Nota 6,0 Sátira e homenagem à ficção científica, longa diverte, mas teria muito mais a explorar
Durante quatro anos a corajosa e destemida tripulação da NSEA Protector honrou seu uniforme e partiu para emocionantes e perigosas aventuras desbravando o espaço sideral.... Isto até que o seriado foi cancelado. O reencontro do elenco quase vinte anos depois é o ponto de partida da comédia Heróis Fora de Órbita que parodia, mas ao mesmo tempo homenageia, Jornada nas Estrelas e todo seu legado. “Galaxy Quest”, o seriado dentro do filme e que também o intitula originalmente, era produzido no início da década de 1980, mas mesmo tantos anos após seu término sua legião de fãs nunca deixou de vivenciar o cotidiano dessa espécie de universo paralelo que se formou entre realidade e fantasia. Eles compram souvenires, fantasias e ainda discutem sobre possíveis enredos para novos episódios e até sobre erros técnicos envolvendo leis da física que tornariam impossíveis certas façanhas dos heróis. Os atores, por sua vez, precisaram se acostumar com a escassez de novos trabalhos e reconhecer que estariam atrelados para sempre à imagem de seus personagens, assim sobrevivendo com os cachês que recebem para participar de convenções de ficção científica nas quais saudosistas e novas gerações ainda os idolatram. Bem, os mais novos nem tanto.
Após um encontro com fãs no qual foram exibidos alguns trechos ainda inéditos da série, o ator Jason Nesmith (Tim Allen), intérprete do Comandante Peter Taggert, acaba ouvindo sem querer uma conversa entre adolescentes que tiram sarro do seriado, da situação do elenco e até mesmo da conduta dos fãs ardilosos. Sempre egocêntrico, nesse momento lhe cai a ficha de que parou no tempo e estava vivendo uma ilusão, sua vida é considerada uma piada fora do mundo dos “trekkers” (como são chamados os aficionados pela cultura sci-fi). O restante do elenco também goza de uma vida sem graça. Gwen de Marco (Sigourney Weaver), a Tenente Tawny Madison cuja participação se resumiria a repetir as mensagens do computador de bordo e exibir seu decote, continua vivendo às custas de seus atributos físicos. Alexander Dane (Alan Rickman), que dava vida ao sábio alienígena Dr. Lazarus, não aguenta mais ter que repetir aonde vai a icônica frase que seu personagem bradava repetidamente, além de não esconder a frustração de nunca ter tido a chance de demonstrar seus talentos dramáticos. O elenco coadjuvante também é bastante desajustado. Tommy Webber (Daryl Mitchell), que era o pequeno e esperto navegador da nave, hoje é um adulto apático tal qual Fred Kwan (Tony Shalhoub), o engenheiro da equipe, que vive a base de tranquilizantes que o deixam fora de órbita, sem trocadilhos. Por fim, Guy Fleegman (Sam Rockwell) aparentemente é o mais traumatizado de todos, já que sua função nos episódios era ser o tripulante cuja vida sempre era colada em risco para atestar a periculosidade das aventuras intergalácticas, mas o que mais lhe aflige é o fato de não ser reconhecido pelo público.
Todavia, um fato inesperado vai fazer com que todos recobrem a confiança em si mesmos e o encantamento por seus personagens. Na citada conferência, diga-se de passagem, na qual os atores acabam tendo algumas discussões, um grupo de fãs vestidos à caráter e falando e agindo como se fossem os personagens alienígenas do seriado entram em contato com Nesmith pedindo sua ajuda para salvar seu povo da ameaça de um tirano que quer dominar um planeta desconhecido. O ator leva tudo na brincadeira julgando se tratar de um grupo de fanáticos pelo seriado. De certa forma, eles não deixam de ser fãs. Eles na realidade fazem parte de outra galáxia e tiveram acesso as transmissões do programa de TV, mas julgam serem imagens reais dos heróis em ação, documentos históricos nos quais todos os valores e ideais desta sociedade foram formatados. Ameaçados pelo ardiloso e asqueroso Sarris (Robin Sachs), eles querem que a tripulação da NSEA Protector os salvem da extinção. Ao cair a ficha de Nesmith sobre a confusão ele resolve tirar proveito da situação, mas quando os demais atores também enviados para essa missão às escuras percebem o que está acontecendo já é tarde demais para voltarem atrás. Sem roteiro, direção ou qualquer conhecimento sobre viagens no espaço, o elenco terá que se esforçar para entregarem a interpretação de suas vidas vestindo o uniforme de heróis com a cara e a coragem. Só não espere aventuras com efeitos especiais de ponta como de costumo em produções do tipo. A opção pela simplicidade foi intencional para acentuar o tom de paródia, assim releve a caracterização carnavalesca do vilão e o jeito tosco de uma turminha de alienígenas endiabrados que surge lá pela metade.
Apesar do título nacional vender uma comédia bobinha, esta produção é uma agradável surpresa criada pelos roteiristas David Howard e Robert Gordon. Além do bom uso da metalinguagem (uma mídia dentro de outra), a trama aborda o universo dos fãs da série, representados tanto pelos ingênuos alienígenas quanto pela figura de Brandon (Justin Long), um jovem nerd aficionado pelo programa e que será peça-chave para o desfecho, como também mostra a visão crítica de quem está de fora deste universo sci-fi, inclusive não omite nem mesmo a opinião dos atores quanto ao impacto e persuasão da fantasia nas vidas dos espectadores e nas deles mesmo. Dessa forma, mesmo quem está por fora do mundo dos “trekkers” consegue compreender a trama e até mesmo repensar suas impressões sobre essa galera que de boba não tem nada. Aliás, apesar das brincadeiras e exageros, o longa reconhece a importância das sagas espaciais para seus fãs. Coincidentemente, no mesmo ano, estreava Star Wars – Episódio I – A Ameaça Fantasma, primeiro capítulo de uma nova trilogia que serviria como um prólogo dos longas originais que marcaram época, ou melhor, o sucesso foi tanto que não ficou restrito a uma geração, sendo uma paixão passada de pais para filhos.
Heróis Fora de Órbita foi lançado nos EUA quase que simultaneamente a aventura do então jovem Anakin Skywalker e ainda assim conseguiu fazer uma pequena fortuna por lá cobrindo com folga seus custos, no entanto, a produção teve resistência em outros países como no Brasil onde a estreia foi postergada várias vezes até ter um lançamento raquítico. Nem mesmo em home vídeo teve uma segunda chance de encontrar seu público, uma pena. O diretor Dean Parisot mostra destreza ao recriar situações familiares aos amantes de aventuras no espaço e até mesmo em lidar com os estereótipos dos personagens. Com a frustração que carregam, todos acabam ganhando certa identidade própria. A escalação de Weaver para viver a mulher gostosona e inútil da trupe é curiosa visto que ela própria deu as costas para tal chavão ao aceitar viver a valentona tenente Ripley da franquia Alien. Ela leva com bom humor a brincadeira, assim como Allen e Rickman que se inspiraram e até imitam trejeitos, respectivamente, dos atores William Shatner e Leonard Nimoy, o comandante Kirk e o Sr. Spock da citada série homenageada. Aficionados ou não por sci-fi, vale a pena uma conferida nesta comédia injustamente esquecida, mesmo com suas falhas. Que falta faz uma boa campanha de marketing...
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