Nota 5 Tentando fugir de fórmula açucarada, romance desperdiça bons argumentos e elenco
Algumas atrizes já estão com a imagem tão enraizada a comédias românticas que qualquer filme que lancem com temática amorosa automaticamente é rotulado em tal gênero. Talvez isso explique o ostracismo de Pegar e Largar que tem como protagonista Jennifer Garner. Quem esperava uma trama convencional de encontros e desencontros e pontuada por momentos de humor certamente se decepcionou ao se deparar com um romance dramático. Experiente no gênero água-com-açúcar, Susannah Grant, roteirista de Para Sempre Cinderela e Em Seu Lugar, além de assinar o texto neste caso também fez sua estreia como diretora, mas seguiu seu estilo e dosou bem o amor e a tragédia, errando a mão nos poucos momentos de humor da produção. A trama começa mostrando o sofrimento de Gray Wheeler (Garner) que poucas horas antes do casamento acaba sendo surpreendida com a notícia de que Grady, seu noivo, inesperadamente faleceu. Desnorteada, seus pensamentos parecem querer dialogar com o rapaz detalhando suas sensações durante o funeral, uma sensação natural de quem de uma hora para a outra viu seus sonhos desmoronarem. Neste momento difícil, a moça acaba encontrando apoio na solidariedade oferecida pelos amigos com quem o noivo dividia uma casa.
O divertido Sam (Kevin Smith) e o responsável Dennis (Sam Jaeger) a convencem a entregar a residência onde o casal moraria, já que não teria como bancar o aluguel, e ela ir viver com eles, assim não se sentiria tão só e nem teria que se desvencilhar totalmente das lembranças do ex. Enquanto a dupla faz de tudo para reanima-la, Fritz (Timothy Olyphant), outro amigo do falecido, mas que Gray desconhecia, parece pouco se importar com o ocorrido. Aliás, em uma tentativa forçada de injetar humor na trama que começa depressiva, o rapaz metido a conquistador descola uma paquera durante o velório e não pensa duas vezes antes de levar a moça para o banheiro para darem uma rapidinha. Detalhe, a recém-viúva estava escondida na banheira tentando colocar as ideias no lugar, mas por de trás da fina cortina de plástico acompanhou toda a cena com riqueza de detalhes sonoros. Obviamente Gray se antipatiza com Fritz imediatamente, mas ele muito cara-de-pau não se envergonha e também se hospeda na antiga casa do falecido, mesmo aparentemente não tendo intimidade com Sam e Dennis. O rapaz na verdade é um amigo que Grady havia feito em Los Angeles, já que ele constantemente viajava a negócios. Contudo, conforme o tempo passa, a viúva começa a perceber que essa amizade era mais sólida que aparentava e que Fritz guarda segredos a respeito do homem que ela julgava conhecer tão bem.
Gray fica sabendo que o noivo tinha uma poupança milionária sobre a qual jamais havia falado com ela ou com seus amigos de casa. Depois descobre que por anos ele enviava mensalmente uma quantia em dinheiro para Maureen (Juliette Lewis), uma massagista com quem ele teve um filho, o pequeno Mattie (Joshua Friesen). Como desgraça pouca é bobagem, a amante vai pessoalmente procurar o pai de seu filho para pedir o pagamento do mês em atraso, mas nem imaginava tudo o que aconteceu. Contudo, nesse turbilhão de emoções, ao ver a sua imagem de homem ideal ruir, Gray passa a ver Fritz com outros olhos, aquele tipo de cara com quem ela jamais pensou em se relacionar, mas que poderia ser a solução para fazê-la esquecer dos problemas. A história simples reúne todos os ingredientes necessários para agradar as plateias femininas, porém, o longa traz certo ar de cinema independente com personagens problemáticos, mas não dispensa um final açucarado. A sensação de um romance fora dos padrões hollywoodianos poderia ser acentuada pela presença de Smith, ator conhecido no circuito alternativo, no entanto, seu personagem é o mais desinteressante e abertamente cômico. Faz o papel do coadjuvante que fala muita abobrinha e sem noção. Com um ou outro momento de glória ao dar uma bola dentro, em geral sua participação é limitada a reciclar um estereótipo, inclusive piadas.
Os demais personagens seguem uma linha mais pé no chão, até mesmo a alternativa Maureen, uma mulher que contagiada pelos mandamentos de sua profissão vive falando sobre aura, xacras, energias positivas e alimentação saudável. As motivações da personagem para se aproximar dos amigos de Grady poderiam render muito mais, mas seu gancho é trabalhado superficialmente e perde ainda mais força quando ela se alia à Sam. De qualquer forma, é sempre bom ver Lewis em cena, a promessa de grande atriz que ficou só nas boas intenções, mas ela se sai bem em papéis que lhe exigem pouco. O que sobra de naturalidade nela falta em Garner que se esforça para tornar crível o drama da protagonista, mas para quem sofreu tantos baques seguidos aparentemente a superação veio rápido demais. Dennis também poderia ser um perfil mais bem aproveitado. Seu jeitinho certinho contrasta com o estilo largado de Sam, mas como já convivem há algum tempo juntos é compreensível que tenham chegado a um equilíbrio de tolerância. O que beneficiaria o papel de Jaeger é que poderia surgir a dúvida de que a tal conta misteriosa de Grady seria proveniente de desvios já que eles eram sócios em uma empresa de equipamentos de pesca.
Para não deixar o terreno livre à Fritz, que repete macetes de outros conquistadores que se apoiam na beleza, Dennis também poderia se envolver com a mocinha, algo até ensaiado a certa altura em uma rápida citação, mas tão mal inserido que não tem serventia alguma, exceto causar a necessária ruptura do casal principal para em poucos minutos haver a reconciliação. E não se pode ignorar a participação de Fiona Shaw como a Sra. Douglas, mais um bom argumento desperdiçado. Como toda a mãe, ela não acredita que Grady pudesse ter uma vida dupla e se recusa a aceitar que tem um neto bastardo, o que poderia ampliar as possibilidades para o desenvolvimento dos papéis de Garner, Lewis e até mesmo de Olyphant. Todavia, as intenções da cineasta realmente não era cair no dramalhão e sim caminhar na linha tênue entre o chororô e romantismo açucarado. Simplesmente quis dar um tratamento sem glamour a histórias cotidianas vividas por pessoas comuns, mas é certo que o título Pegar e Largar faz sentido. A introdução um pouco incomum para um romance é um convite ao espectador abraçar o filme ou abandoná-lo.
Romance - 111 min - 2006
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