NOTA 5,5 Com pretensões de explicar o passado de Leatherface, longa é apenas uma desculpa para um show de carnificina e tortura |
Em 1974, o cineasta Tobe Hooper pegou de surpresa o público com um filme
chocante. Um grupo de jovens perdido em uma região afastada passa a ser atacado
por um assassino cruel que mutila suas vítimas com a ajuda de uma serra
elétrica. Quem ouviu o ruído na época até hoje sente calafrios na espinha, até
porque O Massacre da Serra Elétrica
não era um simples filme de terror sobre um serial killer, mas continha
críticas ácidas à Guerra do Vietnã (servindo a mensagem para outros conflitos)
e espetadas ao comportamento das sociedades da época como na antológica cena do
jantar antropofágico. A ideia era criticar a crueldade do ser humano, uma
variação do conflito entre civilização e barbárie, a soberania dos “homens de
bem” enfrentando a fúria e a loucura dos rejeitados. Com baixo orçamento e
direção e elenco amadores, o longa tornou-se um cult movie e ganhou algumas
continuações, uma inclusive equivocada do próprio Hooper achincalhando sua
obra, e em 2003 a produção ganhou um remake que não causou o mesmo impacto que
o original, mas pelo menos passou bem longe do lixo que muitos esperavam. Como
é de praxe no gênero do terror, não demorou muito e o assassino grandalhão e
desfigurado munido de sua moto-serra estava novamente em ação, mas desta vez em
uma produção que conta suas origens. Bem, pelo menos era essa intenção. O
Massacre da Serra Elétrica – O Início só por se tratar de um prequel
(filme que mostra eventos anteriores ao da obra original) já nasceu
estigmatizado a ser criticado duramente, mas quem curte filmes do estilo
costuma aprovar o trabalho do diretor Jonathan Liebesman, do péssimo No Cair da Noite, que procurou ao máximo
ser fiel a atmosfera e a cadência de eventos do remake assinado por Marcus
Nispel. Pontinhos positivos pela lição de casa bem feita. Felizmente tais
opções salvaram o filme de ser um verdadeiro engodo. Sim, o longa pode não
cumprir satisfatoriamente seus reais objetivos, mas o show de carnificina
explícita está garantido. O início da
trama se passa no final da década de 1930 mostrando uma mulher grávida
trabalhando sob condições precárias em um abatedouro no Texas e é justamente
nesse lugar fétido que ela dá a luz ao seu filho e não resiste. A criança é
salva por Luda Mae Hewitt (Marietta Marich) e passa a ser criada também pelo
xerife Hoyt (R. Lee Ermey), Montgomery (Terrence Evans) e Henrietta (Kathy Lamkin), um grupo um tanto bizarro. Bem, criado é modo de falar, pois na verdade Thomas
Lewitt (Andrew Bryniarski) se tornou um adulto violento e irracional graças a
infância e a adolescência repletas de abusos emocionais e físicos que sofreu de
seus tutores, pessoas completamente doentias. O período de juventude do futuro
Leatherface (cara de couro, apelido em referência a máscara que ele comumente
utiliza para esconder suas deformidades faciais congênitas) não é apresentado,
sendo que a narrativa pula de seu nascimento já para sua fase adulta.
A primeira morte provocada por Leatherface ocorre dentro do próprio
abatedouro onde nasceu e frequentou assiduamente durante os seus trinta anos de
vida. A vigilância sanitária está fechando o estabelecimento e exige que Thomas,
então um funcionário do local, se retire, mas o grandalhão não dá ouvidos até
que um dos agentes passa a ofendê-lo e recebe como castigo uma morte a golpes
de marretadas. Em seguida, o roteiro de Sheldon Turner e David J. Schow segue o
caminho comum as produções sobre seriais killers. Somos apresentados ao grupo
de jovens que serão as vítimas do assassino que desta vez parece muito mais
sádico, influência direta das ações das pessoas que o criaram que também tem
uma participação mais ativa neste prequel. Dois jovens estão cruzando o estado do
Texas em companhia de suas namoradas, mas Dean (Taylor Handley), Bailey (Diora
Baird), Eric (Matt Bomer) e Chrissie (Jordana Brewster) acabam sofrendo um
acidente e ficam perdidos em lugar aparentemente deserto. Tal qual aconteceu
nos longas original e remake, o grupo é encontrado pelo xerife (que na
realidade roubou tal distintivo) e são levados para uma verdadeira sessão de
tortura. Somente Chrissie consegue se esconder, provavelmente por sua
intérprete ser o nome razoavelmente mais conhecido do elenco e, portanto,
alçada automaticamente ao posto de protagonista. Obviamente ela vai tentar
socorrer seus amigos e não escapará da demência de Leatherface e seu clã. Com a
saturação em que se encontra o subgênero do terror de slashers (outra alcunha
para seriais killers), é previsível que as mortes não assustem de maneira
satisfatória, até porque o barulho da serra já antecipa as ações, mas Liebesman
compensa caprichando na violência psicológica e no sadismo dos atos,
aproveitando o gancho de que a dupla de jovens rapazes estava a caminho do
Vietnã para lutarem na guerra, uma maneira de criar um vínculo entre o prequel
e o cenário histórico do longa setentista, mais uma boa sacada do diretor para
não fugir do contexto que cerca o mitológico assassino. Assim, o personagem de
R. Lee Ermey, revivendo seu papel no remake assim como outros membros da
família sádica, se diverte humilhando e literalmente esfolando suas vítimas tal
qual um sargento do exército. Apesar dos esforços para que o filme fosse
encarado com seriedade, contando inclusive com uma cenografia, maquiagem,
fotografia e ângulos de câmera bem interessantes e que deixam em evidência o
clima de desespero e desolação propícios à trama, é certo que a produção não
consegue ir além de uma desculpa para uma sequência de cenas de tortura e
sanguinolência. Até o jantar antropofágico da primeira versão foi adaptado.
Contudo, falhas e desvio de foco são pontos que depõem contra o filme.
A maior parte das cenas em que o clã tutor de Leatherface aparece tem um
equivocado tom de comédia. Em meio a tensão de estar recebendo um grupo de
estranhos em casa e sabendo com os homens da família são esquentadinhos, não é
muito crível que duas senhoras sentem-se tranquilamente a mesa da cozinha para
conversarem e tomarem um chá, por mais desequilibradas que sejam. Em outra
sequência, Leatherface é obrigado a amputar a perna ferida de Montgomery e eis
que o xerife tem a brilhante ideia de simplesmente limar com a outra que estava
em perfeito estado simplesmente para nivelar as coxas do homem. Sentiu o drama?
Além disso, temos alguns motoqueiros que entram na história só para aumentarem
as estatísticas de vítimas fatais, o loiro Dean faz jus as piadas a cor de seus
cabelos ao deixar passar a oportunidade matar Hoyt e Leatherface perde aos
olhos do público o pouco que tem de ser humano ao conseguir sair praticamente
sem um arranhão sequer das várias tentativas de ataque que sofre, lembrando que
as raízes e a história de vida do personagem têm muito mais a oferecer que a
maioria dos seriais killers que surgiram depois dele. Só para situar os
viajantes, o assassino em questão e seu universo macabro têm origens na
história real de Edward Theodore Gein, ou simplesmente Ed Gein, que foi julgado
no final dos anos 60 pela morte de duas mulheres, mas dizem que sua lista de
vítimas é bem maior. Os problemas psiquiátricos dele seriam frutos dos cuidados
exagerados de sua mãe, uma fanática religiosa que fazia o que podia para privar
os filhos de qualquer contato social. Com a sua morte, Gein sentiu-se
desamparado, enlouqueceu, teria matado o próprio irmão e então passou a
desenterrar corpos humanos e depois a caçar pessoas vivas, principalmente mulheres,
mutilá-las e guardar certas partes de seus corpos. Esta é uma das teorias que
teriam levado Hooper a criar a trama de massacre que chocou o público nos anos
70 e a mesma que teria inspirado a criação de outros lendários vilões
psicóticos tanto do cinema quanto da literatura. Como diz o ditado, quem conta
um conto aumenta um ponto, hoje é difícil dizer qual seria a inspiração real da
obra original e demais filmes oriundos, por isso não espere de O
Massacre da Serra Elétrica – O Início tal conclusão, até porque o
prequel, como já dito, desperdiça um período de vida crucial na definição da
personalidade de Leatherface preferindo partir logo para o que interessa ao seu
público-alvo. Uma pena. Foi jogada fora uma boa oportunidade para dar uma nova
imagem a um personagem que por mais amedrontador que seja fisicamente e em seus
atos com o tempo acabou virando uma figura de achincalhe. Assim, temos aqui um
produto que simplesmente dá uma repaginada a algo já pronto e aprovado e
ficamos na expectativa de saber quem será a próxima vítima e se sobrará alguém
para contar tal história bizarra. E o pior de tudo é chegar próximo do fim e
ainda não ter definido para quem vai a sua torcida: mocinhos ou vilões? Todos
são personagens nada carismáticos, mas ao menos a turma da pá virada nos
diverte com sua perversidade doentia.
Terror - 92 min - 2006
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