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domingo, 3 de janeiro de 2021

EU AINDA SEI O QUE VOCÊS FIZERAM NO VERÃO PASSADO


Nota 3 Sequência abandona suas origens e entrega um típico e descartável filme de psicopata


Se Pânico foi sucesso de público e crítica, sua primeira continuação teve a proeza de manter o mesmo nível de aprovação e conseguir ser tão bom quando o original. Um feito raro. Eu Sei o Que Vocês Fizeram no Verão Passado também chegou com todo o gás aos cinemas e rendeu seis vezes mais do que custou, o que animou os produtores imediatamente a produzirem uma sequência, ou melhor, ela já devia estar sendo preparada antes mesmo do lançamento do primeiro. Isso que é confiança! Para os ânimos não esfriem, em questão de poucos meses Eu Ainda Sei o Que Vocês Fizeram no Verão Passado já estava ganhando as telonas, porém, como diz o ditado, quem tem pressa come cru. A fita alterna momentos que parecem parodiar o subgênero dos slashers movies com outros dignos de produções trash. Um ano depois de serem aterrorizados por um violento psicopata e perderem dois amigos em suas mãos, Julie (Jennifer Love Hewitt) muda-se para Boston e retoma a faculdade, o que acabou abalando sua relação com Ray (Freddie Prinze Jr.) devido ao relacionamento à distância. Ela ainda é perturbada por visões do assassino, mas tem a chance de espairecer um pouco quando vence a promoção de uma rádio e ganha uma viagem para uma ilha nas Bahamas para onde vai acompanhada de sua colega de quarto Karla (Brandy Norwood). Qual a capital do Brasil? Rio de Janeiro elas respondem. A resposta deixa os espectadores brasileiros perplexos, mas não foi um erro do roteirista Trey Callaway, foi proposital. 

Animadas para a viagem na companhia de Will (Matthew Settle) e Tyrell (Mekhi Phifer), que estão doidinhos para terem prazerosos momentos a sós com elas, as moças nem imaginam que caíram em uma armadilha, a começar pelo fato de o prêmio ser dado em uma época de muitas tempestades na região e o hotel estar às moscas. Não demora muito para que a tenebrosa figura do assassino encapotado e munido de seu afiado gancho dê as caras e comece a colecionar vítimas, incluindo alguns moradores da ilha que nada tem a ver com o casal sobrevivente da primeira carnificina que, diga-se de passagem, era até bem modesta em comparação a este segundo ataque. Seguindo uma regrinha estimulada em Pânico 2, sequências devem ser recheadas com mais mortes, talvez porque se há alguma originalidade implícita no argumento-raiz da franquia ela já foi totalmente explorada no primeiro filme, não havendo muita história para desenvolver na continuação. Apelativo, o longa dirigido por Danny Cannon aposta todas as suas fichas em assassinatos violentos e em desculpas absurdas e insustentáveis para conduzir o roteiro capenga, uma colcha de retalhos de tudo o que já se viu em produções do gênero, principalmente do pior que já fora apresentado. O roteirista Kevin Willianson, autor do texto do filme original e de tantas outras fitas relevantes de terror e suspense do final da década de 1990, desta vez nem sequer colaborou com o argumento e sua falta é sentida pelo resultado entregue por seu substituto na função que escreveu uma narrativa bastante movimentada, mas repleta de furos e desinteressante. 


O primeiro longa surpreendeu por mudar sutilmente a fórmula do slasher movie. Para que tantos personagens idiotas e mal construídos se pouco nos importaremos com suas mortes? Por que promíscuos e drogados fatalmente são assassinados? Bem, a outra fita contava apenas com quatro alvos principais, formando dois casais, e subentende-se que todos beberam e fizeram sexo na noite em que atropelaram um homem e no desespero jogaram seu corpo ao mar, episódio que deflagrou todo o calvário que viriam a enfrentar e estremeceu os laços afetivos e amorosos entre eles. No entanto, os personagens não passam o resto do filme pensando naquilo ou viajando à base de entorpecentes. Há um amadurecimento dos jovens, o trauma os machucou profundamente e mesmo o mais rebelde do grupo não se comporta como um adolescente mimado ou descerebrado, ou ao menos pega mais leve com tal estereótipo. Cada um tentou seguir seu caminho, mas foram forçados a se reaproximar para se defenderem de uma ameaça. Com menos gente para morrer, embora um ou outro personagem próximo aos protagonistas inevitavelmente tenha sido vitimado, o foco era no suspense, na tensão de ser caçado por alguém que parece invisível, onipresente e bastante masoquista visto as várias tentativas que tinha de matar os jovens, mas preferia se divertir assustando-os pregando amedrontadoras peças. 

Fora a presença de dois sobreviventes, sem a garra que apresentaram anteriormente, e a volta do assassino com a mesma indumentária de pescador e munido de seu gancho, a continuação descarta tudo de bom que o original apresentou. Bastante esquemática, é duro de engolir a história que se vale de um plano mirabolante do psicopata para exterminar as duas vítimas que lhe escaparam. Bastava ele as persegui-las e se aproveitar de um momento de distração para ceifar suas vidas. Contudo, ele consegue atrai-las para um lugar paradisíaco, mas estrategicamente deserto. Não se pode negar que o clima chuvoso e nublado, além da ambientação esvaziada, enriquecem a trama acentuando a sensação de impotência dos personagens, mas não a ponto de suprimir a pobreza dos diálogos e tampouco das atuações. Como já dito, Hewitt e Prinze jr. retornam a seus papeis, mas parecem pouco a vontade, como se estivessem constrangidos de aceitarem participar de tal bomba. Ruim com eles, pior sem eles, a julgar pelos perfis estereotipados dos personagens inéditos incluindo uma ponta de um deslocado Jack Black antes da fama interpretando Titus Telesco, um nóia que nada agrega à trama, sequer humor. Nem mesmo creditado, ele está em cena apenas para aumentar as estatísticas de corpos da produção que, diga-se de passagem, é bastante considerável, jogando por terra o que o longa-embrião tinha de melhor: a economia de violência. 


Além do elenco enxuto, o original também não desperdiçava sangue e até as mortes de dois dos protagonistas, vividos por Sarah Michelle Gellar e Ryan Phillipe, foram marcadas mais pela tensão envolvida e os golpes fatais foram sugestionados. Para bom entendedor, uma imagem vale mais que mil palavras. Já Cannon preferiu investir na violência explícita em Eu Ainda Sei o Que Vocês Fizeram no Verão Passado e o tiro saiu pela culatra enterrando assim as chances de uma promissora franquia. Mesmo assim um terceiro filme foi rodado e lançado diretamente para home vídeo, um típico caça-níquel contando apenas com um oportunista e ainda mais longo título, único elo de ligação com os demais longas da série. Ironicamente, o fracasso de crítica da produção, embora nas bilheterias não tenha se saído mal, só não afetou negativamente a carreira de Black que nos anos seguintes deslanchou mesmo com altos e baixos. Já Hewitt passou a ser figura bissexta nos cinemas e Prinzze Jr. enveredou pelo campo das comédias românticas repetindo-se e esgotando suas possibilidades. Por fim, o diretor abandonou as telonas e passou a se dedicar a direção de seriados. Pelo visto, ao receberem a proposta, os envolvidos deveriam ter respondido "eu não sei, não quero saber e tenho raiva de quem sabe o que vocês fizeram no verão passado". Só rindo mesmo.

Terror - 101 min - 1998

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