Nota 5 Sem o impacto da ideia do filme original, longa se rende ao estilo serial killer e à carnificina
Nunca é tarde para uma continuação, mas as vezes a demora denuncia que não há necessidade para tanto. Os Estranhos foi lançado em 2008, mas não se tornou um sucesso. Sua história em suma não difere em nada de tantas outras produções que mostram pessoas ameaçadas por desconhecidos perversos e sem limites que se divertem torturando física e psicologicamente suas vítimas. O clima da fita era seu melhor predicado. Com ação desenvolvida totalmente em uma única noite dentro de uma casa de campo afastada com iluminação baixa em seu interior e o breu quase total do lado de fora, algo intensificado pela densa floresta que cerca o terreno, difícil alguém não se imaginar na pele do casal protagonista. Se já é amedrontadora a ideia de ser encurralado por criminosos, o medo é redobrado quando se percebe que a ameaça não tem como finalidade o roubo de um bem material e sim pura e simples maldade. Não é dada qualquer justificativa para a dupla ser o alvo, apenas deram o azar de estar no lugar e na hora errada. Isso é o mesmo que acontece à família que fica na mira dos sádicos em Os Estranhos - Caçada Noturna, ou melhor, aparentemente, afinal tudo parece milimetricamente calculado nesta emboscada a começar pela ambientação propícia.
Kinsey (Bailee Madison) é uma adolescente problemática que será levada para um distante colégio interno, mas seus pais Cindy (Christina Hendricks) e Mike (Martin Henderson), além do irmão mais velho Luke (Lewis Pullman), decidem fazer uma pausa na viagem e passar a noite em um acampamento de propriedade de parentes. Curiosamente, não há sombra de uma pessoa sequer no local, nem mesmo dos donos, mas o clã parece nunca ter visto um filme de terror na vida e praticamente deixam a porta aberta para serem atacados. Não demora muito e eles recebem a visita de uma garota cujo rosto não é mostrado perguntando se uma fulana está. Poucos minutos depois ela volta e faz o mesmo questionamento. É o bastante para colocar os pais em estado de alerta e se atentarem que seus desmiolados filhos estão fora e bem longe do chalé. A essa altura os jovens já terão descobertos dois corpos e que o camping não está vazio. A família então passa a ser perseguida por três tipos mascarados, os mesmos do primeiro filme: uma com cara de boneca, outra com rosto de pin-up e um homem com um sinistro saco de pano na cabeça. Dentro de um restrito, porém, ampliado espaço físico, o longa segue as diretrizes do original. Não há formas de pedir ajuda externa, não se sabe quem são os criminosos e tampouco os motivos do ataque. Resta às vítimas apenas a opção de enfrentá-los ao longo de uma noite aterrorizante e ao espectador segurar a ansiedade até o final para saber se o diretor Johannes Roberts será ousado a ponto de fazer o mal triunfar.
Quem assistiu ao original sabe que ficou uma mensagem no ar a respeito da impotência que vivemos quanto à violência. A temática não é novidade alguma no mundo do cinema, mas nos últimos anos, acompanhando a fobia da humanidade em geral, observa-se um crescimento na produção de fitas do tipo, ainda mais com a entrada da Netflix no ramo que achou nas tramas sobre casas invadidas um modo barato de lançar produções próprias. Basta trocar os intérpretes das vítimas e dos vilões e achar um lugar tão claustrofóbico quanto do último filme e tem-se um novo produto para fazer a alegria dos fãs do subgênero que sabem exatamente o que esperar sempre, mas a diversão é ser surpreendido por ataques cada vez mais criativos e violentos. Roberts capricha nas emboscadas e seus delinquentes não usam apenas facas de cozinha desta vez. Também atacam com grandes machados e até perseguem com caminhonetes de forma desgovernada. Mesmo apostando basicamente na mesma receita do original, o segundo ataque dos estranhos resulta em algo muito inferior por um simples motivo: o efeito novidade não existe mais. O medo do desconhecido será sempre a maior das fobias e esse era o grande trunfo do filme que fora dirigido por Bryan Bertino, calcado em sugestões, incertezas e fugindo de explicar o inexplicável. Partindo de um argumento do próprio, a continuação perde todo o charme e clima intrigante a partir do momento que mostra-se apressada a iniciar a caçada do titulo. Com cerca de dez minutos de projeção já temos o sinal de largada, mas sem saber praticamente coisa alguma dos participantes da disputa. Os estranhos também perdem seu ar de mistério e sarcasmo agora ficando mais expostos. Um até literalmente deixando a máscara cair.
Sem acrescentar absolutamente nada à ideia original, fica claro que este segundo filme existe unicamente pela cultura hollywoodiana de explorar qualquer mínima possibilidade de gerar uma franquia. É uma tentativa arriscada, pois ao mesmo tempo que pode enaltecer e gerar curiosidade pela matriz também pode denegri-la irremediavelmente. O roteiro de Ben Kentai busca um estilo mais próximo ao de um slasher movie e por várias vezes evoca lembranças de expoentes deste subgênero, como a ambientação estrategicamente deserta e o fato dos mocinhos parecerem seguir um roteiro pré-planejado pelos vilões, estes que ganham uma aura de imortais, chegando ao absurdo de um deles sobreviver a um carro em chamas. São pequenos detalhes que o espectador tomado pela tensão e expectativa do momento pode não perceber, mas basta subirem os créditos finais para cair a ficha de que a ideia brilhante do primeiro filme foi totalmente desconstruída a favor de um tradicional jogo de gato e rato. Se antes tínhamos um casal em crise encontrando em um episódio de fobia a chance de reavaliarem seus sentimentos, aqui temos uma família também com problemas, mas não fica claro o peso que isso tem em suas vidas e muito menos se existe afeto real entre os membros. Sem características para cativarem a plateia, quando o perigo os cerca a sensação é que vale a máxima do cada um por si, embora como de praxe tomem atitudes estúpidas e se coloquem facilmente em risco.
Vale destacar a participação do jovem Pullman não por sua atuação em específico, mas pela cena de emboscada que lhe ofereceram. Na área do clube do acampamento, o ambiente inóspito e escuro inesperadamente ganha luzes de neon e uma trilha sonora dissonante ao que está para acontecer. Aliás, muito boa a sacada da utilização de canções populares da década de 1980 acompanhando os atos dos mascarados. A nostalgia despertada por elas em contraste à violência explícita causam uma sensação difícil de explicar, hipnotizante. Ainda que tenha seus momentos relevantes, Os Estranhos - Caçada Noturna serve apenas com um passatempo, mas não está no patamar de lixo total como alguns devem tachar, muito pelo contrário. Entretanto, frustra violentamente quem foi tomado pelo clima aterrorizante e anarquista do primeiro. Ao menos somos poupados de cenas com sangue esguichando pela tela. Já basta a crueldade dos ataques.
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