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sexta-feira, 16 de julho de 2021

QUEM É CLARK ROCKEFELLER?


Nota 7 Trajetória de um dos maiores golpistas dos EUA é instigante, mas extremamente resumida


Um homem consegue trocar de identidades com facilidade várias vezes ao longo de sua vida e até engana a própria esposa por muitos anos. Argumento ótimo para uma telenovela? E se ele fosse baseado em fatos reais renderia um bom filme? O diretor Mikael Salomon ficou em cima do muro entre as mídias para contar uma história que de tão mirabolante é difícil de acreditar. Pelo capricho técnico da produção e premissa, Quem é Clark Rockefeller? poderia muito bem ser um produto de cinema, mas como telefilme acabou prejudicado pela duração enxuta e mal aproveitamento de um material extremamente instigante. O roteiro de Edithe Swensen narra a história de Christian Karl Gerhartsreiter, um alemão condenado a cumprir uma sentença de 27 anos de reclusão em solo norte-americano acusado de assassinato, mas sua ficha criminal é extensa. Na adolescência ele se mudou para os EUA e desde então passou a assumir diversas identidades. Colecionador de arte, capitão de navio, astrofísico, executivo de fama internacional, aristocrata inglês, médico e, por fim, contador com inclinação à filantropia. O ator Eric McCormack, famoso pelo seriado "Will e Grace", assume o papel do falsário quando ele passa a usar a identidade de Ckark Rockefeller e o enredo se concentra primeiramente nos eventos que aconteceram em sua vida a partir de 1995, ano em que se casou com Sandra Boss (Sherry Stringfield), uma bem-sucedida executiva. 

O casal teve uma única filha e durante anos o impostor levou uma vida próspera às custas do dinheiro da esposa. Contudo, chegou um momento em que a mulher se cansou de sustentá-lo, ainda mais diante de estranhos fatos que começou a notar em relação ao marido. Resumidamente a trama é essa, mas é nos detalhes do passado obscuro do protagonista e na maneira como ele foi desmascarado que reside o ponto de interesse da obra, ainda que se tratando de um filme feito para a TV foi preciso aglomerar o máximo de informações possíveis em um curto espaço de tempo. Mesmo assim é uma opção acima da média para o formato. Muitos pontos poderiam ser mais bem desenvolvidos, como a crítica inserida a respeito do deslumbramento que a fama e o dinheiro provocam. Só assim para explicar o fascínio que Gerhartsreiter exercia a cada nova identidade que assumia, sempre se posicionando como alguém de sucesso e de cultura elevada. Rockefeller, por exemplo, seria o rebento de uma das famílias mais nobres do solo norte-americano, certamente um rótulo que ajudou a conquistar a confiança e o coração de Sandra. O filme começa já com o casal separado há cerca de oito meses e durante todo este tempo o rapaz estava sem ver a filha Snooks (Emily Alyn Lind), mas sua ex-mulher aceita que eles tenham um encontro desde que vigiados por alguém de sua confiança. Tanto cuidado em vão. Ele já tinha arquitetado um plano para fugir com a menina que não compreende a situação e até acha divertido viajar sozinha com o pai.


A partir deste ponto a narrativa se divide entre as investigações e longos flashbacks que tratam de narrar a trajetória do vigarista, mas só na segunda metade é que teremos contato com os perfis falsos criados por ele anteriormente. Cerca de quinze anos antes, Sandra conheceu aquele que seria seu futuro marido e imediatamente se sentiu atraída pelo seu perfil culto e refinamento. Pouco tempo depois ele lhe contou uma triste história a respeito da perda precoce dos pais que lhe rendeu um trauma, tudo para convencê-la de que ele precisava de uma mulher como ela (leia-se rica e ingênua) ao seu lado para se tornar o homem de sucesso que sempre desejou ser. O sogro quando o conheceu o achou excêntrico e nenhum convidado compareceu à cerimônia de casamento respeitando a vontade do noivo de que a ocasião era exclusiva para a mulher que amava brilhar. A essa altura o espectador já está se questionando sobre a qualidade do texto, mas o rótulo de baseado em fatos reais nos força a ver até onde pode chegar a farsa. Como todos que conheciam o casal não comentavam sobre os hábitos introspectivos do rapaz? Simplesmente alegavam que como herdeiro da fortuna e tradição de um clã respeitável ele podia tudo, mas ninguém teve curiosidade em bisbilhotar sobre essa suposta origem de sangue nobre? O poder e o dinheiro realmente cegam as pessoas. 

Durante as investigações, liderada pela agente do FBI Norton (Regina Taylor), alguns fatos chamam a atenção e tendem a colocar Sandra em maus lençóis. O nome do foragido não consta em nenhum cadastro de documentos e a esposa aceitou sempre assinar seu nome como de solteira alegando que o ex-marido é obcecado por segurança e cuidava de todos os assuntos relativos a documentações da família, tomando cuidado de não divulgar endereços ou telefones nem mesmo a pessoas próximas. Chama a atenção como uma mulher, longe de ser uma ignorante, compactuava com todas as excentricidades do companheiro, inclusive concordar que ele ficasse em uma casa isolada cuidando da filha enquanto ela passava toda semana em outra cidade trabalhando duro para alimentar os supostos investimentos dele em negócios dos quais ela nada sabia. De qualquer forma, antes de ser vista como cúmplice, esta mulher é peça fundamental no plano de capturar Rockefeller. Todavia, os departamentos de polícia de outras localidades estão dispostos a reabrir antigos processos conforme vêm à tona as peças que formam o complicado quebra-cabeças que é a vida de Gerhartsreiter que começou sua trajetória criminal com apenas 17 anos. Na Alemanha, ele conheceu um casal americano e usou a mínima intimidade que conquistou para conseguir permissão para viajar com eles. Já nos EUA, alegando ser de uma rica família germânica, cativou a confiança de mais alguns inocentes que lhe deram apoio durante algum tempo, mas não demorou muito para a relação amistosa se desgastar. Para conseguir seu green card e poder permanecer em solo ianque,  casou-se apressadamente, mas a união durou apenas um dia. 


Já em meados da década de 1980, Gerhartsreiter teve uma relação muito próxima a um jovem casal que desapareceu misteriosamente, embora a família tivesse sido informada que eles decidiram fazer uma longa viagem e sem planos para voltar. A autenticidade de tal mensagem foi questionada e apesar de algumas suposições faltavam provas concretas para a polícia capturar o falsário, mas quando restos mortais do casal foram encontrados ao lado da pousada onde ele vivia mais uma vez foi necessário assumir uma nova vida e é então que Sandra entra na jogada. Quem é Clark Rockefeller? termina mostrando a modesta pena que o meliante pegou por conta do sequestro da filha e dos crimes secundários que realizou para mantê-la sob sua custódia, mas sua história merece uma atualização, seja na TV ou no cinema, já que os 27 anos de reclusão citados no início do texto se referem ao tal duplo assassinato e foram decretados posteriormente à realização deste filme. Aliás, as condutas da defesa e a do próprio acusado mereciam mesmo uma análise mais profunda. Desde invocar problemas de insanidade, passando por conceitos de telepatia até chegar ao ponto do acusado dispensar qualquer advogado e investir em sua autodefesa, a vida deste homem realmente prova que o absurdo é uma realidade.

Suspense - 87 min - 2010 

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