NOTA 7,0 Drama é uma eficiente reunião de clichês adornados por bela trilha sonora e interpretações sinceras |
É curioso como o público se
comporta em relação aos títulos indicados a prêmios, principalmente ao Oscar.
Há anos os títulos mais badalados da festa da Academia de Cinema de Hollywood
não conquistam bilheterias e repercussões estarrecedoras, aliás, a maioria,
incluindo os vencedores da categoria de Melhor Filme, é esquecida rapidamente.
Na contramão deste desinteresse, algumas produções que concorrem em menos
categorias, geralmente os prêmios “menores”, acabam alcançando resultados muito
superiores, principalmente quando são representantes do gênero drama. O Som
do Coração é um bom exemplo desta tendência. Apreciado pelo público, mas rejeitado pela maioria dos críticos por considerarem
uma história repleta de clichês e desnecessária, o longa era um dos cavaleiros
solitários do Oscar 2008. Concorrendo apenas ao prêmio de Melhor Canção, a
produção não levou a estatueta, mas ainda assim saiu vitoriosa da premiação
consagrando-se como a obra de maior e melhor repercussão entre os espectadores
comuns daquela safra e até hoje é um dos títulos líderes de procura para
locação e venda. Ele faz parte de um seleto grupo de filmes que todos os anos é
ampliado com o lançamento de pelo menos mais um expoente que chega tímido às
premiações, mas surpreende e se torna tão ou mais famoso que os grandes
vencedores da temporada. A história é muito simples e não esconde o objetivo de
querer emocionar o espectador do início ao fim, tanto é que o protagonista é
uma criança, artifício infalível para tocar os corações das platéias. Evan
(Freddie Highmore) foi criado em um orfanato e possui um dom especial para
lidar com música que impressiona a todos. Tal habilidade está em sua genética.
Ele é filho da violoncelista Lyla Novacek (Keri Russell) e do roqueiro Louis
Connelly (Jonathan Rhys Meyers), porém, nunca os conheceu. O casal se apaixonou
a primeira vista, tiveram uma bela noite de amor, mas logo em seguida o romance
foi interrompido pelos pais da moça. Cada um seguiu seu caminho, mas jamais conseguiram
se esquecer um do outro. Alguns meses depois da separação, Lyla deu a luz a um
garoto, mas seu pai o entregou à adoção sem nem ao menos deixar a moça conhecer
o filho dizendo que o bebê morreu no parto. Assim, a moça caiu em depressão e
passou a apenas dar aulas de música enquanto longe dela seu grande amor, que
não sabia da gravidez, também desistiu de tocar com sua banda
Evan nunca perdeu as esperanças de encontrar seus pais. Mesmo sem
informações relevantes sobre eles, o garoto toma coragem e foge do abrigo em
que vive para seguir rumo a Nova York. Na cidade grande e agitada ele acaba
conhecendo Wizard (Robin Willians), ou simplesmente O Mago, um homem que vive
de explorar o talento musical de menores e que decide investir neste seu novo
achado. O garoto é rebatizado de August Rush para causar mais impacto e parece
ter um futuro promissor na carreira musical, mas a música também será
imprescindível para a sua vida pessoal afinal ela própria é que vai se
encarregar de unir o destino desta criança com os de seus pais. Justamente pelo
eminente final feliz indicado por situações previsíveis e esquemáticas, este
filme não ganhou a atenção da crítica, mas no boca-a-boca fez sua fama fácil e
rapidamente. Baseada em uma história de Paul Castro e Nick Castle, com roteiro
do próprio Castle em pareceria com James V. Hart, obviamente este não é um
drama feito para aqueles que gostam de quebrar a cabeça para compreender uma narrativa
ou que apreciam acompanhar personagens em longos momentos de contemplação ou
lamento. Simplesmente é uma obra assumidamente piegas feita para agradar os
espectadores que gostam de filmes convencionais e buscam mensagens positivas neles,
algo bem no estilo sessão da tarde. Por mais raso que seja o enredo e seu
desenvolvimento, de certa forma é um trabalho que oferece um sopro de esperança
para aqueles que estão entristecidos e obviamente é uma excelente desculpa para
reunir a família em torno da TV e fortalecer estes laços. Um pouco mais de
empenho na construção do roteiro para alinhavar as situações poderia ter
elevado esta obra a um patamar mais confortável. As quase duas horas de duração
são bem recheadas, sem o famoso "encher linguiça", mas é nítido que
algumas passagens são rápidas demais, como o envolvimento relâmpago do jovem casal
de músicos, e outras inverossímeis, como o fato de uma criança ser aceita em
uma conceituada escola de música até chegar a ter a honra de reger uma
orquestra. Mas esses são detalhes mínimos quando a atenção e o coração já foram
fisgados, principalmente pela atuação sincera e vigorosa do menino prodígio
Highmore que deixa transparecer em seus olhos claros o fascínio de seu
personagem pelas melodias.
A diretora irlandesa Kirsten
Sheridan não arrisca muito em seu segundo trabalho no comando de longas-metragens,
mas o primeiro a ter distribuição mundial. Ela usa a câmera de maneira comum e
em alguns momentos usa ângulos que se casam perfeitamente com os momentos mais
estridentes da trilha sonora, esta sem dúvida bem empregada e responsável por
momentos marcantes. As vezes temos até a impressão de que as cenas forma
construídas em razão da existência das músicas tamanha a sintonia entre o
aspecto visual e o sonoro da produção. É impossível não se lembrar do talentoso
Rhys Meyers soltando a voz ao som de uma balada romântica ou se emocionar com
uma garotinha cantando uma bela canção com o coral da igreja justamente na hora
em que August está precisando de uma palavra de apoio para ter forças para ir
atrás da realização do grande sonho de sua vida. Aliás, não menosprezando o
trabalho dos atores, valendo um destaque especial para Robin Willians que aqui
está menos caricato que de costume e até deixa no ar uma dúvida se ele é do bem
ou do mal, o personagem principal deste longa é sem dúvida a música. Ela está
presente todo o tempo e qualquer barulho por menor que seja é transformado em
melodia. A crítica e os mais intelectuais podem dizer até hoje que O Som do Coração é
piegas e totalmente esquecível, mas para a faixa de público a quem esta obra se
destina é uma opção excelente, contando com romantismo, simplicidade e certa
ingenuidade uma história que reforça a importância dos laços de amizade e
familiares, mesmo que tais pessoas estejam distantes, e obviamente o quanto é
preciso acreditar e lutar por nossos sonhos. Esta é a prova que uma sinopse
envolvente, atores competentes e até mesmo uma direção um tanto convencional
são os ingredientes suficientes para uma produção de sucesso, além é claro de
ser mais um exemplo de trabalho que carrega a essência do cinema independente,
porém, que dialoga perfeitamente também com o estilo comercial. A trama batida
e manjada torna-se tão gostosa quanto uma receita que mesmo estando cansados de
saber o sabor não resistimos em provar mais e mais. Se você é do tipo durão,
que não dá o braço a torcer e foge de títulos melosos e com a palavra coração,
permita-se a viver essa experiência que renova as esperanças de qualquer um. Aproveite
e inspire-se para conquistar seus objetivos e repensar seu relacionamento com
as pessoas que lhe cercam.
Drama - 113 min - 2007
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