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sexta-feira, 27 de outubro de 2017

UM TIO QUASE PERFEITO

NOTA 6,5

Com a velha premissa do sem
noção que cresce com as adversidades,
comédia agrada crianças e adultos com
fórmula comum a filmes para toda família
O título tenta um claro link com Uma Babá Quase Perfeita, a clássica comédia do saudoso Robin Williams, mas felizmente a estratégia é apenas para publicidade. Para o bem do cinema nacional e seu amadurecimento, mesmo com um ou outro momento que possam remeter a citada comédia, estruturalmente Um Tio Quase Perfeito segue seu próprio caminho e foge de tentar recriar situações vividas pelo pai que para poder conviver mais tempo com os filhos assume a identidade de uma simpática senhora. No caso, o bonachão Tony (Marcus Majella) é um aspirante a ator que sem sorte se aproveita de seu talento para ganhar alguns trocados nas ruas vivendo desde uma estátua viva em trajes de guerreiro romano até um pastor vigarista que vende uma água pretensiosamente milagrosa, mas o tipo mais difícil de interpretar é aquele que já deveria estar acostumado: o de tiozão. Sempre contanto com o apoio de Cecília (Ana Lucia Torre), sua mãe, ele vive de pequenos golpes na rua, mas sempre endividados eles acabam sendo despejados de onde moram e para não ficarem pedindo esmolas, o que para eles não seria problema algum tamanha cara-de-pau que ambos tem, eles pedem asilo para Angela (Letícia Isnard), irmã do rapaz. O convívio com a família nunca foi dos melhores e a moça sempre tentou manter certo distanciamento, assim não gosta nada da ideia de abrigar a dupla em sua casa, ainda mais para evitar que os seus maus costumes sirvam de exemplo aos filhos pequenos, Patrícia (Julia Syacinna), João (João Barreto) e Valentina (Sofia Barros). Contudo, um compromisso profissional fora da cidade a obriga a viajar de uma hora para a outra e com o sumiço da babá das crianças não lhe resta alternativa a não ser deixá-las sob a batuta do tio e da avó destrambelhados. Eles não teriam que fazer nada de outro mundo, apenas manter a rotina dos pequenos de ir à escola, fazerem a lição, manter a casa em ordem, mas como já é de se esperar, uma série de situações vão revelar o quanto Tony é imaturo ao mesmo tempo que aos poucos os sobrinhos vão conquistando seu carinho e atenção.

O roteiro de Sabrina Garcia, Rodrigo Goulart e Leandro Muniz, este o mais experiente do trio tendo escrito o texto de Meu Passado Me Condena e sua sequência, claramente tinha o objetivo de testar o poder de fogo nas bilheterias de Majella, figura conhecida em sitcons dos canais fechados e parceiro de graça do ator Paulo Gustavo. Juntos estiveram em Vai Que Cola - O Filme, derivado do programa humorístico homônimo que não rendeu nas telonas. Na TV paga, os humoristas podem trabalhar sem muitas amarras, improvisar a vontade e não ter papas na língua, o que ajuda coadjuvantes a roubarem a cena como foi o caso de nosso protagonista. Majella se destacou aproveitando-se dessa liberdade, mas no cinema até então só encontrou pequenos papeis. O tio Tony seria sua primeira grande oportunidade, mas como uma produção voltada à família o humor comedido teve que prevalecer e tirou um pouco a naturalidade do ator. Contudo, seu titio sem noção diverte e causa identificação com seus conflitos tentado lidar da melhor forma com as crianças. Falando nelas, percebe-se certo avanço na interpretação do elenco mirim se comparado ao que era apresentado antigamente em filmes da Xuxa ou Renato Aragão.  Claro que não se pode exigir uma super atuação da pequena Sofia, mas sua fofura a faz ter presença em cena assim como João, apenas um pouco mais velho. Contudo, quem se destaca é Julia que como a mais velha das crianças acaba assumindo o papel de protetora até mesmo do tio que é tão imaturo quanto seus irmãos. Muito perspicaz a garota logo nota que seus responsáveis temporários não estão ali simplesmente para ajudar sua mãe, mas por necessidade, assim não se importa em oferecer a mesada que poupou para o tio resolver um problema com cobradores. Por outro lado, da personagem Cecília que pela experiência de vida cobraríamos um comportamento aconselhador, fazem piadas em torno da malandragem. De bisbilhotar a vida das pessoas nas redes sociais para auxiliar o filho num trambique de vidência até ensinar os netos um joguinho de sorte para sobreviverem caso venham a ser presos, o roteiro se apoia no estereotipo da velhinha inconsequente que usa a desculpa da idade avançada para se esquivar de problemas.

O diretor Pedro Antonio, que fez sua estreia na função com Tô Ryca que também tinha o objetivo de catapultar a carreira cinematográfica de Samantha Schmutz, outra estrela do humor televisivo, não busca inovações e investe em uma clássica premissa para o gênero. É fácil se identificar com um personagem desastrado ou desafortunado que de uma hora para a outra se vê em meio a situações que o forçam a amadurecer e dar novos rumos à sua vida. Apesar de se estruturar da forma mais simples e objetiva possível, a trama não apela para gerar risos fáceis mantendo o teor inocente. Familiarizando rapidamente o espectador quanto ao universo e personalidade do protagonista ainda durante os créditos iniciais, a tônica da fita é justamente mostrar a sua transformação em alguém melhor com o convívio com os sobrinhos, uma relação que não soa em nenhum momento forçada, pelo contrário, é totalmente crível e bem amarrada. Claro que a narrativa não é redondinha, tem lá seus momentos que poderiam ser melhor explorados e carrega vários vícios das comédias nacionais. Além da melhora de vida de um popular que tardiamente consegue sua independência e estabilidade, também temos o estereótipo da mulher moderna que muitas vezes coloca a carreira em primeiro lugar dando abertura aos conflitos que vão sustentar o enredo e há sutis cutucões à classe política na figura e conduta de Gustavo (Eduardo Galvão), o pai das crianças, que vive viajando e procura compensar sua ausência com as regalias que seu polpudo salário pode proporcionar. Contudo, o texto não explora o humor crítico que poderia surgir nas comparações entre o patriarca real, refinado e displicente com suas obrigações, e o pai substituto, que embora atrapalhado surpreende realizando tarefas em que era desacreditado. Entre elas, está a realização da peça de teatro escolar de Patrícia baseada em um clássico de William Shakespeare que Tony trata de atualizar e deixar mais conectada com a juventude atual. Como um novo passo para nosso cinema, o de fomentar a plateia do futuro, Um Tio Quase Perfeito funciona apresentando uma narrativa água-com-açúcar que dialoga facilmente com produtos similares hollywoodianos, mas em termos de conteúdo infelizmente não ousa ir além da palavra quase destacada no título.

Comédia - 95 min - 2017

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