segunda-feira, 11 de setembro de 2017

PARANOIA AMERICANA

NOTA 6,5

Incentivado pelo ócio e pela mídia,
americano declara guerra a vizinho
árabe e sem perceber cai em uma
espiral de loucura que só o prejudica
Desde os ataques de 11 de setembro de 2001, os EUA entraram em uma nova era, um período marcado pela insegurança, suspeitas e aversão a estrangeiros, principalmente aqueles com traços de etnia árabe. O clima de tensão passava a ser observado diariamente em espaços públicos, como em aeroportos e shoppings centers que redobraram os cuidados com segurança, mas nestes casos ainda existe a justificativa de que isso é uma preocupação pelo bem social, regras básicas para uma sociedade se manter íntegra, ainda que em alguns casos as investigações sobre suspeitos foram absurdamente abusivas. E quando o pânico individual torna-se mais ameaçador que o medo coletivo, o que fazer? É sobre esse tema que se sustenta o suspense Paranoia Americana que procura retratar a situação psicológica dos norte-americanos diante do medo de novas ameaças. Se nem mesmo dois dos mais altos e pomposos edifícios do mundo escaparam de se tornar alvos fatais dos terroristas, episódio em que centenas de pessoas faleceram, o que impediria novos ataques a outros símbolos da soberania dos EUA ou até mesmo a violência em massa para atacar civis através de atos aparentemente inofensivos? Quem diria que uma simples carta poderia conter substâncias mortais? Não é coisa de cinema. O mundo todo já viveu esse período do pânico das correspondências adulteradas, assim o receio de que o perigo poderia estar em qualquer lugar realmente tornou-se algo perturbador e é por esse viés que segue a trama escrita por Andrew Joiner. O protagonista Terry Allen (Peter Krause) é o responsável por envolver o espectador em um crescente clima de tensão conforme ele abdica de seus interesses pessoais para tratar de uma especulação que se torna uma obsessão. Profissional da área de contabilidade, o rapaz acabou perdendo seu emprego por conta de um corte de gastos da empresa e isso dias antes de mais um aniversário da tragédia ocorrida com as Torres Gêmeas. Com a recessão do mercado ele não consegue emprego e com tempo livre de sobra acaba se entretendo com os inevitáveis noticiários a respeito de terrorismo afinal sempre existe o temor de que com a proximidade da fatídica data algo de ruim possa novamente acontecer. Morador de um condomínio de classe média, certo noite observando a vista lhe chama a atenção seu novo vizinho, Gabe Hassan (Khaled Abol Naga), um jovem cujos traços físicos não negam sua descendência árabe, o bastante para fazer o desempregado ficar com a pulga atrás da orelha.

Sempre de olho pela janela, Allen fica intrigado ao ver que Hassan mudou-se rapidamente e com pouca bagagem, costuma dar uma espiada no movimento ao redor de seu apartamento que fica no andar térreo e tem o hábito de colocar seu lixo para fora altas horas da madrugada. Tudo isso poderia passar despercebido, simplesmente um vizinho excêntrico, mas pesa o fato do rapaz ser do Oriente Médio como generaliza o protagonista. Dessa forma, qualquer detalhe pode ser uma prova, um indício de que ele seria um terrorista e poderia estar tramando algum plano. É claro que Allen não resiste a tentação de dar uma fuçadinha nos descartes do vizinho e fica ainda mais intrigado ao encontrar envelopes oriundos de uma instituição árabe intitulada “Filhos da Benevolência” e passa a dividir suas desconfianças com a esposa, a fotógrafa Marla (Kari Matchell), esta que tenta alertar o marido que não se pode julgar as pessoas baseando-se em preconceitos e até o afronta indo pessoalmente dar boas-vindas ao jovem. Conforme os dias passam, a paranoia aumenta ainda mais com os incentivos dos discursos do então presidente George W. Bush clamando para que os norte-americanos se unam para lutar por vingança. Seguindo Hassan, o vizinho fica ainda mais preocupado ao ver que ele trabalha em uma pequena empresa onde atuam apenas pessoas conterrâneas, dirige um carro alugado e ainda faz uso de telefone público mesmo tendo celular, possivelmente uma maneira de não ser identificado pelo número. Marla tem justificativas para todas essas suspeitas e ainda reforça que o vizinho é apenas um inocente estudante de mestrado que deve receber algum tipo de financiamento de seu país de origem, mas seu marido continua com a ideia fixa de que não faltam argumentos para levar suas suspeitas às autoridades e fazer seu papel de cidadão consciente afinal qualquer morador dos EUA tinha a obrigação de agir como um sentinela, os olhos e ouvidos do FBI como ele próprio define. Allen então seria o simulacro de um herói? Não chega a tanto, apenas um civil engajado a defender a honra de seu país embalado pela onde de patriotismo e desespero que tomaram de assalto a nação acostumada a ilusão de que vivem em uma redoma de vidro. O mundo se acostumou a olhar os EUA de maneira soberana e os atentados de 11 de setembro foram uma grande afronta a essa fortaleza imaginária. Buscando recuperar a imagem indestrutível de outrora, a mídia local fazia questão de exaltar tal posição diariamente e repetidas vezes, além de reforçar a imagem dos povos árabes como vilões.

O diretor Jeff Renfroe usa matérias do tipo para bombardear os créditos iniciais deixando bem clara as intenções de sua obra, mas a narrativa toda é pontuada por esse recurso, como o rádio que avisa que seu vizinho pode ser um suspeito e os cartazes espalhados pelas ruas com fotos de árabes procurados pela polícia. Aliás, tais artifícios são utilizados além do necessário, deixando uma incômoda sensação no espectador de que o filme é quase um veículo de publicidade do governo americano e de incentivo à Guerra ao Terror. Todavia, o roteiro tenta vez ou outra mostrar o outro lado da moeda. O agente do FBI Tom Hilary (Richard Schiff) entra na história para lembrar Allen que ele é apenas um homem comum e se insistir em brincar de detetive por conta própria sofrerá as consequências como qualquer outro indivíduo que invadisse uma propriedade alheia sem permissão, por exemplo. A certa altura, o protagonista e Hassan discutem as atrocidades que cada uma das nações que representam cometeram, mostrando que os EUA também não é um país santo. O árabe até faz uma metáfora envolvendo uma tragédia a um núcleo familiar para tentar explicar as razões de seu povo em querer se vingar, mas em nenhum momento assume que é um terrorista, podendo inclusive ser mais uma vítima da arrogância de um norte-americano perturbado que para esquecer os problemas pessoais acaba comprando uma briga muito maior que poderia suportar para manter-se ocupado. No entanto, nos minutos finais Renfroe recua e acaba levantando de certa forma a bandeira de seu país reforçando que ali está a razão. Paranoia Americana está longe de ser uma das melhores produções a abordar os efeitos do medo do terrorismo, porém, embora produzido em 2006, sem dúvidas é um registro razoável de um período marcante da História americana e porque não mundial. Seu apelo patriótico ainda se faz valer e levanta discussões, mesmo contando com personagens esquemáticos entre os quais se destaca a atuação de Krause que catalisa todas as angústias de um homem fragilizado muito mais pelos rumos que sua vida tomou que necessariamente pelos problemas de sua pátria, estes que acabam sendo usados como desculpas para ele se sentir com alguma serventia. De qualquer forma, mesmo com os rumos previsíveis e a cara de telefilme oportunista, uma opção que garante um bom passatempo.

Suspense - 98 min - 2006

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