uma opção para se fugir da realidade, mesmo que por poucas horas. Após despontar um ano antes com o tenso Whiplash - Em Busca da Perfeição, que já enveredava pelo universo da música, o diretor Damien Chazelle conquistou confiança para no próximo trabalho investir em um gênero bastante datado. Talvez por isso mesmo resolveu rechear sua obra de citações a musicais de sucesso como Cantando na Chuva, Melodia da Broadway, Sinfonia de Paris, entre tantos outros, uma forma de homenagear clássicos da seara e instigar novas gerações a conhecê-los. 

A trama gira em torno de dois românticos e sonhadores que desejam vencer na vida com seus dons artísticos. Mia (Emma Stone) é atendente em uma cafeteria que faz divisa com um grande estúdio de cinema, o que alimenta ainda mais seu sonho de ser atriz, mas nunca consegue passar nos testes. Já Sebastian (Ryan Gosling) é um talentoso pianista que almeja perpetuar o ritmo do jazz, mas tem que se contentar em tocar com uma pequena banda em festas particulares ou em restaurantes, lugares onde as pessoas pouco se importam para o que estão ouvindo. Após um estranhamento no trânsito, os dois passam a se encontrar casualmente, mas só se notam no momento em que eles se permitem a olhar um para o outro de coração aberto. E assim iniciam uma relação amorosa cuja principal motivação gira em torno de seus interesses profissionais, ambos se incentivando. Tudo ia bem até o momento em que um deles alcança seu objetivo, mesmo precisando abrir mão de ideologias, e assim a carreira começa a se tornar prioridade e resta  pouco tempo para se dedicar ao cônjuge, este que então ficará sem chão ao perceber que perdeu seu principal incentivador. 


Embora com muitas passagens dialogadas, são nos números musicais que os protagonistas verdadeiramente se revelam entoando canções que abordam seus desejos, medos e traços de personalidades. Sebastian é um personagem repleto de dúvidas e contradições, mas cheio de sentimentos. É do tipo que toca para uma plateia desatenta preocupada com o jantar com o mesmo prazer que tocaria para uma multidão pagante, afinal dedica-se ao que gosta e sonha em abrir um clube noturno para apreciadores de jazz. No entanto, o amor lhe apresenta uma nova realidade e talvez não seja mais possível viver fazendo o que gosta praticamente de graça. Já Mia é uma moça determinada e que antes de conhecer seu grande amor vivia em função de conseguir contatos que pudessem lhe arranjar algum teste de atriz. Mesmo apaixonada, ela não deixa de lado seu desejo e dedica-se ao máximo aos ensaios de uma peça de teatro que terá a chance de apresentar a pequenas plateias, mas logo na estreia se decepciona consigo mesma ao perceber que seu sonho foi drasticamente reduzido e não acompanhou o de seu companheiro, mesmo ele também não estando plenamente feliz com os rumos de sua carreira. O roteiro, escrito pelo próprio Chazelle, integra as composições musicais de Justin Hurwitz aos diálogos de forma que todas elas soam importantes para compreender a trajetória dos protagonistas e os rumos que suas vidas tomarão, culminando em uma excepcional cena final capaz de surpreender os mais céticos quanto a obra que não se envergonha em colocar os sonhos em sobreposição à realidade. 

Curioso que ao mesmo tempo que o colorido da fotografia e dos figurinos e até a própria atmosfera passem a impressão de que a trama se passa em meados da década de 1950 ou 1960, os carros e celulares que vez ou outra entram em cena tentam fazer o espectador fincar os pés na atualidade, mas é impossível deixar a fantasia nostálgica de lado. Em alguns momentos Chazelle recorre a truques teatrais , como quando troca a iluminação proposital e predominantemente exagerada pelo foco de luz para destacar algum ator em cena, mas La La Land - Cantando Estações tem realmente em seu DNA o cinema. A montagem dinâmica imprime ritmo semelhante a musicais mais recentes como Moulin Rouge e Chicago, mas nas sutilezas dos cenários e movimentação do elenco, para quem é observador e bom de memória, é possível encontrar referências aos musicais da Era de Ouro de Hollywood, talvez o mais fugaz dos gêneros cinematográficos. Praticamente o tempo todo são aplicados conceitos próprios desta vertente, principalmente a inclusão da câmera como se fosse um personagem participante das coreografias, assim oferecendo uma noção avantajada do espaço cênico e conseguindo ângulos inusitados, como na cena em que a câmera gira freneticamente em círculos dentro de uma piscina flagrando as reações de quem está à beira embalado por um som contagiante. 


Nos poucos momentos em que se permite a resvalar na realidade, a fita ganha um tom amargo e entristecido pontuando as nuances do casal central muito bem defendido por seus intérpretes. A química entre Stone e Gosling, já testada antes em Amor a Toda Prova, aqui é ainda mais efusiva representando com verossimilhança as mais variadas etapas da construção de um amor, desde a paquera quase de adolescentes até o ápice da relação quando um não consegue mais viver sem o outro. Contudo, assim como as estações do ano representando fases de suas vidas, uma hora o amor chega ao fim. Ou talvez não? Além das interpretações cativantes, os atores cantam e dançam sem a precisão dos clássicos nomes dos musicais de outrora, assim imprimem realismo a tais cenas como duas pessoas comuns que simplesmente querem expressar seus sentimentos e ideias de forma inusitada. Em clima de sessão da tarde, não se engane. Esta é uma obra que encanta e diverte, mas ao mesmo tempo nos faz refletir sobre as escolhas que fazemos, impulsivas ou não, mas que certamente definirão quem seremos como pessoas e profissionais.

Vencedor do Oscar de direção (Damien Chazelle), atriz (Emma Stone), trilha sonora, canção, direção de arte e fotografia

Musical - 128 min - 2016

Leia também a crítica de:

CHICAGO
NINE
BURLESQUE

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