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terça-feira, 17 de novembro de 2015

A MÃO DO DIABO

NOTA 7,0

Bill Paxton dirige e atua em
suspense à moda antiga sem
usar violência explícita, mas
a obra carece de um clímax
É curioso como funciona o “star-system” de Hollywwod. Enquanto algumas figuras viram estreladas aplaudidas e elogiadas da noite para o dia, outras batalham durante anos e as vezes chegam ao fim da carreira sem o devido reconhecimento. Por exemplo, se você é realmente ligado em cinema já deve ter ouvido falar em Bill Paxton, certo? Opa, claro ele fez aquele filme... Aquele... Empacou? Sim, ele é aquele cara que participou de Apollo 13, Titanic, U-571 entre outras dezenas de produções e até perdeu o posto de protagonista em Twistter para os tornados. Realmente o nome deste ator não é um chamariz de público, porém, sua filmografia é bem interessante e foi enriquecida quando ele experimentou a carreira de diretor. Sua estreia no cargo ocorreu em 1982, mas não deve ter sido uma boa experiência afinal de contas ele demorou quase duas décadas para repeti-la. Sendo assim, podemos considerar que ele praticamente iniciou sua carreira na direção de longas-metragens com A Mão do Diabo, um suspense digno de elogios, mas é uma pena que até hoje poucos deram bola à essa obra. É muito raro que alguém consiga se dar bem logo em seus primeiros trabalhos atrás das câmeras, ainda mais explorando um combalido gênero, mas Paxton surpreende com uma direção segura e inesperada. A atmosfera que ele criou consegue ser tensa e ao mesmo tempo melancólica e sua narrativa comunica-se perfeitamente com as plateias contemporâneas ainda que preservando um delicioso resquício de nostalgia impresso no ritmo e no visual. O diretor também acerta ao não se entregar ao vício desse tipo de produção e carregar seu trabalho com tintas escuras. As cenas mantêm um clima obscuro até mesmo quando realizadas sob forte luz solar, graças também a escolha de locações e cenários que transmitem a perfeita sensação de isolamento geográfico no qual os protagonistas se encontram. O roteiro do estreante Brent Hanley não é fácil, exige muita atenção aos detalhes e traz a tona um tema polêmico: o poder de uma crença sobre uma pessoa sugestionável. A trama já começa de forma intrigante. No Texas, um homem procura o escritório do FBI afirmando que tem informações a revelar sobre o serial Killer conhecido como “Mão de Deus” e exige falar com o investigador Wesley Doyle (Powers Boothe). Fenton Meiks (Matthew McConaughey) diz que descobriu que seu próprio irmão mais novo, Adam (Levi Kreis), é o tal assassino e que a pouco ele cometeu suicídio. Como o rapaz chegou aparentando estar perturbado, no início sua história parece insana, mas o agente decide continuar ouvindo seus relatos. A partir de então, através de flashbacks, Fenton passa a narrar as tristes e trágicas lembranças que marcaram a sua infância.

Certo dia, após ter uma suposta visão divina, seu pai (vivido pelo próprio Paxton e cujo nome não é revelado), resolve seguir as ordens enviadas e começa a caçar e a matar os demônios que estão vagando pela região em que vivem disfarçadas como seres humanos normais, mas todos pecadores. Ainda crianças, Fenton e Adam (interpretados nesta fase respectivamente por Matthew O’Leary e Jeremy Sumpter) passam a presenciar o estranho comportamento do pai que parece outra pessoa quando recebe as tais missões, tomando algumas atitudes que os impactam negativamente e que não lembravam em nada o homem amoroso e prestativo que os criava até então.  O senhor Meiks começa a sequestrar pessoas que supostamente estariam em uma lista repassada pelo anjo mensageiro. O filho mais velho se desespera com o estado de seu pai enquanto o mais novo também demonstra acreditar nas mensagens do anjo. São visões antagônicas de uma mesma pessoa. Enquanto um vê o pai como uma ameaça o outro o enxerga como um grande herói. A narrativa passa a se desenrolar investindo em uma tensão crescente, porém, jamais atingindo um satisfatório clímax. Contudo, é louvável que a obra consiga deixar os espectadores roendo as unhas sem apelar para cenas de violência e sanguinolência explícita, embora os dois garotos presenciem por várias vezes o pai executando com um machado as pessoas que ele julga demônios. Os cortes jamais são apresentados. Paxton, lembrando em alguns momentos a interpretação de Jack Nicholson no clássico O Iluminado, preferiu causar tensão utilizando recursos de câmera e efeitos sonoros e de edição precisos para causar o impacto necessário para demarcar as execuções.  À medida que esse homem começa a delegar as missões divinas também aos filhos, seu primogênito se revolta e o pai no ápice da loucura o aprisiona em um porão que fez o próprio menino cavar acreditando que ele também pode ser um dos demônios que ele precisa destruir. Dá para perceber que este não é um filme de terror como o título pode sugerir, sendo legitimamente um suspense com características que nos remetem, guardadas as devidas proporções, a obras do mestre Alfred Htichcock e até mesmo do outrora cultuado M. Night Shymalan afinal de contas a conclusão faz com que o espectador relembre os detalhes ou até mesmo queira assistir mais uma vez o filme para juntar as peças necessárias para uma melhor compreensão. Logo nos primeiros minutos, por exemplo, já temos pistas importantíssimas e o espectador se sente instigado a acompanhar a história e pode até se surpreender porque embora o nome de McConaughey seja usado como chamariz, quem carrega o filme é a o intérprete da sua versão pré-adolescente. Aliás, os dois jovens atores que vivem Fenton e Adam conseguiram atuações invejáveis e encararam cenas muito difíceis.

Embora não exiba cenas de violência explícita, o longa é carregado de dramaticidade e pressão psicológica, o que para alguns é um ponto negativo pelo fato da produção envolver ativamente menores de idade. Contudo, os garotos parecem tão imersos neste tenso universo que as vezes até esquecemos de suas reais idades e enxergamos dois atores maduros em cena. Isso se deve não apenas ao talento de ambos, mas também a sensibilidade de Paxton para conduzi-los e aos diálogos e cenas espertas criadas por Hanley que construiu um roteiro enxuto e eficiente que se equilibra entre os alicerces dos gêneros policial e suspense. A trama da investigação pelo FBI ocupa pouco tempo do longa, mas é de suma importância afinal abre e fecha o trabalho. Você deve estar se perguntando por que um filme aparentemente repleto de qualidades passou em brancas nuvens na época de seu lançamento e hoje deve estar juntando poeira em prateleiras de locadoras. A Mão do Diabo realmente é dotado de muitos pontos positivos, valendo-se principalmente pelas opções estéticas escolhidas, porém, como já dito, a ausência de um clímax narrativo faz os ânimos do espectador esfriarem partindo assim rumo a conclusão sem grandes expectativas.  Era preciso uma cena forte e impactante entre os flashbacks para prender ainda mais a atenção do público, mas Paxton neste caso arriscou uma trucagem. As várias cenas de mortes são apresentadas de forma escamoteada e a câmera procura focar as reações de Adam e Fenton diante de tais atrocidade, mas na conclusão todas estas sequências são reapresentadas sob uma nova e reveladora perspectiva. Dessa forma, o grande problema da fita provavelmente é a falta de ousadia ou de foco. Trabalha com um viés psicológico, mas não o aprofunda, assim como também lança questões sobre o fanatismo religioso, todavia, sem se posicionar entre a verdade ou a mentira a respeito dos escolhidos por Deus para realizar missões na Terra. Deixando essa pegada intelectual de lado, eis aqui uma produção que entretém com qualidade e que merece ser descoberta pelo menos para se fazer uma desintoxicação mental leve afinal a virose de suspenses ruins e repetitivos é um problema crônico. Prestigiar aqueles que tentam fazer a diferença vale a pena. 

Suspense - 100 min - 2001

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