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quinta-feira, 1 de setembro de 2016

O MÁSKARA

NOTA 9,0

Com narrativa ágil e divertida,
efeitos especiais caprichados e
protagonista cativante, longa é do
tipo atemporal, sempre vale a pena
Um astro de cinema famoso costuma atrair multidões aos cinemas, tal fato já nem nos surpreende mais, mas como explicar que um desconhecido tenha atraído milhares de pessoas em uma época em que a internet ainda era quase um embrião em gestação? Pois é, a repercussão de O Máskara é um caso a ser estudado. Primeiro trabalho de grande destaque de Jim Carrey, esta comédia surgiu de maneira despretensiosa, mas uma soma de fatores positivos colaborou para o seu sucesso instantâneo, como a aposta em piadas leves e efeitos especiais de ponta para contar a história do homem-borracha. Ele não é um super-herói, pelo menos não se assemelha nem um pouco com a figura clássica de protetor que conhecemos, aqueles com uniforme, capa e escudo de identificação no peito. Nosso amigo tem rosto verde, assim como sua cabeça desprovida de cabelos, e seu traje mais comum é um terno amarelo-ovo. Bem, esse é seu visual clássico, mas ele pode fazer uma infinidade de mudanças de figurinos e até alterar seu corpo e face em questão de segundos. O diretor Chuck Russell, cujos trabalhos de maior destaque até então eram A Hora do Pesadelo 3 e a refilmagem de A Bolha Assassina, foi incumbido de comandar a adaptação de uma HQ homônima dos anos 80 criada por John Arcudi e Doug Mahnke. Inicialmente planejado como uma fita de terror, respeitando a personalidade vingativa e cruel do personagem original, felizmente os produtores foram visionários e acharam melhor aproveitar o fato de que as histórias em quadrinhos que serviram de inspiração eram praticamente desconhecidas e mudar o caráter do protagonista, injetando humor e sarcasmo em sua personalidade. O roteirista Mike Werb baseou-se em diversas situações saída dos gibis, porém, atenuou a violência e deixou a criatividade falar mais alto como forma de agradar a um público mais amplo, desde crianças pequenas até idosos. A trama se passa em Edge City, região agitada dos EUA, onde vive Stanley Ipkiss (Carrey), um sujeito pacato que trabalha como bancário, mas um tanto tímido e atrapalhado, tendo como única companhia fiel seu cãozinho Milo. Ele está acostumado que seu cotidiano seja uma sucessão de equívocos, mas certo dia ele não devia nem ter se levantado da cama. Após muitos eventos que o deixaram triste, a noite ele encontra por acaso uma estranha máscara, mas nem desconfia de suas origens e histórico.

Pertencente a Loki, um deus escandinavo, esta antiga máscara viking dá poderes especiais a quem usá-la, porém, é preciso sabedoria para usufruir desse dom. Stanley a leva para casa e por brincadeira resolve experimentá-la. Imediatamente ele vira literalmente outra pessoa, um homem ousado e divertido com coragem suficiente para fazer tudo aquilo que o bancário nem sonhava em um dia realizar, inclusive se meter em situações que o colocam em saia justa com a polícia e com criminosos. Muito brincalhão, literalmente ele sempre tem um truque nas mangas para se safar de situações de perigo e dar uma boa lição a quem merece, mas talvez seja um equívoco classificá-lo como um super-herói. Na realidade esse cara, logo apelidado de Máskara, está mais a fim de se divertir e satisfazer suas próprias vontades. Qualquer bandido que porventura seja vítima de alguma de suas travessuras é pura coincidência. Certa noite, ele resolve ir se divertir em uma danceteria e acaba entrando em uma enrascada ao flertar com a cantora e dançarina Tina Carlyle (Cameron Diaz), a namorada do gângster Dorian Tyrrell (Peter Greene), este que, além de não perder sua garota, também quer usufruir dos poderes da tal máscara assim que toma conhecimento de sua existência, pois quer se tornar o chefão do submundo. Em síntese, o roteiro é bastante simples, porém, a forma como ele é desenvolvido faz toda a diferença. É difícil apontar falhas em uma trama completamente surreal. O que poderia ser uma cena equivocada (se é que tem alguma) no final das contas acaba se encaixando perfeitamente à narrativa que equilibra com eficiência aventura e humor, sobrando muitas brincadeiras com o próprio cinema, inclusive até a cerimônia do Oscar é lembrada. É incrível como embarcamos suavemente nesta fantasia que em seus cenários, figurinos, efeitos sonoros e forma de edição deixam evidente a inspiração em desenhos animados feitos para a TV, como “Pica-Pau”, “Pernalonga” ou “Tom e Jerry”, por exemplo. Por isso não estranhamos cenas como a que o Máskara coloca uma trupe de policiais para dançar ritmos latinos, as inúmeras vezes que seu corpo elástico é violentado retornando ao estado perfeito instantaneamente ou ainda a super velocidade com a qual ele se movimenta ou conversa. Tal qual em uma animação, tudo aqui é possível.

Sem ter um personagem principal famoso até então, mas com as intenções de transformá-lo em um ícone pop instantâneo, é claro que os efeitos especiais apresentados em trailers e propagandas de TV foram os responsáveis por boa parte do sucesso da produção. Nunca antes haviam sido utilizadas trucagens visuais tão avançadas a favor de uma comédia e o que havia de mais moderno nessa área na época foi empregado para transformar Carrey em um sujeito que realmente passa a impressão de ser feito de borracha. Para tanto, o ator passava cerca de cinco horas diárias sendo maquiado de forma que todas as partes móveis de seu rosto fossem destacadas e aí sim a computação entrava em cena para complementar o serviço já que grande parte das cenas o próprio intérprete se encarregou de fazer aproveitando-se de suas naturais maleabilidades corporais e faciais. Contudo, durante as filmagens diversos programas de computador foram criados para auxiliar na pós-produção, o que implicou em os atores atuarem boa parte do tempo usando a imaginação para contracenarem com o vazio ou com objetos e cenários que depois seriam trocados digitalmente. Graças a esta comédia, muitos filmes seguintes puderam usufruir de recursos tecnológicos sem os quais não poderiam ser realizados, além é claro de ela ter aberto caminho para que outras adaptações de HQ desconhecidas ganhassem as telonas, embora nenhuma tenha repetido o sucesso de O Máskara, até hoje considerado um dos maiores sucessos da carreira de Carrey que viu da noite para o dia sua conta bancária transbordar e os convites para novos trabalhos multiplicarem-se. É praticamente impossível imaginar outro ator para o papel, aliás, vivendo duas personalidades distintas em um mesmo corpo, equilibrando-se entre a seriedade de Stanley e a loucura contagiante do Máskara. Se suas caretas e expressões corporais tão conhecidas incomodarem em seus projetos seguintes, aqui elas foram essenciais, afinal atazanar as pessoas com suas piadas e seu pique incansável é a grande arma do protagonista. No conjunto, misturando vários estilos, desde ação até filmes noir, esta comédia emblemática dos anos 90 que marcou e ainda marca a infância de muita gente é daquelas que literalmente não cansamos de ver e rever quantas vezes pintar vontade. Curiosamente, frustrando expectativas, uma sequência só chegou a ser lançada após mais de uma década de espera, sem Carrey no elenco e, diga-se de passagem, com roteiro e qualidade técnica muito inferiores.

Comédia - 97 min - 1994

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