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terça-feira, 1 de dezembro de 2015

BRILHO ETERNO DE UMA MENTE SEM LEMBRANÇAS

NOTA 9,0

Jim Carrey mais uma vez
prova que tem talento para o
drama em história que
mescla realidade e sonhos
Muita gente tem implicância com determinados artistas e por nada desse mundo dão o braço a torcer e assistem alguns filmes de seus desafetos, mesmo que eles sejam premiados e elogiados. Jim Carrey é um ator que sofre com isso até hoje. Sinônimo de comédia besteirol, ele surgiu para o grande público atingindo sucesso imediato em O Máskara, mas se suas caras e bocas funcionaram perfeitamente nesse trabalho o mesmo não se pode dizer em tantos outros. Querendo se livrar do estigma do homem de um papel só, no final da década de 1990 ele passou a explorar o gênero dramático com êxito, mas ainda assim muitos duvidam até hoje de sua capacidade e talento. Uma pena. Unindo drama com pitadas de humor, ele encontrou um personagem perfeito para expor toda sua capacidade de interpretação em Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças, uma ótima opção para aqueles que ao menos querem tentar mudar sua visão sobre o astro. Se um filme tem o poder de fazer uma pessoa rever seus conceitos tamanho seu impacto, aqui temos esta sensação em dose dupla. Além de enxergar um intérprete de primeira em Carrey, o próprio enredo pode transformar a vida de quem o assiste. A história começa nos apresentando o casal formado por Joel (Jim Carrey) e Clementine (Kate Winslet), dois indivíduos que tentaram de tudo para fazer a relação dar certo até que a moça se desiludiu de vez e resolveu se submeter a um tratamento experimental que retira da memória os momentos indesejáveis. Assim ela tomou a decisão de esquecer tudo que viveu com seu parceiro e sequer saber que um dia o conheceu. Desesperado com o desprezo da mulher que ama, Joel resolve procurar o Dr. Howard Mierzwaik (Tom Wilkinson) e se submeter ao mesmo tratamento de memória seletiva, porém, não tem coragem e durante a operação recorda os motivos que o levaram a se apaixonar por Clementine. Graças as confusões que ocorrem devido a interrupção repentina do tratamento as imagens desta mulher acabam sendo realocadas em lembranças do rapaz nas quais ela não estava presente originalmente.

O roteiro maluquinho é da mente criativa do cultuado roteirista Charlie Kaufman, o mesmo que escreveu os elogiados Quero Ser John Malkovich, Adaptação e Confissões de Uma Mente Perigosa. Geralmente a responsabilidade de um filme é creditada a seu diretor, mas este é um dos raros casos em que o escritor se sobressai, embora ele nem se arrisque a manejar a câmera. O reconhecimento é merecido, afinal até um filme mudo depende de uma história para existir. A popularidade de Kaufman, praticamente uma grife sinônimo de boas produções, não parece ter ofendido o cineasta francês Michel Gondry que viu seu longa frequentar as principais lista de melhores filmes e premiações da temporada de 2005 e até hoje é um título muito cultuado e que desperta curiosidades. O entrosamento entre os dois se deve ao fato deles já terem trabalhados juntos no pouco visto A Natureza Quase Humana. Ainda bem que eles não desistiram e seguiram suas carreiras. Pela sinopse, muitos devem achar que o roteiro deve ser mais uma daquelas intricadas histórias feitas para agradar intelectuais, mas deve se surpreender positivamente quem se der ao direito de acompanhar essa viagem pela mente de um homem apaixonado. A grande dica para acompanhar esta obra é prestar atenção, requisito que deveria ser básico para qualquer filme. As idas e vindas de tempo, ora exibindo situações do passado e ora do presente, podem confundir os mais desatentos, mas é justamente fazer os espectadores pensarem o objetivo de tal narrativa não linear de forma que cada um possa compreender a trama de uma maneira particular. Na realidade isso não é nenhuma maluquice. Qualquer filme, do mais convencional até o mais inovador, será compreendido de um jeito diferente por cada indivíduo. Isso varia de acordo com a bagagem cultural e sentimental que carregamos, mas é certo que algumas produções nos instigam a procurar dentro de nós mesmo elementos de identificação e compreensão, o que deixa a experiência cinematográfica muito mais gratificante e marcante.

Existem filmes que são difíceis de catalogar em um gênero específico e este é um deles. O material de divulgação o vende como um drama. Outros acham muito mais puxado para a comédia enquanto alguns defendem como uma ficção científica. O correto seria enquadrá-lo na categoria inovador ou de vanguarda, o que não é convencional infelizmente. Só assim para definir um enredo que emociona, diverte e, principalmente, nos faz pensar, ainda mais quando uma reviravolta transforma literalmente o longa, forçando o espectador a ficar ligado em todos os detalhes. Colabora para facilitar a compreensão a integração de todos os personagens com a situação dos protagonistas, assim evitando subtramas desnecessárias e coadjuvantes sem funções. Aliás, com um elenco estrelado em mãos seria até um pecado desperdiçá-lo. Mark Ruffalo, Kirsten Dunst e Elijah Wood aceitaram atuar por salários inferiores aos que estão acostumados não por amor a arte ou ao menos não só por isso. Trabalhar em projetos de diretores e roteiristas consagrados e aceitar papéis e enredos aos quais não estão acostumados dão certo status ao currículo dos intérpretes. Vale ressaltar também o apuro técnico da produção, principalmente a fotografia e a curiosa utilização de efeitos especiais perfeitamente encaixados na narrativa que ainda é valorizada pela trilha sonora e montagem, embora algumas cenas mais longas e a repetição de certas ideias sejam desnecessárias, mas nada que estrague o brilho de Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças (desculpe a redundância), um sopro de esperança para o apático cenário que encontramos no campo do romantismo no cinema. Obviamente, este filme não é destinado àqueles que somente gostam de produções que sem mesmo ver uma única cena já matamos o final e muito menos para quem não gosta de pensar. O próprio título instigante da obra já dá o recado e as vezes é até melhor curti-lo sozinho do que acompanhado de pessoas que possivelmente farão cara de paisagem da primeira a última cena. Aliás, dá até para fazer um trocadilho entre o enredo com o popular ditado antes só do que mal acompanhado. Se o importante é aproveitar os bons momentos próximos da pessoa amada e esquecer a obsessão pelo felizes para sempre aí vai uma frase a ser seguida: antes só com suas boas lembranças do que mal acompanhado na realidade.

Vencedor do Oscar de roteiro original

Drama - 108 min - 2004

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