Nota 7,0 Milionário vê seu mundo perfeito ruir quando seus segredos obscuros ameaçam vir a tona
Dinheiro não é tudo, pois mesmo milionário é impossível se comprar a plena felicidade. Pensamentos do tipo são muito bonitos, mas o fato é que o dinheiro pode não comprar a felicidade diretamente, mas é com ele que conseguimos alguns bens materiais que possam nos levar a satisfação esperada. Não adiante querer viver na utopia do sobreviver apenas com o necessário. Vivemos em um mundo capitalista e egoísta que nos força a desejar sempre ter mais do que precisamos. Quem já é rico também deseja ter sempre mais, porém, a ganância pode trazer consequências. Filmes como A Negociação abordam a relação das pessoas que lidam diretamente com a falência econômica e que consequentemente adquirem problemas para suas vidas pessoais, afinal quem passou anos a base de champanhe nem em sonho quer sentir o sabor de cidra barata. Na trama escrita por Nicholas Jarecki, também estreando como diretor, Richard Gere dá vida a Robert Miller, um charmoso e perspicaz milionário que está prestes a vender sua empresa de investimentos para um renomado banco, mas precisa fazer essa transação o mais rápido possível para evitar que uma fraude realizada por ele mesmo seja descoberta.
Miller justifica que já trabalhou muito e agora que já é um sessentão quer recuperar o tempo que perdeu no escritório e em viagens de trabalho dedicando-se mais a sua família, a desculpa de praxe dos homens de meia-idade que percebem que a vida passa rápido tardiamente. Logo no início nos deparamos com uma cena que evoca a vida perfeita do magnata em meio a seus familiares para comemorar seu aniversário, mas ele acaba abandonando a festa antes do fim por conta de problemas urgentes a serem resolvidos em seu escritório. Ellen (Susan Sarandon), sua esposa e responsável pelas ações filantrópicas da empresa, mostra-se compreensiva e se despede carinhosamente deixando latente que existe amor neste relacionamento mesmo após tantos anos de união. No entanto, o executivo mentiu e está a caminho da casa da amante Julie Côte (Laetitia Casta), uma artista plástica francesa que lhe cobra mais atenção. Tentando compensar sua ausência, o milionário chega ao ponto de arrematar várias de suas telas para alavancar a futura exposição da moça, mas para ela o amor vem em primeiro lugar e não o sucesso profissional. Assim, ele a convida para uma rápida viagem que acaba sendo o ponto inicial da ruína de sua vida invejável. Eles sofrem um grave acidente de carro no qual a moça vem a falecer e no desespero o empresário abandona o local do acidente. Neste caso seu lado estrategista falhou. Ele não tinha intenções de matar a amante, foi uma fatalidade na qual sua entrega e depoimento espontâneos para a polícia poderiam abrandar consideravelmente sua punição, mas e como ficaria sua imagem de chefe de família exemplar?
Na tentativa de desassociar completamente seu nome do episódio, Miller foge do local com a ajuda do filho de um antigo parceiro de negócios, Jimmy Grant (Nate Parker), a quem acaba envolvendo no caso tornando-o um suspeito em potencial. Sem saber que estava ajudando um conhecido de longa data em uma fuga, o rapaz pode pegar dez anos de cadeia. No entanto o experiente detetive Michael Bryer (Tim Roth) não compra tal história logo de cara e decide investigar mais a fundo o episódio acreditando que há indícios que possam ligar o empresário a morte de Julie. Curiosamente, o homem da lei no caso também não tem um caráter dos mais credenciáveis, percepção reforçada pelo seu jeito desleixado de se comportar, assim não servindo como um contraponto a suposta imoralidade do protagonista. Aliás, até Ellen e Grant também não estão imunes a julgamentos. Os personagens em geral parecem colocar os seus próprios interesses na frente dos outros, mostrando o quanto a sociedade está corrompida e individualista. Nem mesmo Brooke (Brit Marling), filha do empresário, escaparia de ser prejudicada caso os segredos do pai viessem a tona. Uma das executivas da empresa, talvez ela seja a personagem mais honesta do longa e já demonstrava desconforto ao saber dos planos de venda do negócio familiar, mas ao descobrir as falcatruas se vê obrigada a confrontar o pai, o que gera uma reviravolta no final, momento para Sarandon finalmente mostrar sua competência.
A relação entre Miller e Ellen não recebe muita atenção pelo roteiro propositalmente. Como a maioria dos casais de meia-idade, infelizmente, eles acostumaram-se com a rotina de limitar-se a conversas sobre assuntos cotidianos, mas ainda assim a esposa demonstra-se dedicada e ligeiramente distante dos problemas do marido. Como depende dele para viver, inclusive suas atividades profissionais, Ellen acabou se tornando submissa, mas é óbvio que ela terá seu momento de virar o jogo e encurralar o marido na parede. Não estraga surpresa alguma saber isso, afinal é a intensidade das interpretações que segura a atenção dos espectadores, principalmente quando os personagens se confrontam verbalmente tentando defender suas verdades. Gere deixa transparecer com naturalidade os sentimentos de desespero e angústia de Miller quando se vê em um emaranhado de problemas. Cínico, amoroso, sedutor, estrategista e persuasivo. O protagonista possui uma personalidade multifacetada como se fosse um camaleão que se transforma para se adequar a cada tipo de situação. Indicado ao Globo de Ouro pelo papel, o ator constrói um personagem totalmente crível a ponto de fazer com que o espectador não se preocupe em saber qual será seu desfecho, mas sim levado a refletir sobre como agiria se estivesse vivenciando a mesma situação. Falar a verdade e destruir sua imagem? Levar a mentira adiante e fazer mal a inocentes? É uma situação difícil até para quem assiste julgar, afinal não há mocinhos e vilões, todos erram tentando fazer o bem, mesmo que esse benefício seja apenas para si mesmo.
Da forma como Jarecki constrói seu protagonista percebemos que ele se preocupa apenas com a preservação de imagem e bens materiais, assim é interessante observar como o diretor passeia com sua câmera pelas fachadas de ostensivos edifícios e busca superfícies reflexivas para captar belas imagens, como aquelas geralmente vistas em propagandas de automóveis que vendem a ideia de superioridade para aqueles que têm posses. Os cenários e a fotografia estilosos e contemporâneos também realçam a beleza do mundo habitado por Miller onde o status quo é de suma importância. Com uma trama de fácil envolvimento, A Negociação consegue aproximar o público dos conflitos financeiros de forma suave e o fato de ter o carismático Gere a frente da produção colabora para que quem assista fique na dúvida se toma ou não partido. A ambiguidade de sentimentos que a produção desperta é seu grande diferencial.
Drama - 100 min - 2012
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